Crítica | Um Fim de Semana em Paris
O músico Chico Buarque, que dispensa apresentação, pergunta-se, em sua canção Almanaque, para onde vai o amor quando ele acaba. Uma reflexão metafísica e coerente com o estabelecimento de qualquer relação amorosa que, mesmo longeva, é transitiva.
Dirigida por Roger Michell (Um Lugar Chamado Notting Hill, Amor Obsessivo, Vênus), a história de Um Fim De Semana em Paris dedica-se ao tempo contínuo do amor, apresentando um casal que vive junto há trinta anos e viaja a Paris para comemorar as bodas de Pérola.
Meg e Nick são um casal desencantado pela vida. Vivem juntos um tempo considerável que não produz margem de surpresas. Conhecem a personalidade um do outro, as pequenas manias e reclamações, cientes de que a solidez do amor não poupa mais palavras e, assim, dialogam abertamente sobre os desígnios da vida, a velhice, o tempo e o amor compartilhado em conjunto.
Recentemente, voltaram a viver sozinhos sem a presença dos filhos. Um passo muito comum entre diversos casais que criam filhos por um longo período e, após os filhotes saírem de casa, deparam-se com um vazio e o estranhamento em relação ao que fazer com o tempo e a liberdade. Normalmente, é neste período que marido e mulher voltam a pensar em si e na unidade de um casal, ainda que o tempo consumido para gerar um filho tenha modificado visivelmente as percepções de vida.
Na cidade luz, os ânimos ficam acirrados pela comum expectativa que qualquer viagem simbólica e comemorativa é capaz de gerar. A Paris conhecida anteriormente foi modificada pelo tempo. Tentando não destruir a celebração, o marido faz concessões aceitando ficar em um local caro, sem esconder a insatisfação.
A proposta do longa-metragem é a busca sobre a temporalidade do amor e como histórias de longa durabilidade são vividas diariamente. Mesmo com o amor presente, há uma leve amargura em cena, evidenciando que o amadurecimento não gera a sabedoria imaginada popularmente em uma jornada de crescimento. Cada ser humano ainda carrega dentro de si medos e dúvidas que, se por acaso dissipadas, darão espaço a outros lugares escuros.
Jim Broadbent e Lindsay Duncan fazem um casal ponderado, sem extremidades dramáticas evidentes, afinal a proximidade e a intimidade podem gerar menos espaço para cenas e grandes discussões. De maneira honesta, discutem a sexualidade, a ausência do desejo em relação ao tempo e as maiores fragilidades sentidas neste momento da vida: Nick ainda incrédulo por manter uma relação madura, amorosa e duradoura, e Meg irritada pela falta de confiança do marido após a dedicação de uma vida juntos.
De fato, estar ao lado de outra pessoa não significa uma total completude interna dentro dos seres. Cada qual vive à margem um do outro, e neste espaço permanecem também medo, dúvidas e afins. Não à toa o poeta Rilke, como outros escritores, viram o amor como uma espécie de solidão vivida a dois. Uma maneira mais suportável de viver a vida e a solitude da existência na companhia e no amor ao lado de outra pessoa.
A tensão amarga e amorosa do casal resulta em uma única cena epifânica, mas suficientemente eficaz para exemplificar como o amor denota dedicação constante, mostrando como as dificuldades de viver a dois nunca terminam diante das lacunas, tentações e outras fissuras inerentes a todos nós.