Não é novidade que o cinema coreano vem ganhando destaque ao longo dos últimos anos. Apresentando roteiros firmes, reviravoltas extremas e personagens tridimensionais, a Coreia do Sul chamou atenção da gigante Hollywood e do Ocidente como um todo, mostrando que seu país é muito mais do que nomes impronunciáveis e para validarmos isso, basta verificarmos as últimas produções americanas nas mãos de diretores e atores coreanos já consolidados, além de remakes de produções originalmente advindas do pequeno país asiático. Segredos de Sangue (Stoker, 2013), dirigido por Chan-Wook Park, Expresso do Amanhã (Snowpiercer, 2014), dirigido por Joon-ho Bong, O Último Desafio (2013), dirigido por Jee-woon Kim e o remake de Oldboy (2013), dirigido por Spike Lee em uma adaptação direta ao clássico de Chan-Wook Park são apenas alguns exemplos da atenção conquistada pelos coreanos no mundo ocidental.
Como um grande fã do cinema coreano já há alguns anos, decidi fazer um top 10 dos melhores filmes sul coreanos que tive o prazer de ver. A intenção não é fazer uma análise minuciosa de cada um deles, mas sim abordar os elementos principais de cada trama e o que me chamou atenção em cada um deles.
Veja que se trata de uma lista pessoal que intenta atiçar a curiosidade dos leitores (tanto quem desconhece ou quem já conhece, mas quer descobrir novos filmes para ver) e dar algumas excelentes referências para quem tem curiosidade em se aprofundar na mente cinematográfica da Coreia do Sul.
Se você também gosta de produções coreanas e viu que alguma delas não está na lista, fique à vontade para comentar abaixo, buscando enriquecer uma boa lista de filmes must see para os cinéfilos de plantão.
Não menos importantes do que a lista a seguir, mas apenas para não estragar um número tão redondo quanto “top 10”, seguem abaixo outras excelentes obras que eu sequer saberia dizer qual gostei mais. Apenas confiram, se divirtam e adentrem nesse mundo sombrio do cinema coreano: The Yellow Sea (2010), No Tears for the Dead (2014), Thirst (2009), Lady Vingança (2005).
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10. Os Invencíveis (2008, Jee-woon Kim)
O diretor Kim Jee-woon nos transporta para uma aventura faroeste na década de 30, na Manchúria, quando japoneses, russos, chineses e coreanos estão em busca de fortuna. Dentre eles, os atores Kang Ho-song, Byung-hun Lee e Woo-sung Jung disputam a posse de um mapa capaz de levá-los a um grandioso tesouro.
Particularmente, esta é uma das grandes surpresas de todos as produções que já assisti, pois por que diabos coreanos estariam ousando filmar um faroeste, a epítome do cinema americano? Seria ousadia ou má fé? Bom, respondo com tranquilidade que nenhum dos dois, visto que o filme faz uma clara homenagem a Sergio Leone, Clint Eastwood, Sam Peckinpah e os outros grandes nomes do faroeste.
Não apenas uma homenagem, mas The Good, the Bad and the Weird não deixa a desejar em nada em suas cenas de ação, a empolgação e, principalmente, no bom humor que acompanha a trama desde o seu início. Um excelente filme de aventura e faroeste que com certeza deve ser assistido por quem procura uma diversão mais leve dentro do gênero asiático.
9. O Homem de Lugar Nenhum (Lee Jung-beom, 2010)
Conta a história do recluso e misterioso Tae-Shik (Won Bin), dono de uma pequena loja de penhores, que sempre tem que lidar com a pequena Soo-mi (Kim Sae-ron), filha de sua vizinha que sempre se mete em confusões. Quando a mãe da menina rouba de traficantes, eles raptam mãe e filha para propósitos nefastos. Tae-Shik vai atrás dos sequestradores e, quando vê que as coisas não vão ser tão simples quanto imagina, resolve salvar a garota utilizando seus próprios métodos.
Uma ótima opção para iniciar uma lista de produções asiáticas, pois creio que a maior parte dos espectadores ocidentais não vão se assustar tanto com os temas aqui retratados. Dirigido por Lee Jeong-beom, The Man From Nowhere é um filme de ação de tirar o fôlego. Com uma forte carga dramática, é possível compará-lo com os clássicos Busca Implacável (2008), O Profissional (1994) e o mais recente De Volta ao Jogo (2014).
