Tag: Corin Hardy

  • Crítica | A Freira

    Crítica | A Freira

    James Wan ajudou a pavimentar algumas franquias de filmes de terror dos últimos anos, desde os intermináveis Jogos Mortais, iniciado em 2004, até as séries Sobrenatural e Invocação do Mal. Depois de dois filmes de Anabellespin off de Invocação do Mal, finalmente chega A Freira, filme de Corin Hardy extremamente dependente de Invocação do Mal 2, não só por mostrar um dos monstros apresentados nesse capítulo dois, mas por ter sua introdução e desfecho fortemente ligado ao filme de Wan.

    Na trama, uma abadia na Romênia tem uma série de eventos estranhos que faz o Vaticano tentar entender o que lá acontece e descobrir se aquele ainda é um lugar sagrado. Para investigar o caso, enviam o Padre Burke (Demian Bichir) e a noviça Irene (Taissa Farmiga), o primeiro por ser especialista em exorcismos, a segunda por um motivo estranho, que não é explicado ou minimamente aprofundado além da sua óbvia rebeldia em comparação com as outras noviças, lá eles encontram o franco-canadense Frenchie (Jonas Bloquet), um homem que levava mantimentos para a abadia e encontra uma freira enforcada.

    O horror que Hardy impõe se vale muito da escuridão, não só dos cenários dentro da tal igreja mas também da questão maniqueísta religiosa da eterna briga entre as forças demoníacas e os soldados do cristianismo. Apesar da premissa bem pensada de colocar como figura maléfica como um representação do bem, o filme acaba caindo num clichê, sendo execução tão porca que se torna óbvia na maioria das suas manifestações, tanto que não há tantos jumpscares quanto nos Invocações do Mal, e quando eles ocorrem, pouco assustam.

    O roteiro tenta se levar a sério demais e não consegue trazer empatio nem com o trio de protagonistas. A rebeldia de Irene não é explorada além das primeiras cenas, os traumas de Burke também repercutem pouco além das manifestações de visões dos que ele já exorcizou – fato esse que diminui inclusive a capacidade premonitória de Irene, que segundo o texto, possui algo realmente especial e capaz de ver mais que os outros, ainda que TODOS os personagens vejam em algum momento algo espiritual materializado – e até o alivio cômico de Frenchie não funciona 100% das vezes, embora seja ele o mais complexo dos personagens. Se isso não fosse o bastante, a  criatura enfrentada pelos heróis é só um mal inexplicável, não há qualquer menção a se estudar o que fez aquela criatura estar ali, fora uma explicação bastante genérica e lugar comum, tampouco há um mergulhar mais fundo no motivo que faz a manifestação maligna assumir a figura de uma irmã de fé que fez os votos, tudo ali é absolutamente gratuito e em última análise, denigre até a saga original como um todo dada a total falta de desenvolvimento.

    A Freira, tal qual Anabelle de John R. Leonetti, promete ser ousado, mas fora os cenários magníficos, não há nada que fuja do usual seja em termos dramáticos, técnicos ou de desempenho do elenco, o que é uma lástima, visto que a atmosfera parecia conter algo diferenciado desde o seu início.

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  • Crítica | A Maldição da Floresta

    Crítica | A Maldição da Floresta

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    Um “filme de terror” requer novos critérios para acompanhar esses novos tempos, em especial critérios de comparação com outros do gênero. Na tradição mais básica do movimento, o medo se manifesta em saltos quânticos de terror e compaixão, seja pela arte do susto ou de um gênero fadado ao fascínio de uma plateia que paga, que devota tempo (e fé na arte) para sentir na pele uma experiência amedrontadora que pode – ou não – ser a exceção em relação a quantidade de filmes ruins de terror lançados nos últimos anos. Hoje em dia, em tempos que um curta-metragem como Lights Out de 2014 é a tal da exceção, assustando mais que boa parte dos longas.

