Crítica | Casa Vazia
Casa Vazia chegou com expectativa ao circuito de festivais, depois de outro grande filme do diretor: Primavera, Outono, Verão, Inverno… E Primavera, lançado um ano antes.
Na trama, o jovem Tae-Suk invade casas vazias de pessoas que estão em férias e vive alguns dias até conhecer a mulher, Sun-Hwa, que passa a acompanhá-lo. O roteiro do próprio Kim Ki-Duk mantém uma das principais qualidades autorais do diretor. Ao basear a sua narrativa em invasões de casas alheias, ele passa a discutir a busca do protagonista por uma identidade: quem ele é? O quer encontrar e onde? Tae-Suk não liga para o seu passado, sua família? Ao registrar a sua passagem nos lugares através de fotografias, o protagonista deseja fazer parte daquele universo particular?
A segunda casa que ele invade está ocupada por Sun-Hwa, uma mulher submissa ao marido que acaba pedindo ajuda. Ele espanca o abusador e a resgata, fazendo com que ela agora faça parte da sua trajetória. As casas vazias que ambos ocupam agora são preenchidas com mais vida. Ser errático passa a fazer sentido.
Ao se deparar com um cadáver em uma casa invadida, eles decidem dar um enterro digno ao falecido, demostrando que a sua jornada estava chegando ao fim. Não à toa eles são detidos pela polícia e se separam: Sun-Hwa volta para o seu marido abusador e Tae-Suk segue para a prisão.
Há uma quebra na narrativa, porém o objetivo dos dois permanece: ela continua a negar o seu marido, mas não sai de casa. Ao invés disso, começa a invadir outras casas por conta própria; ele tenta se transformar em uma sombra na prisão, e quando retorna à sociedade volta a ocupar casas sem ser visto, como um fantasma.
A direção de Kim Ki-Duk é sublime na posição de câmera ao fazer com que a composição do quadro demonstre o vazio das casas e principalmente dos protagonistas. A narrativa visual demonstra o domínio do diretor sobre a linguagem cinematográfica ao subverter o roteiro padrão de narrativa clássica por meio de poucos diálogos.
A atuação de Lee Hyun-Kyoon consegue imprimir a personalidade necessária em Tae-Suk, um jovem sem perspectiva, fechado, perdido, porém que toma atitude quando necessário. Lee Seung-Yeon consegue fazer com que Sun-Hwa seja a esposa submissa e introspectiva que vai se libertando aos poucos das amarras da vida matrimonial e social.
A boa fotografia de Jang Seong-Back no começo do filme é pouco saturada, sem cor, sem vida e ao longo da narrativa a saturação vai aumentando aos poucos, de acordo com as ações dos protagonistas. A edição do próprio diretor deixa a obra ainda mais autoral. O filme não perde o ritmo em nenhum momento, mas talvez outro profissional poderia dar mais personalidade à edição linear da obra, principalmente nas cenas da prisão.
Casa Vazia vale a pena pela proposta diferente de narrativa que Kim Ki-Duk nos trouxe, figurando entre a boa direção, o roteiro e a fotografia, além das questões que o filme aborda deixando perguntas para o espectador refletir.
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Texto de autoria de Pablo Grilo.
Nota: 4 estrelas.