Não estamos falando apenas de ação sem nexo, mas uma envolvente história repleta de complexos personagens e motivações, tensão e uma boa dose de ação honesta. Inclusive, há de se ressaltar que este filme tem uma das melhores cenas de combate com facas que já vi. E não se deixe enganar, como todo bom filme coreano, no fim você vai estar se preocupando em desatar o nó de marinheiro em sua garganta.
8. Novo Mundo (Park Hoon-jung, 2013)
Dirigido por Park Hoon-jung, New World conta a história de Ja-sung (Lee Jung-jae), policial infiltrado em uma organização criminosa e segundo no comando da mesma. Após a morte do líder da facção, começam-se as tensões para saber quem vai assumir o posto em questão. Reportando-se sempre ao seu chefe Kang (Choi Min-sik), Ja-sung se torna o pivô na operação policial New World, tendo sido prometido a ele a chance de sair da vida de infiltrado para poder viver uma vida calma com sua esposa grávida. Porém, conforme a operação avança, Ja-sung é colocado à prova para escolher um lado quando percebe que sua liberdade está mais distante do que imagina.
É obrigatório para quem gosta do gênero de gângsteres. Uma verdadeira mistura entre os melhores momentos de Os Infiltrados (2006) e O Poderoso Chefão (1972), o filme possui uma forte carga dramática e reviravoltas intensas. A violência no mundo da máfia não é descartada e a direção ganha destaque inclusive em cenas de ação, fazendo alusões a cenas clássicas do coreano Oldboy (2003). Se gosta de boas histórias sobre o submundo dos gângsteres e lutas de clãs pelo poder, esse é o seu filme.
7. Mother (Bong Joon-ho, 2009)
Uma viúva cuida sozinha de seu filho único, Do-Joon (Won Bin). Este homem, de 28 anos, costumeiramente age de maneira infantil e inconsequente, dependendo sempre da atenção e dos cuidados de sua mãe. Após ser acusado pelo assassinato de uma adolescente, sua mãe (Kim Hye-Ja) parte em uma busca incessante para provar a inocência do seu filho.
Ao contrário dos enredos policiais que estamos acostumados, somos colocados na pele de uma senhora idosa que, custe o que custar, quer provar a inocência de seu filho. Em uma ambientação escura e depressiva, a atriz Kim Hye-Ja lidera de forma brilhante um emocionante drama psicológico que nos faz questionar sobre o que faríamos no lugar da personagem.
6. O Hospedeiro (Bong Joon-ho, 2006)
Na beira do rio Han moram Hie-bong (Byeon Hie-bong) e sua família, donos de uma barraca de comida no parque. Seu filho mais velho, Kang-du (Song Kang-ho), tem 40 anos, mas é um tanto imaturo. A filha do meio é arqueira do time olímpico coreano e o filho mais novo está desempregado. Todos cuidam da menina Hyun-seo (Ko Ah-sung), cuja mãe saiu de casa há muito tempo. Um dia surge um monstro no rio, causando terror nas margens e levando com ele a neta de Hie-bong. É quando, em busca da menina, os membros da família decidem superar seus medos e problemas para enfrentar o monstro e salvar a criança.
Mais uma vez somos surpreendidos. Começamos a assistir achando que estaremos vendo algum derivado genérico de Godzilla, porém somos surpreendidos com uma comovente história de uma família que precisa superar suas diferenças e problemas pessoais para salvar um parente. A narrativa explora com maestria os limites de cada personagem e os esforços de cada um para conquistarem seus objetivos.
O Hospedeiro é uma quebra de expectativa e de rótulos. Terror, comédia e drama, tudo em um pacote só. Uma tempestade de sentimentos e sensações em uma obra prima que, ao mesmo tempo, perturba e encanta com as qualidades narrativas e estéticas do cinema coreano que, por sua vez, é tão implacável e inesperado quanto o monstro do filme.
5. The Chaser (Na Hong-jin, 2008)
Jung-ho (Kim Yoon-suk) é um ex-policial que agora agencia prostitutas, que estão gradualmente desaparecendo. Achando que suas garotas estavam sendo vendidas por algum de seus clientes, Jung-ho decide investigar e ir atrás do responsável, porém o que descobre é que seu cliente na realidade está matando as garotas. Porém, mesmo pego pela polícia, Jung-ho, paralelamente a ela, corre contra o tempo para descobrir onde estão as evidências, antes que o criminoso seja solto por falta de provas.
