A intenção de Joe Wright em refilmar o clássico literário e de animação Peter Pan é bem clara, e muito ligada a sua filmografia, comumente retratando cenários suntuosos e tramas que primam pelo visual. Como em Anna Karenina e no curioso Hanna, este Pan de 2015 consegue exprimir nuances no imaginário do público, distantes demais do que a maioria dos espectadores sabe a respeito do rapaz que não cresce.
A trama se passa antes da época de As Aventuras de Peter Pan, filme animado premiado de Walt Disney, e se distancia muito da versão em live action da década passada, especialmente pelo esmero de seu diretor em dar ares de grandeza ao conto. Levi Miller dá vida ao personagem-título de uma maneira interessante, apoiado em um roteiro que apela para orfandade, claramente no intuito de universalizar ainda mais sua história. Pecados de clichês à parte, os defeitos do filme passam longe da personificação do ator mirim.
Os efeitos especiais da trama são ligados às coincidências e às uniões que Pan faz ao chegar a Terra do Nunca. A construção de cenários e atmosferas do lugar mágico são curiosas, misturando pop, anarquia e crossdresser, fatores que fazem do caricato Barba Negra de Hugh Jackman um personagem que não prima pelo conteúdo, mas que funciona em quase todas as vezes em que é acionado, especialmente nos momentos musicais, onde os renegados entoam hinos grunge e punk.
No entanto, a personificação de James Hook poderia ser melhor trabalhada. Garret Hedlund não tem qualquer carisma – vide Tron O Legado e Na Estrada – a ponto de seu personagem não dizer nada absolutamente ao público. Quando ele não está em tela, quase não se sente sua falta. A ausência de qualquer complexidade em seu comportamento o torna genérico, como qualquer anti-herói que se vira para o “lado do bem” repentinamente. O cuidado em construir um 3D que acrescenta á trama passa longe de ser o mesmo na atmosfera em volta do pretenso Capitão Gancho, pouco fazendo crer que ele se tornaria o antagonista de uma possível continuação.
Apesar de tropeços na construção de cenários da terra dos nativos, onde habitariam os Garotos Perdidos e onde habitam aves esdrúxulas que mais lembram pokemóns deformados, não há muito a se lamentar. As escolhas para retratar a matança de seres místicos são tão inocentes que beiram a poesia. Wright mais uma vez abusa das cores, o que faz pensar em certa ambiguidade de seu texto, referenciando não só à psicodelia, como também ao flerte com questões graves, como dislexia infanto-juvenil. Peter Pan não consegue o intento de ser uma obra-prima, em razão de algumas licenças textuais ruins, mas funciona como versão em carne e osso de uma história conhecida por ser animada, especialmente em comparação com as péssimas adaptações recentes, como Branca de Neve e o Caçador, Alice No País Das Maravilhas, Cinderela e o musical Caminhos da Floresta.