Tag: Noah Hawley

  • Review | Legion – 2ª Temporada

    Review | Legion – 2ª Temporada

    As primeiras imagens da nova temporada de Legion começam como um dia comum, com sol, piscina e alguns dos personagens se divertindo. Os personagens são Lenny Busker (Aubrey Plaza) e Oliver Bird (Jemaine Clement), e esse ponto faz confundir momentos reais com manifestações de estado de espírito do seu protagonista, ou mesmo devaneios, já que em dado momento da 1ª Temporada de Legion, ambos estavam dentro da mente do personagem ou cercando o seu espírito, como predadores e devoradores mentais.

    A série de Noah Hawley começa esse ano brincando até com o conceito de produto hermético, abrindo possibilidades de compreensão múltiplas, tantas quanto o número de personalidades de David Haller (Dan Stevens). Interessante notar que o funcionamento lúdico de seu aparelho psíquico ocorre durante a maior parte da duração dos primeiros episódios, visando explicar o rapto que o personagem sofreu no último episódio da temporada anterior.

    Hawley faz de novo uso de cenas onde o lúdico prevalece, mostrando as viradas de humor e desordem mental do protagonista – e também de outros, uma vez que aqui o estudo passa a ser sobre a mente humana como um todo – através de situações cotidianas, mostrando desde pessoas dançando em boates até cheerleaders sofrendo surtos psicóticos repentinos. Alguns momentos remetem aos filmes mais inspirados de Terry Gilliam, embora se note também uma influência forte de Alejandro Jodorowsky, ainda mais nas cenas com planos que contemplam paisagens enormes, com pessoas agindo de maneira louca.

    A maior  parte dos onze episódios mostram a tentativa de David em sair do transe que lhe parece imposto, tentando enfim entender onde está e o que aconteceu consigo, e principalmente, tentando compreender qual é a sua ligação, seja sentimental ou psíquica, com Shadowking (ou Rei das Sombras, como é chamado nas HQs). A versão que Lenny faz é bastante explorada, fato que permite que Plaza mais uma vez seja muito explorada e possa mostrar seu talento, que aliás, não é pouco.

    A performance de Plaza ajuda a deixar ainda mais difuso e nebuloso o lugar exato onde o Mestre das Sombras está, já que na primeira temporada, ele parecia estar alojado em David, e nessa não se sabe se ele está vivo, se esta no plano astral ou com algum hospedeiro físico. Lenny não sabe exatamente qual é seu papel dentro dessa equação, e sua busca por entender o que fazer faz ela dividir com Heller o protagonismo em boa parte da trama, já que seu destino também parece trágico.

    Outra expectativa em relação a série e a essa segunda temporada, é a de verificar a paternidade do protagonista, sem explicitar que ele pode ser filho do professor Xavier, no entanto o real mote de segundo tomo é a demonstração de quem Dave realmente é, não tanto sua origem ou sua árvore genealógica e sim seu modus operandi e a forma como lida com seus fardos e suas múltiplas personalidades. Um estudo sobre o ser.

    A criação de Chris Claremont e Bill Sienkiewicz nos quadrinhos é mais encarada como vilã do que como uma pessoa perturbada mentalmente, e a realidade que Hawley tenta imprimir aqui é que essas duas facetas não se auto-anulam. A carência pela qual Dave passa não o exime dos pecados que cometeu, tanto nos quadrinhos quanto no seriado e o modo como a série desenvolve essas questões são interessantes por conseguir mostrar toda a potência que existe na mente do personagem, como na multiplicidade de seu caráter.

