Tag: Blake Lively

  • Crítica | Um Pequeno Favor

    Crítica | Um Pequeno Favor

    Há cineastas e produtores das mais variadas pretensões. Desde revolucionar com muita grana o espetáculo cinematográfico que conhecemos (James Cameron, Steven Spielberg, Kevin Feige), até representar a alma efervescente do país e do momento em que enfrenta (Jean-Luc Godard, Glauber Rocha, Roberto Rossellini). Claro que o esforço do primeiro tipo ganha muito mais atenção por parte do público, mas abençoado seja aquele que não perde o foco da sua ambição. No caso de Paul Feig, do sucesso Missão Madrinha de Casamento (inexplicável, até hoje) e o Caça-Fantasmas de 2016 (todos têm um Esquadrão Suicida na carreira, certo?), o cara faz o tipo do entertainer mais clássico que há, o que apenas deseja divertir a plateia, mas diferente dos mestres que tanto nos fizeram rir até mesmo sem falar uma palavra, ele por sua vez vive para apostar o seu (nosso) tempo em produtos fabricados para serem degustados, e afetados pela amnésia que vem na volta a realidade que seus filmes nunca nos conseguem fazer fugir, de verdade.

    A primeira dúvida do espectador pode ser aonde está Melissa McCarthy, presente em quase todos os filmes de Feig até agora, e aqui substituída pela doce Anna Kendrick, sempre perfeita para o papel da “inocente” melhor amiga, no caso, da super mulher executiva e rica que conhece, Emily (Blake Lively), quando ambas se cruzam indo buscar suas crianças, na escola. Uma é o contraponto genérico da outra: Stephanie parece ser uma vlogueira prestativa e cheia de coração, enquanto Emily parece seu oposto, avisando-a desde o começo: ‘Você não quer ser minha amiga, querida’. Ambas “parecem ser” porque essa é exatamente a premissa de Um Pequeno Favor. Eis aqui a modelação do que as pessoas parecem ser, seus arquétipos tidos como verdadeiros até certo ponto, e a remodelação disso para expor as suas verdadeiras e surpreendentes identidades. Nisso, a amizade entre duas mulheres vai mudando de tom, e o filme também; muito sutil e inteligentemente.

    O que começa como mais uma comédia despretensiosa ganha novos traços que certamente o espectador desavisado nem sonha encontrar, pelo caminho. Feig tem com Um Pequeno Favor o seu melhor filme, leve como sempre, mas desta vez com uma trama baseada no romance de Darcey Bell a investigar, com o mesmo dinamismo de sempre (e toques de um suspense mais que suave) o que, de fato, um rosto angelical ou uma postura competitiva podem resguardar; aquilo que as máscaras do cotidiano escondem de bom e ruim – até certo ponto. É O Discreto Charme da Burguesia sendo descortinado de forma ultra simplificada e adocicada, não só pela boa presença de Kendrick, mas pela construção de um Cinema que não possui debates temáticos e reflexão como seus fundamentos principais, e sim o entretenimento, puro e simples, como principal força, e pulsação. Pela primeira vez, Paul Feig decide inserir algo a mais numa comédia romântica, e o resultado é deliciosamente satisfatório.

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  • Crítica | Águas Rasas

    Crítica | Águas Rasas

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    Com o perdão da injusta comparação, o diretor catalão Jaume Collet-Serra é como Clint Eastwood quando escolhe um filme para dirigir. Ele não entra pra perder ou fazer feio. Assim como o oscarizado diretor, Serra escolhe seus projetos a dedo e o resultado, ainda que não seja de prêmios em festivais ou de produções que acarretam caminhões de dinheiro, é sempre satisfatório por um simples motivo: o público adora seus filmes regados de suspense e o sucesso daquele determinado projeto se dá por meio do boca à boca entre as pessoas. Com certeza algum amigo já te indicou algum filme dirigido por Serra, seja A Casa de Cera, A Órfã, Desconhecido, Sem Escalas ou o estiloso Noite Sem Fim.

    Em tempos de pérolas como a franquia mítica e milionária Sharknado e de produções porcas como Mega Shark Vs Crocosaurus, o gênero que se leva a sério de filmes envolvendo tubarões ficou esquecido após o viral Mar Aberto, fazendo com que o clássico Tubarão, de Steven Spielberg, se mantivesse no topo e com uma larga vantagem em relação às demais produções.

    Blake Lively vive Nancy, uma estudante de medicina indecisa com relação ao seu futuro, mas que adora surfar. Ela, aparentemente, não se dá muito bem com o pai, principalmente após a morte de sua mãe e por isso resolveu viajar o mundo para celebrar sua memória. E é aí que ela resolve procurar uma praia secreta que nenhum nativo revela o nome, sendo que tudo que nós sabemos até então é que a protagonista viaja com uma amiga que não lhe acompanha por estar de ressaca, uma vez que podemos acompanhar junto de Nancy o que ela escreve ou lê quando está em contato com sua amiga ou sua irmã mais nova.

