Resenha | Arqueiro Verde: Os Caçadores
Os Caçadores é uma das histórias clássicas e mais elogiadas do Arqueiro Verde, junto à união dele com Hal Jordan em Lanterna Verde e Arqueiro Verde. Lançada em 1987, com roteiro e arte de Mike Grell, com o auxílio de Lurene Hainrd, e as cores de Julia Lacquement, resultando num trabalho visual e dramático sem igual.
Em 1987, a mega-saga Crise nas Infinitas Terras já havia revolucionado a cronologia da DC, e as influências nas histórias e ontologias dos personagens já havia ocorrido. Batman: O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, abriu as portas para que obras com uma temática mais adulta pudessem ocorrer, e Os Caçadores vai nesse sentido, buscando temas pesados e discussões político-sociais.
A riqueza da história mora em representar, através dos vilões, realidades muito fáceis de encontrar nas áreas urbanas de qualquer grande cidade do mundo. A abordagem busca algum nível de realismo, com questões abrangendo assassinatos, estupros, tráfico de entorpecentes, e isso se reflete na própria arte. Engraçado como há um número grande de semelhanças com Watchmen, não só na abordagem mais adulta de Alan Moore, mas também pelos desenhos, que remete ao traço de Dave Gibbons.
Grell não esquece de referenciar os elementos clássicos do herói, toda a parte que relembra as histórias do Arqueiro e a introdução da Canário Negro é simplesmente deslumbrante, não só pela beleza de Dinah Lance, mas também por sua presença impor um respeito não apenas artístico, mas pelo texto e diálogos escritos. Além disso, o roteiro também lida com questões envolvendo o casal, como receio de qualquer relação duradoura, desde convivência, casamento, filhos, etc.
O modo como o gibi lida com Shado, a vilã asiática é um conceito muito bem utilizado. Até na versão audiovisual de Arrow, que por acaso teve em Grell o desenhista das adaptações para os quadrinhos, ela também é bastante importante. Além disso, esta versão lembra bastante O-Ren-Ishii, personagem de Lucy Liu em Kill Bill, e não surpreenderia se Quentin Tarantino tivesse a usado como uma das fontes de inspiração para a personagem, uma vez que até o Superman foi referenciado por David Carradine no segundo volume.
A contraposição de Shado e do Arqueiro produz quadros incríveis, é como se o traço tradicional do Superman de Curt Swan se encontrasse com o quadrinho marginal europeu. As flechas cortando os bandidos, banhadas em sangue dão um efeito gráfico interessante, e por um momento, colocam em cheque a honra do herói. Parte da essência do Arqueiro Verde é o fato dele perverter o uso de flechas para um alvo não letal. O arco e a flecha são armas ideais para acertar um inimigo forte, sem barulhos estrondosos e sem maiores consequências, mas ele as usa para atordoar, já Shado é o inverso, um anjo vingativo que sucumbe ao pecado da vaidade e da vingança, e essa comparação ajuda a compor todo o código ético do personagem. Queen passa por problemas, encara os bandidos como eles são, e ao ver o torpor de sentir que eles estão mortos e que pagaram por seus atos maus, ele sente um pouco do que é o prazer de ser o juiz, o juri e o carrasco, e isso envolve dilemas morais e éticos dentro da história.
Muitos fãs gostam de afirmar que essa é o equivalente ao Cavaleiro das Trevas do Arqueiro Verde. Isso até soa reducionista, mas não é totalmente sem cabimento ao menos em um ângulo, dado que ambas tem um tom mais maduro que as histórias comuns de super-heróis e elevam para outro patamar esses personagens. Uma grande história para um grande personagem, que felizmente foi republicada na coleção de Graphic Novels da editora Eaglemoss, depois de mais de décadas fora do mercado, quando a editora Abril a publicou no distante ano de 1989 em três partes.