Para quem não está acostumado a filmografia de Terry Gilliam, talvez estranhe um pouco este Zero Theorem. A veia humorística nonsense e a estética peculiar e típica dos produtos do realizador talvez ajudem a confundir ainda mais o público. A história se passa em um mundo corporativo onde “homens câmera” fornecem imagens para uma criatura controladora que usa a alcunha de Managemente, interpretado por um mirabolante e pomposo Matt Damon.
A direção de arte é de um trabalho primoroso e é bem típica se comparada a filmografia do realizador. O ambiente futurístico é, em alguns momentos, sujo e decaído, para exemplificar o estado social onde a solidão é uma prerrogativa valorizada e uma prática comum, e em outras é hiper-colorido e barulhento, grafando o consumismo desenfreado como parte do modus operandi daquele “universo”.
A história segue Qehon Leth – Christoph Waltz – um hábil analista de entidades – sua profissão não tem um par ordenado com o universo comum – que vive numa atmosfera extremamente corporativista onde se vive para trabalhar. Se sente incomodado, mas não pelo exercício de seu ofício, mas sim pelo entorno de pessoas, prefere a solidão de seu lar e tenciona trabalhar em casa a fim de evitar o incômodo da companhia humana. Qehon é um sujeito decadente fisicamente e está a espera de algo que poderá mudar a sua vida – e eventualmente muda – enquanto recebe a incumbência de resolver uma equação que nem os maiores gênios da empresa conseguiram achar uma solução.
A fotografia fica a cargo de Nicola Pecorini, – já havia trabalhado em Contraponto, O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus etc – o que garante um registro visual caracteristicamente típico de Gilliam. Segundo o realizador esta seria a sua terceira abordagem a universos distópicos satirizados, assim como em Brazil e Doze Macacos. Qehon teme viver, não permite provar nada em sua dieta que possua sabor, vive sua vida de forma absolutamente robótica e sem muita razão de existir. Está tão acostumado a sua rotina claustrofóbica que não percebe sequer quando acontecem coisas extraordinárias no seu cotidiano. Suas consultas com uma psiquiatra – Dra. Shrink Rom, interpretada por Tilda Swinton – só agravam a sua situação, o faz correr atrás de algo inatingível enquanto ignora o que pode lhe fazer feliz – a presença da belíssima Bainsley, estrelada pela estonteante Mélanie Thierry – até que seja tarde demais reaver o que ele ignora.
A razão de “ser” ou “existir” e o sentido da vida parece só importar para o mercado empresarial, que faz uso dessas máximas para vender seus produtos. Os espécimes jovens, representados no filme por Bob (Radu Andrei Micu) têm uma relação esquisita com suas próprias crenças, podendo acreditar no conceito de alma, mas desacreditar em qualquer outra coisa – tal comportamento ilógico é flagrado atualmente também. No último ato como ser vivente, Qehon entende como faria sentido a sua própria existência, e se entrega ao nada e ao vazio, só então podendo provar da paz que tanto buscava.