De volta ao papel mais conhecido de sua carreira, Bruce Campbell exibe uma bela forma física se espremendo em uma cinta de correção postural nas primeiras cenas de Ash vs The Evil Dead, ainda mais se levarmos em conta os eventos de Uma Noite Alucinante 3. Ainda que a produção tenha tido dois desfechos, um no cinema e outro diferente em home vídeo, a série leva em conta a versão de cinema e, depois de trinta anos, Ash vive sua pacata vida tendo uma rotina boemia, abordando mulheres de meia idade em bares sujos, transando nos banheiros desses estabelecimentos, mas sempre assombrado pelas lembranças demoníacas do passado, sem conseguir se livrar do inimigo que o persegue desde a juventude.
Aos poucos descobrimos que o personagem ainda guarda consigo o Necronomicon, livro dos mortos, artefato usado para dar em cima de outras mulheres, e que acidentalmente foi aberto fazendo as possessões se manifestarem novamente. Transitando entre o real e o imaginário, as aparições demoníacas não são claras para a compreensão mental de Ash. No entanto no núcleo centrado na policial Amanda Fisher (Jill Marie Jones), a realidade é tangível e entrega boas cenas gore, em doses semelhantes ao remake A Morte do Demônio, evento mais recente da franquia.
Ashley prossegue na mesma loja de departamentos e lá conhece Pablo Simon Bolivar (Ray Santiago), um latino que assiste a manifestação do mal em uma pequena boneca assassina que tenta dar cabo do protagonista, além de bela Kelly Maxwell (Dana DeLorenzo), alguém que também tem um contato com o maligno em seu seio familiar. O primeiro episódio, único dirigido por Sam Raimi, faz autorreferência a Uma Noite Alucinante: A Morte do Demônio, ainda que seu intuito mais trash como ocorre a partir de Uma Noite Alucinante 2. Até mesmo na na música, o tom do seriado produzido pela Starz, emula alguns dos acordes de Joseph LoDuca em Uma Noite Alucinante 3.
Há uma preocupação genuína dos roteiros em explicar a pseudo-ciência por trás dos possuídos, com Ash filosofando sobre a tomada de consciência que ocorre com as vítimas, ainda que não haja qualquer estudo profundo de sua parte, exceto a vivencia do passado. Afinal o único materia que aproxima as criaturas de suas origens obscuras e estão contidas em livro cuja linguagem está morta, sem falantes nativos. Também voltada para a caça do Mal está a bela e misteriosa Ruby Kowby (Lucy Lawless), herdeira dos Knowby vistos no segundo filme, também a procura do destino que o livro dos mortos revelaria.
A galhofa de Ash vs The Evil Dead remete a um passado onde o audiovisual mambembe e paupérrimo era também inventivo, não descartável e bobo como os filmes da franquia Sharknado que, apesar de divertidos, não acrescentam em nada do ponto de vista técnico. Os 10 episódios não chegam próximo do primor que Raimi conduziu em seus três filmes. O gore é muito bem empregado dando aos roteiros de Sam e Ivan Raimi (unidos a Tom Spezialy) uma boa versão do que vinham fazendo Quentin Tarantino e Robert Rodriguez a partir do projeto Grindhouse, a lembrança mais próximo da intenção dos produtores da série, ainda que o projeto seja menos ambicioso em comparação a Planeta Terror e À Prova de Morte. De qualquer maneira, o roteiro é exagerado, e em meio a uma qualidade narrativa bastante irregular, apela para os velho clichês de gênero terror, mesmo que utilizando-os da maneira mais debochada e escrachada.
Os últimos momentos deste primeiro ano reservam memórias para Ash, tanto no sentido de estabelecer um romance com uma personagem – um ponto de aproximação com o primeiro filme de 1981 – além de fazer um retorno a cabana onde tudo começou. Apesar de alguns tropeços e de uma visível queda na qualidade do roteiro, principalmente na solução vista no desfecho, com um falso cliffhanger, Ash vs The Evil Dead consegue se estabelecer como um programa nostálgico e emocionante para quem se interessa pela jornada do herói da trilogia Uma Noite Alucinante, preenchendo finalmente um vazio no imaginário desse mesmo público, com direito a novas desventuras.