Com o perdão da injusta comparação, o diretor catalão Jaume Collet-Serra é como Clint Eastwood quando escolhe um filme para dirigir. Ele não entra pra perder ou fazer feio. Assim como o oscarizado diretor, Serra escolhe seus projetos a dedo e o resultado, ainda que não seja de prêmios em festivais ou de produções que acarretam caminhões de dinheiro, é sempre satisfatório por um simples motivo: o público adora seus filmes regados de suspense e o sucesso daquele determinado projeto se dá por meio do boca à boca entre as pessoas. Com certeza algum amigo já te indicou algum filme dirigido por Serra, seja A Casa de Cera, A Órfã, Desconhecido, Sem Escalas ou o estiloso Noite Sem Fim.
Em tempos de pérolas como a franquia mítica e milionária Sharknado e de produções porcas como Mega Shark Vs Crocosaurus, o gênero que se leva a sério de filmes envolvendo tubarões ficou esquecido após o viral Mar Aberto, fazendo com que o clássico Tubarão, de Steven Spielberg, se mantivesse no topo e com uma larga vantagem em relação às demais produções.
Blake Lively vive Nancy, uma estudante de medicina indecisa com relação ao seu futuro, mas que adora surfar. Ela, aparentemente, não se dá muito bem com o pai, principalmente após a morte de sua mãe e por isso resolveu viajar o mundo para celebrar sua memória. E é aí que ela resolve procurar uma praia secreta que nenhum nativo revela o nome, sendo que tudo que nós sabemos até então é que a protagonista viaja com uma amiga que não lhe acompanha por estar de ressaca, uma vez que podemos acompanhar junto de Nancy o que ela escreve ou lê quando está em contato com sua amiga ou sua irmã mais nova.
Chegando à praia, Nancy faz amizade com dois nativos surfistas e o que vemos em seguida é uma série de belas imagens relacionadas à prática do surfe. Nesse ponto, é possível que o espectador se irrite porque a produção não apresenta até aquele momento nada conceitualmente novo, principalmente no que diz respeito aos surfistas e a sensação é de estar assistindo a algum documentário feito por algum canal de esportes radicais. Porém, tudo muda quando os surfistas decidem ir embora, deixando Nancy para uma “última onda”. Acontece que uma baleia morta atraiu um enorme tubarão branco para as águas rasas da praia.
Fica extremamente difícil escrever sobre o tema sem contar o que acontece, mas, de qualquer forma, o drama da jovem faz com que o espectador a acompanhe de perto, como se estivesse ao seu lado, sentindo, quase que literalmente, sua dor pelas próximas horas, sendo que tudo que Nancy tem para lhe auxiliar são seus objetos pessoais que lhe acompanhavam ao mar, como seu relógio, sua roupa de mergulho, seus brincos e um pingente, além de conhecimentos básicos sobre a movimentação das marés, o que adiciona ainda mais urgência à trama e sua resolução. Vale destacar que não é por acaso o fato dela ser praticamente uma médica, pois qualquer outro surfista sem conhecimentos da medicina chegaria a óbito logo na metade do filme. Uma solução suja, porém, necessária para manter a personagem por tempo suficiente em tela.
Os méritos de Águas Rasas, curiosamente, não se dão pelas características já conhecidas do diretor que costuma contar histórias peculiares com uma boa dose de estilo, mas sim pelo fato dessa história ser a mais simples possível, onde uma mulher que passa por um trauma faz com que seu instinto fale mais alto do que a própria razão, ainda que quem esteja lá do outro lado seja alguém que está no topo da cadeia alimentar. Dessa forma, créditos também cabem à Blake Lively que mostrou ser uma atriz extremamente versátil nas diversas situações em que a vemos durante quase uma hora e meia de filme. E por que não falarmos da simpática gaivota que, assim como Nancy, passa por drama semelhante? A interação entra as duas é um destaque a parte.
Com isso, podemos dizer com segurança que Águas Rasas entra para o “hall da fama” de filmes de gênero sobre tubarões.
–
Texto de autoria de David Matheus Nunes.