A primeira obra de Joe Hill, Fantasmas do Século XX, compõe uma antologia de contos publicados em periódicos ou coletâneas que foram suficientemente bem recebidos para constarem neste livro.
Em um breve prefácio, o editor Christophen Golden enaltece a composição literária de Hill. Em nenhum momento há a menção à filiação do autor, filho do mestre Stephen King. Uma omissão interessante para que se evite as comparações naturais da obra de pai e filho. Uma tentativa de demonstrar que Hill tem força literária suficiente para apresentar-se sem graus parentescos.
Composto por 16 contos, esta reunião é o cartão de entrada do autor ao universo de horror, fantasia e fantástico, tão comuns aos domínios de seu pai. Ainda que alguns leitores acreditem que o sucesso do jovem autor se deva à influência de King, basta debruçar-se nos contos presentes neste livro para descobrir o seu grande mérito.
A composição de uma narrativa de horror não se associa meramente a um elemento assustador. É um estilo que necessita de uma ambientação sugestionável para o leitor e que lhe projete medo. Em um texto sobre sua própria composição literária, H. P. Lovecraft menciona a importância do leitor dentro destas narrativas, pois é nele que recai os elementos de terror e horror. Cabe ao autor sugeri-lo e o leitor completá-lo com aquilo que o assustaria por completo. A sutileza da narrativa de Hill, apontada também pelo prefácio do editor, estrutura com qualidade o jogo de tensões entre escritor e leitor.
Joe Hill tem uma capacidade intensa em transitar pelo estilos diferenciados de terror e horror. Há espaço para personagens psicóticos, tramas sobrenaturais, elementos em que a fantasia dá abertura à realidade, ao fantástico e ao maravilhoso, sobrepondo-se às histórias banais sem perder a dimensão da poética narrativa. Utilizando os meandros escuros da mente, o resultado é uma série de contos de boa qualidade. Ainda que, como a maioria das antologias, haja declives em determinadas narrativas.
Muitas de suas personagens centrais são garotos adolescentes comuns que viveram um acontecimento inexplicável. São personagens inseridos em uma memória nostálgica que toca o passado dos leitores. Utilizando a memória modificadora de acontecimentos, suas personagens narram casos em uma época difícil, quando ainda descobriam o mundo com novas experiências. Fatos que resultam em tramas com fervor inocente — em destaque pela poética —, sem perder espaço para a malícia natural que surge com os hormônios. Personagens que, por estarem inseridos em um momento de vida transformador, parecem aceitar com maior naturalidade o sobrenatural imposto em cena.
Hill não deixa de reverenciar a própria arte e a tradução literária. Há personagens que trabalham com a produção e edição da escrita, são apaixonados por cinema, quando não são releituras de clássicos do cinema de ficção científica ou de obras importantes para o fantástico, como A Metamorfose de Franz Kafka.
Destacar algumas narrativas como exemplo pode influenciar o leitor a observar com mais atenção tais histórias. Ao mesmo tempo, não fazê-lo é deixar de lado pequenas grandes narrativas que dialogam com a história da própria arte. Caso de O Melhor do Novo Horror, sobre um editor de contos de horror que, à procura de um novo autor que lhe cause espanto, se vê em uma emboscada clássica, como se vivesse as histórias que ele já conhece. Ou em O Último Suspiro, uma trama de horror tradicional que se aproxima dos clássicos de Edgar Allan Poe, cujo grotesco se torna poético e assustador ao mesmo tempo.
Como coletânea de contos, oscilantes por não serem projetados com objetivo único, há diferentes estilos narrativos que demonstram a qualidade de Hill como prosador. Um bom panorama de muitos altos e poucos baixos.
Contos não são minha praia, mas curti A Estrada da Noite, deu pra ver que o Hill manda bem. O Pacto já tá na minha pilha de espera.