“Tensão” é o sentimento que melhor descreve The Chaser, do começo ao fim. Não há mistério sobre quem é o assassino, pois isso já é revelado desde o início. Porém, o desespero de Jung-ho, correndo por todos os lados de uma Seul noturna, sombria e mórbida, se transpõe ao espectador.
A obra nos faz prender os olhos na tela sem piscar por toda sua extensão. Como sempre, a trilha sonora compõe o cenário sombrio e caótico do começo ao fim. Mantenha suas unhas a postos, pois ela não sobreviverá a esta produção.
4. Eu Vi o Diabo (Kim Jee-woon, 2010)
Se até esse momento não ficou claro que a Coreia do Sul domina os cenários de violência em seus filmes, explorando minuciosamente as consequências e sentimentos envolvidos na violência em si, I Saw the Devil está aqui para bater o martelo.
O diretor Kim Jee-woon conta a história de Kyung-chul, um cruel e perigoso psicopata e estuprador. Certa noite, Kyung estupra e mata a bela Juyeon, filha de um chefe de polícia aposentado e esposa grávida de um oficial de elite da polícia, Soo-hyun. Obcecado pela vingança, Soo-hyun está determinado em achar o assassino e fazê-lo sofrer. Aqui começa um violento jogo de gato e rato onde a linha entre o “bom” e o “mau” é tênue.
A violência é extrema; se achávamos que ela era marca predominante de Chan Wook-park, é aqui que nos enganamos. Aqui discutimos a futilidade do sentimento de vingança extremo através de muita violência gráfica e gore.
Novamente, temos uma produção com personagens fortíssimos, excelentes atuações e discussões virtuosas. A violência é perturbadora, mas ao mesmo tempo fascinante e provoca uma montanha russa de emoções no espectador.
3. Oldboy (Chan-Wook Park, 2003)
Provavelmente de toda a lista até agora, Oldboy seja o único que a maioria das pessoas já tenha assistido. Seja do próprio filme original dirigido por Chan-Wook Park, quanto do remake de 2013, o qual infelizmente não fez jus à qualidade do primeiro.
Adaptado de um mangá japonês, e o segundo filme da Trilogia da Vingança de Chan-Wook Park, “Oldboy” conta o drama de Oh Daesu (Min-Sik Choi), um homem comum que se vê no meio de uma estranha situação: ele é sequestrado e jogado numa cela que parece um pequeno quarto de hotel adaptado, seu único contato com o mundo exterior é uma televisão. A situação se agrava quando Daesu vê pelo noticiário que sua esposa foi assassinada. Sem saber quem fez isso com ele e porquê, sem conseguir fugir nem se suicidar, Daesu começa a perder a sanidade e a única maneira de sobreviver é alimentar seu desejo de vingança. Quinze anos se passam e ele acorda um dia fora da cela. A partir desse ponto, Daesu parte em uma busca incessante por vingança para descobrir quem destruiu sua vida e suas motivações.
Palavras não bastam para descrever Oldboy. Não apenas ressalto a genialidade do diretor em seus inúmeros planos sequenciais, os quais servem de referência para o cinema no mundo todo (inclusive são repetidos incessantemente em diversas obras, como no seriado “Demolidor”), como também a imersão extraordinária dos atores em seus respectivos papéis e o roteiro sólido e preciso na exploração dos sentimentos mais sombrios do ser humano. Revelações crescentes e reviravoltas tenebrosas recheiam a extensão da trama.
Um clássico que precisa ser assistido dezenas de vezes, mas posso afirmar que você nunca mais será o mesmo após assistir pela primeira vez.
2. Mr. Vingança (Chan-Wook Park, 2002)
O segundo lugar dessa lista é conquistado pelo primeiro filme da Trilogia da Vingança de Chan-Wook Park. Vale lembrar que a referida trilogia não necessariamente signifique que deva ser assistida na ordem, apenas que ela possui como tema principal a “vingança”.