    Tal forma de avaliação vem sendo o terror de críticos ao redor do mundo, com medo de se distanciar do material e acabar incorporando simetrias perigosas não ao pensar, mas ao sentir: Ora, se o critério principal de uma comédia é se ela nos faz rir ou não, um filme de terror tampouco cumpre seu papel se não nos perturbar, chegando ao ponto de fazer nossa criança interior dormir com as luzes acesas. A comparação ganha pontos na crítica neste sentido, pois se os outros ‘monstros’ de Hellraiser já tiraram o sono de muita gente, e é também isso que o torna um bom filme, o que as criaturas de A Maldição da Floresta conseguem fazer conosco?

    Apologia a violência e vulgarização dos seus mitos já era algo esperado, enquanto o filme de Corin Hardy chega à beira da banalização como tantos outros exemplos recentes no Cinema ao se distanciar, cada vez mais, do horror expressivo e contido que o Nosferatu de F. W. Murnau carrega, neste exemplo bem básico, cuja omissão de elementos antes da hora do showtime só aumenta o nosso horror presenciando o fúnebre vampiro! Num filme bem mais explícito, sangrento e cheio de vísceras como A Maldição da Floresta, mais é sempre mais, pois o exercício do olhar é reinante e o contrário apenas afasta a história de seu propósito original: Chocar! Impressionar!, e é apenas isso que os monstros aqui nos produzem: Zero empatia e muita exclamação!

    Nota-se, porém, antes de exibir seus monstros (um bando de zumbis cor-pastel que parecem uma massa de pão derretida) a obra produz muito mais calafrios do que quando, de fato, os expõe: Sinta como o cenário e a luz opaca, na cena das fotos no jardim, nos faz sentir que algo pode pular a qualquer momento, de qualquer lugar, brincando com o lado horripilante da construção audiovisual da expectativa num filme que não trai seu gênero, respeita (de forma barata) seus elementos e nos impõe receio pela escuridão. Tudo isso, pelo menos, antes do mais banal dos finais.

    Contudo, sabotamos a necessidade de comparação com outros filmes, a partir de agora, com uma ótima frase do mestre Eduardo Coutinho que sempre vem a calhar, em especial num filme de horror/terror/suspense: O que é invisível não deve ser mostrado (uma paráfrase do mestre brasileiro, na verdade, com a frase de outro pensador europeu). O que vale, então, na arte do escancarar? Do tudo ao nada, o trash e o terrir sempre acharam berço e acolhimento no exagero do sangue jorrado, na marginalidade sem medo de rasgar esse medo e tocar sua fonte. O escancarar, aqui, é preciso e valorizado, mesmo se pensarmos brevemente. Porém, nota-se como o desenvolvimento da história, nesse filme, é traído em partes pela enorme responsabilidade de assustar livremente, e duma forma como só um filme não-comercial consegue assustar (vide Encarnação do Demônio), o que não é o caso aqui.

    É claro que o relacionamento de uma família que se muda para uma floresta e começa a ser atormentada por demônios que vivem no local poderia ser mostrado de forma mais sofisticada se o tempo na tela, da relação entre eles, enriquecesse a trama, e não o contrário – apenas nos importamos com a família quando começam a ser submetidos à influência maligna dos monstros, o que jamais deixa de ser um tiro no pé da dramaticidade almejada. Pai, mãe e bebê entram numa espiral de carma, correria e gritaria que só nos assusta porque nos importamos mais com o bebê que com a ameaça dos ‘zumbis’. Uma forma mais que garantida de manipular as nossas fundações éticas e nossos níveis de tolerância com o drama alheio, tudo em torno de uma recepção artística.

    E mesmo quando, no caso, os artistas não reconheçam o poder do gatilho que têm em mãos. Hardy dirige sem dificuldades mais uma página do terror e torna-a despretensiosa, entendendo em partes o que a história precisa, e fazendo um filme que agrada os fãs menos exigentes do gênero, já que boas cenas aqui e ali dão conta do recado. A concepção de medo nos é apresentada de forma regular, até certo ponto, quando o filme tenta entender seus demônios, e assim, perto do fim, tira seu mistério, seu fascínio; desmitifica-os, e isso, A Maldição da Floresta nunca poderia fazer. O que a obra representa na sua arte? Mais uma página, um tanto dispensável, é verdade, de um livro com outras páginas (e capítulos!) bem mais saudáveis a quem se importa com o que consome.