O canadense Denis Villeneuve tem uma carreira curta, porém proeminente, como realizador de filmes. Seus trabalhos já são muito bem quistos pela crítica e pelo público – especialmente depois de Incêndios (Incendies), que foi indicado pela academia como melhor filme de língua estrangeira em 2011. Esta sua primeira direção de um filme estadunidense e com um grande orçamento, a fita Prisoners (que deveria ter a sua tradução literal para o título do filme), é um suspense milimetricamente planejado e realizado com um esmero pouco visto no cinema atual.
O primeiro mérito da produção é a autonomia com que Villeneuve leva o seu filme, conseguindo ultrapassar os limites que muitos diretores estrangeiros não conseguem, que é o de rodar exatamente o que se quer sem interferências externas. Os Suspeitos é uma película implacável, violenta e visceral, que não tem dó do seu expectador, esmiuçando os problemas de seus personagens sem piedade e apelando para uma questão de empatia universal: a relação de paternidade e o cuidado com os filhos.
Hugh Jackman interpreta Keller Dover, um pai atencioso que tem sua filha raptada logo nos primeiros momentos de tela. A menina é levada junto com uma amiga, e o drama das duas famílias é explicitado em cena. Cada um dos membros dos clãs reage de uma forma, uns de forma passiva, outros inconformados. Keller se desespera, é sempre o mais propenso a agir, muito movido por uma auto-culpa por não ter conseguido impedir o sequestro , que se agrava com as constantes acusações de seu filho mais velho (Dylan Minnette). Dover se desentende com o responsável pelas investigações, Detetive Loki, interpretado por Jake Gyllenhaal, achando que ele não está se esmerando o suficiente e decide tomar uma atitude drástica com relação a um dos suspeitos e então o filme se divide em duas frentes, a demonstração das ações de Keller e a investigação do policial.
Quando Loki vai atrás de pistas, as janelas pelas quais as imagens passam estão empoeiradas, numa óbvia alusão a completa falta de clareza nas investigações que move. O argumento é repetido com a neblina que sempre envolve o personagem, o detetive tem boas intenções mas esbarra em seus próprios defeitos, especialmente sua falta de perícia em dar andamento a procura por indícios do cativeiro das crianças. O agente da lei reclama o tempo inteiro por não ter boas condições de trabalho, principalmente no que tange a vigilância a Alex (Paul Dano), um dos suspeitos – seu superior justifica o erro apontando a falta de verba para o corpo policial, onde o roteiro evidencia as dificuldades que o sistema impõe em relação ao cumprimento do trabalho do servidor público. Mesmo que sua competência nas investigações seja discutível, Loki mostra uma paciência de Jó e não responde aos impropérios do pai inconsolado – as cenas entre Jackman e Jake Gyllenhaal são sempre muito boas, os atores possuem uma química incrível e ambos apresentam representações memoráveis e críveis no que tange os seus desempenhos dramatúrgicos.
Nas cenas em que tem de aguardar as ações policiais, Keller usa um capuz que cobre o seu rosto, remetendo a vergonha e a dúvida sobre seus atos, se eles são corretos ou não, não tanto pelo maniqueísmo ou a briga certo/errado, mas sim pela obtenção de resultados, praticamente nula mesmo após tantas medidas extremas tomadas por ele. O alcoolismo retorna a sua vida, o personagem busca desesperadamente a coragem para prosseguir em sua busca. Sua atitude é extrema e culpável, se levado em conta o ideal moral e ético de comportamento humano, mas é plenamente cabível diante do desespero de não ter sua filha em seus braços, o sentimento paterno extrapola até o contrato social.
Nas últimas cenas, após a descoberta do real vilão, Loki, após mais um erro de julgamento, e tentando não cometer mais equívocos, tenta levar a menina até o hospital a fim de retirar o veneno que lhe foi imposto. Graças a um ferimento na cabeça, o sangue escorre até os seus olhos, explicitando as feridas naturais que o impedem de enxergar a estrada a sua frente, e que mais tarde, o impede também de notar o paradeiro de Keller Dover, onde o papel de suposto foragido se inverte. O roteiro de Aaron Guzikowski é pródigo em usar os clichês do gênero de suspense de forma auspiciosa e muito competente, que junto à direção de Denis Villeneuve, faz desse Os Suspeitos um dos melhores filmes de 2013.
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