Ryu (Shin Ha-Kyun) é surdo e sua irmã precisa com urgência de um transplante de rim. Na ausência de doadores compatíveis, Ryu recorre ao mercado negro, mas é trapaceado e perde todas suas economias, bem como o próprio rim. Ryu então é convencido por sua namorada a sequestrar a filha de 4 anos do empresário Dong-Jin (Song Kang-Ho) para custear a cirurgia de transplante, mas o sequestro não funciona como esperado e a partir daí Dong e Ryu partem em uma incansável busca por vingança.
A vingança não apenas é um prato que se come frio. Além de frio, é um prato que se come lentamente e com gosto de sangue. Mr. Vigança não é só um filme sobre a vingança, mas sobre a profundidade dos seres humanos, o niilismo e a impossibilidade da satisfação do ser.
Uma tragédia após a outra leva o ser humano ao seu estado mais violento e cru, levado a agir por instinto. Mais uma vez Chan-Wook Park nos faz navegar na linha tênue da moralidade humana e nos coloca em cheque em como nos sentimos em relação às ações dos personagens. Tudo isso para sermos dilacerados com todas as consequências causadas pelos atos dos personagens.
A sofisticação técnica e narrativa dos temas de Chan-Wook Park são trabalhados com bastante fervor e é indiscutível que é um dos grandes diretores da sétima arte e um marco no cinema sul coreano.
1. Memórias de um Assassino (Joon-ho Bong, 2003)
Finalmente chegamos ao primeiro lugar. Se você leu tudo até aqui, deve estar se perguntando: “é possível um filme coreano ser ainda mais extremo do que todos os outros que foram mencionados aqui?”.
A resposta é sim.
Memórias de um Assassino é inspirado em um caso real. Entre 1986 e 1991, quando a Coreia do Sul permanecia sob ditadura militar e a população vivia em lei marcial, com toques de sirenes que obrigavam os habitantes das cidades a se recolherem às suas casas, uma pequena cidade rural enfrentou a ameaça de um assassino serial de mulheres. “Memórias de um Assassino” dramatiza os acontecimentos da época, enfocando os esforços da polícia local para tentar capturar o maníaco.
Ao contrário de outros filmes apontados nessa lista, a produção trabalha com um ritmo narrativo um pouco mais tradicional. No primeiro ato, somos apresentados aos personagens principais e nos aprofundamos em suas motivações. Enquanto Park (Kang-Ho Song) é um detetive truculento que só quer achar um culpado o mais rápido possível, Seo (Sang-Kyung Kim) é inteligente e esforçado, além de comprometido com a verdade. O aprofundamento dos personagens ocorre concomitantemente ao desenvolvimento do cenário em que desenrola a história, a precariedade de recursos na cidade e da polícia e do próprio desequilíbrio da sociedade.
Os atos subsequentes, por sua vez, trabalham com a construção da tensão, conforme a investigação dos dois policiais avança e o assassino parece estar cada vez mais perto de ser pego. Enquanto isso, os personagens se transformam, evoluem e a busca implacável os leva aos seus próprios limites.
Novamente temos uma obra completa, recheada de referências que podem agradar aos fãs de thrillers (inclusive ao clássico Se7en – Os Sete Crimes Capitais de David Fincher), com excelentes atores, uma ótima trilha sonora e atores exímios. Joon-ho Bong é o ganhador dessa lista por compor com perfeição uma interessante e inesquecível história de serial killer. O gosto amargo na boca deixado ao final jamais vai sair, porém é uma alegria tremenda ver obras primas como essa.
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Texto de autoria de Pedro Lobato.
Mr Vingança é muito bom. Na minha opinião é o melhor da trilogia da vingança
assisti á todos supracitados e,não tiro uma virgula da ordem ou nomeações dos mesmos!
impactante é o minimo a ser dito,embora tenha sentido falta do “sede de sangue”, a minha mais fiel visão de vampiro; se os mesmos existissem.
Concordo demais. Por isso que coloquei o “Sede de Sangue” ali no “menções honrosas”. Só não escrevi sobre ele pra não estragar o top 10, mas sério, também acho um filme incrível mesmo. Inclusive, te digo que foi dificil demais decidir qual ficaria no texto ou não. AHUSAHUSUHAS
Bela lista, Pedro. Vou comprar todos – aham – para assistir.
E o mais recente Invasão Zumbi
O filme foi lançado em Cannes do ano passado, ou seja, maio de 2016. Essa lista é de março de 2016 😉
Adicionaria “The Wailing”.
Quando a lista foi feita o filme sequer havia sido lançado 😉