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  • Crítica | Amor, Plástico e Barulho

    Crítica | Amor, Plástico e Barulho

    Amor, Plastico e Barulho 1

    O nome extenso e composto esconde uma intenção pseudo-simplista da diretora Renata Pinheiro. Amor, Plástico e Barulho brinca com os elemento do ritmo tecnobrega, cada vez mais popular no Brasil, que ganha as ruas a partir do Norte/Nordeste para contar uma história de vaidade e narcisismo, mostrando uma jornada de intensa competição e rivalidade feminista, duas trajetórias, duas mulheres, que dividem os mesmos amores.

    A trilha que mistura ritmos populares no estado de Pernambuco, resgata elementos do forró, misturando com a batida groove, produzindo um cenário ideal para a prática bulímica que ocorrerá em tela, que já no primeiro momento, discute a glamourização das moças de família, que se escondem atrás de saltos agulhas e maquiagens fortes, capazes de embelezá-las e sexualizá-las, mas não de esconder suas carências e necessidades básicas.

    A arte musical é a oportunidade de avanço e apogeu econômico, possivelmente o único modo de “sair da lama”, primeiro para a protagonista mais vivida, Jaqueline Carvalho, interpretada pela premiada Maeve Jinkings. A personagem é dançarina e vocalista principal da banda Amor com Veneno, cujas letras melosas engodam o coração de homens e mulheres de origem humilde, cuja exploração do corpo e do sexo é uma das poucas formas de livre expressão.

    O protagonismo do filme é divido com a personagem Michelle “Shelly” (Nash Laila), outra das dançarinas da Amor com Veneno, que guarda um sonho de poder cantar dentro dos shows da Amor com Veneno. Por trás das palavras cafonas e imagens de gosto duvidoso, esconde-se uma enorme vontade de ascensão social também da parte de Shelly. Entre os detalhes nas partes erógenas de suas personagens, o progresso sofre uma amálgama com a sensualidade, reforçando a formula comum ao homem simplório.

    A duplicidades de personagens heroicos femininos tenta combater o pensamento misógino em meio a um mundo comandado por homens poderosos, usando o showbizz brega como a representação do mundo externo, mas sem livrar suas personagens de viver tentações e traições. Cor, dança, figurinos escalafobéticos, contribuem para o verniz da banda retratada, cuja nitidez de imagem contrasta com o aspecto embaçado dos comerciais do governo, com os poderosos distante da realidade enquanto o “comum” é próximo do público consumidor.

    Os períodos do dia servem de elemento narrativo, explanando a miséria econômica e sentimental das duas rivais, mostrando que o mundo e dramas de ambas é compartilhado. Pela manhã há a contemplação do ócio, enquanto a noite explora-se e “degradação do corpo”, claro, factoide este destacado pelos olhares do espectador mais identificado com o moralismo.

    Os diálogos naturalistas presentes no roteiro de Pinheiro e de Sérgio Oliveira destacam que o “brega” dá voz a multiplicidade de interpretações das relações humanas. A utilização indiscriminada do gênero musical não exige do público qualquer conhecimento ou apreço pelo ritmo, uma vez que o fato é irrelevante, servindo apenas como pano de fundo, como era o Jazz para Whiplash e o Balé para Cisne Negro.

    Impedida de enfim estrear como cantora, Shelly exibe uma tristeza que predomina entre os elementos visuais. Mesmo estando maquiada, bela e pronta para a ação da noite, ela é incapaz de demonstrar qualquer reação positiva, sofrendo medo de ser enfim rejeitada pelo público e empresariado. Ao enxergar a decadência de sua antiga rival, impera o sentimento de obsolescência, que por sua vez trava um duelo com a insignificância e invisibilidade entre as gerações. O medo maior é o perigo de ser ordinário, de não alcançar a notoriedade buscada por todo o decorrer do filme.

    A resignação de quem percebeu dedicar seus dias a um ofício fútil, que ignorava até os entes queridos faz enfim Jaqueline cair em si, retornando a casa de seus familiares. Os aspectos simples como purpurina, plumas, neon e a batida prosseguem no ideário de Shelly, que ainda não aceitou a derrota, mesmo com a rejeição do público e decadência de sua contraparte. Renata Pinheiro traz uma história realista, que flerta com a fantasia e o torpor da fama, deixando a sina do insucesso acometer seus personagens, elevando as estatísticas ao patamar de protagonista.

  • Crítica | O Som Ao Redor

    Crítica | O Som Ao Redor

    osomaoredor

    Na crítica da produção brasileira A Busca, mencionei que, tradicionalmente, a composição de uma história – seja narrativa cinematográfica ou literária – transita de um ponto de arranque a outro, tendo, nesse caminho, uma série de acontecimentos que podem, ou não, transformar a personagem central.

    Paralelamente a este estilo de história com uma intenção clara, há outras que se completam por um todo maior, como pontas que se apresentam a cada momento e que se unem somente no final.

    Estas declarações servem como afirmativa de que, embora tenha reconhecido que O Som ao Redor produziu muitas críticas positivas, não fui capaz de, após assisti-lo, ou após refletir a respeito do que assisti, encontrar um significado que representasse o filme com toda sua dimensão.

    Como infere o título, a trama parte de um bairro e faz dele uma personagem que permeia todas as histórias situadas na mesma rua. A sensação de invasão sonora é constante. É um dos longas brasileiros com melhor integração entre som gravado e ambiente que já assisti. Tem-se a sensação de estar inserido na cena ao reconhecer os barulhos cotidianos que estão presentes em qualquer ouvido de quem vive em uma metrópole. Essa identificação universal faz com que o público sinta que, mesmo sem uma história aparente, poderia ver seu próprio bairro refletido na história.

    O longa é divido em quatro partes, apresentando o único elemento novo no bairro: um grupo de vigias que deseja trazer mais segurança aos moradores. A concepção de capítulos dentro de uma história apresenta com mais nitidez o conceito de que estamos acompanhando tramas, como capítulos, que chegaram a algum lugar somente em seu final. Porém, este desenlace parece desimportante, e um tanto senso comum, que nem parece ter sido considerado primordial na concepção de seu diretor.

    O que mais se destaca são as relações estabelecidas pela história, mostrando como um grupo coletivo, mesmo vizinhos, tem seus problemas, amores e ódios. É a partir destes personagens, e do próprio bairro como um deles, que identificamos as intenções que não se mostram explicitamente.  Um recorte da vida cotidiana que não esconde nenhum de seus lados.

    Na recente polêmica entre Kleber Mendonça Filho e Carlos Eduardo Rodrigues, ex-diretor da Globo Filmes, sobre filmes comerciais ou não, vale afirmar que não há nada que transforme a trama de O Som Ao Redor em uma produção hermética. Sem dúvida pode afastar quem não está acostumado a uma narrativa que não se revela por completo, necessitando de uma observação mais atenta de que vê. Mas o problema, neste caso, não é da comerciabilidade ou não do produto, mas talvez de um público acostumado a ver histórias mais rasteiras e – como tem sido padrão em muitos cinemas brasileiros – em versões dubladas.