Quando o romancista Owen Quine desaparece, sua esposa procura o detetive particular Cormoran Strike. Inicialmente, ela pensa apenas que o marido se afastou por alguns dias — como fez antes — e quer que Strike o encontre e o leve para casa. Mas, à medida que investiga, fica claro para Strike que há mais no sumiço de Quine do que percebe a esposa.
A curiosidade sobre o desenrolar de um novo caso de Cormoran Strike foi o que me levou à leitura. Assim como o primeiro livro, entretém sem ser uma obra excepcional. Seu principal trunfo é ter um protagonista e um parceiro – Strike e sua secretária Robin – interessantes o bastante para despertar a vontade de continuar acompanhando suas aventuras e desventuras.
Mas O Bicho-da-Seda consegue superar seu antecessor. Livre da necessidade de reapresentar seus personagens, Galbraith/Rowling dedicou-se mais ao desenvolvimento da narrativa, o que resultou em um texto mais enxuto, sem tantos excessos e mais eficiente no quesito investigativo. A profusão de personagens envolvidos no mistério gera certa confusão no início, mas o bom desenvolvimento de cada um deles logo extingue qualquer dúvida.
Não que o mote do primeiro livro não seja atrativo e envolvente mas, para quem é apaixonado por livros e tem interesse pelo mundo editorial, a premissa deste chama muito mais atenção. A futilidade do universo dos personagens em O Chamado do Cuco talvez afaste alguns leitores. Em contrapartida, mesmo sendo caricatural em alguns casos, até mesmo exagerada, a caracterização dos personagens consegue trazer o leitor para dentro da história.
Diferente de um whodunit clássico, em que o leitor apenas acompanha as investigações conduzidas pelos personagens principais, Galbraith permite que aquele conheça os pensamentos de Robin e, principalmente, Strike. Se, por um lado, deixa os personagens ainda mais próximos de quem lê a obra, por outro gera um problema narrativo. Explico-me: um dos pilares do whodunit é fornecer ao leitor as mesmas informações a que o policial/investigador/detetive tem acesso. Assim, arma-se uma espécie de competição na qual quem lê a narrativa tenta matar a charada antes que a solução seja revelada pelo narrador no clímax do livro. Contudo, informar o que os personagens estão pensando antecipa (para os leitores policiais mais experientes) a resolução do mistério, anulando o clímax. Galbraith resolveu isso reduzindo o acesso aos pensamentos no último quarto do livro. Causa uma ligeira indignação deixar de saber o que até então era informação acessível. Não chega a estragar a narrativa mas gera um certo estranhamento.
“Francamente, qualquer um que vá se matar por causa de uma resenha ruim não deve se meter a escrever um romance, para início de conversa.”
Elizabeth Tassel, in O Bicho-da-Seda – Robert Galbraith (p.234)
Se há mais alguma ressalva a ser feita é justamente a Strike. Galbraith escreve fazendo parecer que apenas ele tem bons palpites que acabam por se confirmar. Tem-se a impressão de que todos a seu redor — exceto Robin, lógico — são menos capazes ou, pelo menos, comprometidos em menor grau de intensidade com a solução do mistério, seguindo sempre o caminho – ou a pista – mais fácil, não necessariamente mais coerente com a situação.
Mas esses pequenos defeitos são rapidamente esquecidos quando se pensa na trama envolvente e no retrato conciso e sarcástico do universo editorial inglês.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.