    O final beira o apoteótico e abre possibilidades quase infinitas de interpretações, seja de onde se passou todo esse ano seja do futuro dali para frente, já que a série foi renovada, provavelmente para uma última temporada, dado a baixa audiência. Os últimos momentos do décimo primeiro episódio dessa temporada abrem margens para discussões ainda mais graves, mostrando o personagem sob um olhar que ao menos na TV ainda era inédito, e por conseguir construir um código ético tão complexo sem deixar de lado a apelação ao abstrato, Legion acerta demais, sendo algo genuinamente único.

    https://www.youtube.com/watch?v=QKa-eCvVjTM

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  • Review | Legion – 1ª Temporada

    Review | Legion – 1ª Temporada

    O seriado do FX que explora o ideal do personagem David Haller, mutante conhecido como Legião, começa com o clássico do The Who, Happy Jack, que serve como uma boa introdução para o passado de Haller, mostrando-o já adulto, interpretado por Dan Stevens, lidando com as questões mentais que atormentam o personagem desde cedo. O primeiro episódio de Legion não se preocupa em explicar muito, nem sobre a natureza dos poderes mutantes de Haller, nem sobre seu passado.

    O nome legião é uma referência bíblica a uma pessoa possessa que foi liberta por Cristo. Os demônios que habitavam o corpo do possuído usavam esse nome para aludir a multiplicidade de identidades demoníacas ali presente. David é um sujeito com múltiplas personalidades e nos quadrinhos, estas surgem quando uma nova mutação ocorre em sua psique. Ele é um mutante nível Ômega, categoria essa que abarca somente os portadores de Gene X mais poderosos, como Fênix, Apocalipse, Feiticeira Escarlate e alguns poucos outros.

    O modo escolhido por Noah Hawley (Fargo) e demais produtores para demonstrar o conflito do protagonista ao ter de lidar com uma mente poderosíssima e ainda assim doente é através de cenas no interior de um hospital psiquiátrico, onde o sujeito dá vazão a algumas de suas múltiplas versões de personalidade e pensamento, variando entre momentos onde o mesmo é interrogado e onde ele convive com as versões de sua mente, cada uma com corpo e características únicas.

    Essas representação do Ego se confundem com pessoas reais, variando tanto com o seu medo, materializado em Lenny Busker (Aubrey Plaza), que faz referência a um vilão de Charles Xavier (seu pai nos quadrinhos), até o seu par, Syd Barrett (Rachel Keller), uma linda moça que o faz se apaixonar a primeira vista e que se confunde com uma das tantas versões esquizofrênicas de sua mente. Aos poucos, Syd demonstra que também tem peculiaridades semelhantes as de Dave, fato que a faz um par quase perfeito ao protagonista.

    As manifestações começam caricatas e vão ganhando importância e seriedade em meio aos oito episódios, sendo a principal delas a já citada Lenny, que começa como um estágio primário da mente e evolui para uma face negativa. Há referências claras ao cinema do britânico Ken Russell, em especial nos mergulhos psicodélicos a mente do personagem título, que demonstra insegurança e instabilidade mental frente ao seu adversário em momento que variam das homenagens ao cinema mudo até claras homenagens as musicas de abertura dos filmes de James Bond.

    O temido vilão tem um caráter tão dúbio quanto o ideal da série, variando entre o belo e o grotesco, sendo esse último uma versão bastante assustadora e ameaçadora, parecida com os monstros dos filmes de horror populares nos anos noventa. A trama envolvendo a família e origem de Dave ajudam a acrescer na empatia do público junto ao herói e conseguem finalizar bem o drama proposto por Hawley, alimentando tanto o espectador mais ávido por uma história misteriosa e profunda, mas sem deixar os fãs de quadrinhos que buscam uma aventura mais escapista com algum alento.

    Legion termina com destinos diferenciados para seus coadjuvantes e um gancho misterioso envolvendo David e suas origens parentais, levantando a possibilidade até de se explorar isso em futuros lançamentos. A junção de texto mirabolante e direção de arte bem encaixada ajudam a tornar o programa de conteúdo profundo, relevante e bem urdido no sentido de falar das agruras sentimentais e distúrbios mentais, sem tratar seus personagens como seres coitados.

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