Crítica | O Juiz

Filmes de tribunal sempre foram recorrentes na história do cinema. O ótimo 12 Homens e Uma Sentença, de 1957, provou que é possível fazer um filme com assuntos jurídicos ser interessante para o público. Mas foi em 1993 que o gênero explodiu com A Firma, estrelado por Tom Cruise e Gene Hackman. Hollywood viu no autor John Grisham uma fonte quase inesgotável de roteiros vindo de seus livros. Grisham, até hoje, é bastante respeitado pelos seus romances extremamente competentes, recheados de intrigas, mistérios e com histórias bem diferentes umas das outras. Com isso, pudemos assistir a O Dossiê Pelicano, O Cliente, Tempo de Matar, A Câmara de Gás, O Homem que Fazia Chover, Até Que a Morte Nos Separe e, mais recentemente, O Júri, todas adaptações dos livros do autor.

Quando O Juiz foi anunciado, os atores estavam no primeiro estágio de negociação. O astro Robert Downey Jr., além de confirmar presença como protagonista, assina também como produtor executivo e, para contrabalancear com ele, o nome de Jack Nicholson chegou a ser cogitado. Infelizmente, as negociações não avançaram e coube ao veterano Robert Duvall dar vida ao juiz Joseph Palmer, ou juiz Palmer, como é chamado.

O que difere O Juiz das adaptações de Grisham é que o filme tem uma premissa extremamente simples, e até mesmo clichê. Porém, o diretor e roteirista David Dobkin, que tem no currículo filmes como Bater Ou Correr em Londres e Penetras Bons de Bico, surpreende ao inserir um humor pouco convencional à trama, além de outras situações extremamente sutis que acabam funcionando por completo.

Hank Palmer (Downey Jr.) é um advogado bem-sucedido que há anos abandonou sua cidade natal por não se dar bem com seu pai, o juiz Palmer (Duvall). Embora Hank more numa mansão e seja casado com uma bela jogadora de vôlei, ele se vê no meio de seu próprio divórcio e, para piorar a situação, durante um julgamento, recebe uma ligação de que sua mãe havia morrido. Era hora de retornar à sua cidade depois de tantos anos. Era hora de confrontar o seu pai depois de tantos anos.

A sutileza do diretor já é percebida logo quando Hank chega ao velório. Somos apresentados ao seu caçula e especial irmão, Dale (Jeremy Strong), e o irmão mais velho, Glen (Vincent D’Onofrio). O juiz Palmer, ao chegar, cumprimenta todos, menos seu filho, mostrando que nem o luto da esposa amoleceu seu coração. Aliás, a maneira como Hank é tratado pelo pai faz que ele resolva ir embora no dia seguinte ao funeral, sendo que, dentro do avião, ele fica sabendo que seu pai foi acusado de homicídio por ter atropelado um ex-condenado que agora está solto.

Com o sucesso de Homem de Ferro, Downey Jr. resolveu de vez assumir a identidade de Tony Stark, tanto que nas junkets de divulgação do filme do ferroso, o astro ia praticamente vestido como o gênio, bilionário, playboy e filantropo da Marvel, usando o mesmo cavanhaque e os mesmos ternos, algo que faz até hoje. Essa fusão entre ator e personagem atrapalha o primeiro ato de O Juiz, pois não se enxerga Downey Jr. como Hank Palmer, mas sim como Tony Stark.

Isso muda quando Hank decide ficar e ajudar seu pai. Ele encontra na sua antiga bicicleta e numa camiseta surrada do Metallica um propósito para poder relembrar a sua infância e sua adolescência, revendo, inclusive, seu antigo amor, Samantha (Vera Farmiga), que hoje é dona de um restaurante e mãe solteira de uma bela jovem, que morde o cabelo da mesma forma que a filha de Hank.

A química entre Downey Jr. e Robert Duvall funciona bastante, rendendo ótimos momentos de tensão e drama, o que pode levar o telespectador a diversas emoções. Aos poucos, também conhecemos o motivo pelo qual os dois se odeiam e como isso interfere diretamente no curso do processo e do julgamento do juiz Palmer.

Aliás, a relação entre todos os personagens e suas boas subtramas acaba deixando a trama principal em segundo plano, o que faz com que um dos personagens fundamentais, o promotor Dwight Dickham (Billy Bob Thornton), fique meio apagado, o que de certa forma não chega a ser ruim, já que o filme, como dito, tem uma premissa bastante simples. E isso talvez seja mérito do diretor por escrever e filmar ótimas cenas que intercalam drama junto ao humor de forma sutil e delicada sem ficar chato ou fora do lugar. Não há nenhuma cena cômica que não se encaixe.

O Juiz, por ter participado de festivais, poderá ser um dos nomes do Oscar em 2015, rendendo indicações para Downey Jr. como melhor ator, Robert Duvall, como melhor ator coadjuvante, e talvez para melhor roteiro e direção.

Texto de autoria de David Matheus Nunes.

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