Crítica | Debi & Lóide: Dois Idiotas em Apuros
O começo tímido, que se vale de piadas sexistas pouco ofensivas, introduziria uma dupla de protagonistas estúpidos, pensada pelos irmãos Peter e Bobby Farrelly. Lloyd (Lóide) Christmas (Jim Carrey) é um condutor de limousine de moral frágil e que tem na figura de sua patroa Mary Swanson (Lauren Hoolly) a sua musa. Seu pouco traquejo com as mulheres garante momentos de absoluta comicidade e falta de noção, com explosões tomando a estrada enquanto pratica direção perigosa. A despedida de sua amada – que acabara de conhecer – é emocionante, segurando o público de imediato, inserindo-o no drama. Logo ao acenar o “tchau” para a moça, após uma trapalhada, o espectador percebe uma trama policial escondida atrás de toda a pataquada da fita.
Do outro lado da cidade, sua contraparte Harry Dunne (Debi, na versão brasileira, interpretado por Jeff Daniels) exibe todas as suas inabilidades como cuidador de cães. Ao final do dia, os dois amigos voltam ao apartamento que compartilham, desempregados, fruto, é claro, da incompetência de ambos. Cansados de fracassos sucessivos, eles resolvem se aventurar, viajando para Conneticut a bordo de seu cachorro-móvel.
Na estrada, eles arrumam confusão com alguns caipiras, demonstrando covardia e instinto de sobrevivência, algo que os faz pregar peças nos bullyers e até nos policiais. A hilaridade idiota é a tônica dessas interações. No decorrer da viagem, Lóide tem sonhos de cunho erótico com Mary, imaginando os momentos em que o romance finalmente se concretizaria, incluindo rodas de amigos cujo centro das atenções era ele e suas piadas. Em determinados pontos, ele fantasia discussões intensas nas quais destila seus supostos dotes de briga, espancando um restaurante inteiro, como um Bruce Lee retardado, tomando o coração do chef, à força, para logo depois sonhar com as curvas de Mary, em que os seios expostos da garota como faróis de caminhão demonstram que a virgindade é o maior trunfo do personagem.
A química entre Carrey e Daniels se dá especialmente pela troca de ofensas e pegadinhas entre um e outro, uma eterna competição para provar quem é mais infantil e imbecil, quase sempre sendo Lóide o vencedor. Qualquer um que atravessa o caminho da dupla sofre as agruras de estar ao lado de pessoas tão incrivelmente irritantes, mas absurdamente gentis e solícitas. Curioso como a ingenuidade dos dois consegue cooptar também um bom coração.
À procura da bela mulher, os amigos sofrem muitas perdas, até terem noção de que carregam uma maleta repleta de dinheiro. O consumo indiscriminado de dinheiro nos eventos mais supérfluos possíveis. Suas atitudes fazem mal a praticamente tudo que os envolve, deixando um rastro de destruição ao matarem aves raras e esmigalhando propriedades públicas enquanto tentam se divertir.
A rivalidade entre os dois se acirra ao perceberem estar os dois emotivamente envolvidos pela(s) mesma(s) mulher(es), algo natural, uma vez que há falta de tato de ambos com o sexo oposto. Logo, Lóide acaba por passar pelo destino da mesma moça que flertou antes com Harry, enquanto o amigo loiro se diverte na neve com Mary. A mágoa atinge a personagem de Jim Carrey, que não consegue esconder sua frustração e se vinga dele, pondo laxante na solução alimentícia do amigo.
A disputa faz com que Lóide se jogue desesperadamente nos braços de sua amada, tentando se declarar a ela, se frustrando após descobrir que ela é na verdade uma pessoa casada. Após muita discussão e situações das mais toscas possíveis, os dois seguem seu caminho, retomando o valor da amizade, salvando um ao outro, mostrando uma inexoravelmente unida relação que suporta toda e qualquer barreira. A comédia dos Farrelly não tem qualquer mensagem edificante ou evolução aparente, mas dá voz a valores simples, como companheirismo e desapego material, sob uma ótica boba que fez muito sucesso entre o público infantil e ajudou a salientar um subgênero da comédia, que se vale de pastelões e de piadas físicas.