    Chegando à praia, Nancy faz amizade com dois nativos surfistas e o que vemos em seguida é uma série de belas imagens relacionadas à prática do surfe. Nesse ponto, é possível que o espectador se irrite porque a produção não apresenta até aquele momento nada conceitualmente novo, principalmente no que diz respeito aos surfistas e a sensação é de estar assistindo a algum documentário feito por algum canal de esportes radicais. Porém, tudo muda quando os surfistas decidem ir embora, deixando Nancy para uma “última onda”. Acontece que uma baleia morta atraiu um enorme tubarão branco para as águas rasas da praia.

    aguas-rasas-surf-tubaraoFica extremamente difícil escrever sobre o tema sem contar o que acontece, mas, de qualquer forma, o drama da jovem faz com que o espectador a acompanhe de perto, como se estivesse ao seu lado, sentindo, quase que literalmente, sua dor pelas próximas horas, sendo que tudo que Nancy tem para lhe auxiliar são seus objetos pessoais que lhe acompanhavam ao mar, como seu relógio, sua roupa de mergulho, seus brincos e um pingente, além de conhecimentos básicos sobre a movimentação das marés, o que adiciona ainda mais urgência à trama e sua resolução. Vale destacar que não é por acaso o fato dela ser praticamente uma médica, pois qualquer outro surfista sem conhecimentos da medicina chegaria a óbito logo na metade do filme. Uma solução suja, porém, necessária para manter a personagem por tempo suficiente em tela.

    Os méritos de Águas Rasas, curiosamente, não se dão pelas características já conhecidas do diretor que costuma contar histórias peculiares com uma boa dose de estilo, mas sim pelo fato dessa história ser a mais simples possível, onde uma mulher que passa por um trauma faz com que seu instinto fale mais alto do que a própria razão, ainda que quem esteja lá do outro lado seja alguém que está no topo da cadeia alimentar. Dessa forma, créditos também cabem à Blake Lively que mostrou ser uma atriz extremamente versátil nas diversas situações em que a vemos durante quase uma hora e meia de filme. E por que não falarmos da simpática gaivota que, assim como Nancy, passa por drama semelhante? A interação entra as duas é um destaque a parte.

    Com isso, podemos dizer com segurança que Águas Rasas entra para o “hall da fama” de filmes de gênero sobre tubarões.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | Café Society

    Crítica | Café Society

    Cafe Society - poster

    Desde o início dos tempos uma capacidade e uma verdade vieram para separar o ser humano dos demais animais. A capacidade é o uso do polegar opositor, usado para apanhar e agarrar, nos permitindo produzir e manipular ferramentas e assim construir mundos. A verdade é a inexorabilidade do tempo, que traz consigo a presença constante da morte e irreversibilidade dos fatos, e assim saber que todos os mundos construídos, reais ou platônicos, uma hora verão seu fim. Será doloroso, haverá angústia, haverá rebelião, mas o tempo atropelará a todos.

    O filme inicia-se com uma declaração de estranheza e amor com a Hollywood de antes e de hoje, com seus egos inflados, vidas boêmias e casamentos de fachada, a Califórnia parece vir sempre com um filtro laranja fazendo de suas paisagens um paraíso tão brilhante quanto estéril, e por isso geratriz de tantas ficções. Desta forma o jovem Bobby (Jesse Eisenberg) muda-se de Nova York para a ensolarada California atrás de dias menos monótonos trabalhando para o seu tio (Steve Carrel), onde se apaixona por Vonnie (Kirsten Stwart).

    E é assim o tempo, compositor dos destinos e tambor dos ritmos.

    É natural pensar que com o passar dos anos Woody Allen tenha tido tempo para repensar sua vida e ações, mas aqui surge o filme onde ele é mais colocado de escanteio, permitindo-se análises mais cruas. Se não é incomum que ele se reinterprete como protagonista de suas histórias, ou que outros atores façam o papel de Woody Allen, aqui ele se coloca como um estereótipo intelectual que faz pouco mais do que um coadjuvante. Um cunhado comunista versado em filosofia, último na hierarquia familiar dos EUA.

    Poucos morrem de amor. Talvez ninguém. Uma hora melhora, e se não melhora é porque há mais do que a rejeição para ter de lidar. Muitos se apoiam na carreira, na ambição, no adorno de ter ao seu lado alguém que satisfaça suas necessidades pessoais e sociais. A parceria amorosa gera todo um ecossistema de vida ao redor, amigos se misturam, amigos são agregados e em algum momento as pessoas optam por substituir a pessoa antiga por outra que lhe sirva a este papel. Este ecossistema nos nutre e dá algum arcabouço para uma vida mais plena e satisfatória. Tão importante quanto o romance é a sua bagagem, e na vista de um amargurado a bagagem é mais importante que a pessoa em si. Nisso estabelece-se protocolos de “gostar” que nunca serão alcançados por uma pessoa real, e não importando mais quão boa a vida, esta será sempre frustrante. A vida é uma comédia roteirizada por um sádico.

    Mas o amor ingênuo, aquele quase impossível surge eventualmente como nota amarga do champanhe de final de ano. Um amor que nunca seria mais do que acabou sendo não deveria pautar vidas inteiras, mudanças de endereço, mudanças de comportamento e nem mesmo saudade. Mas o faz, e faz por percebermos que simplesmente não há amor suficiente para todos.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

     

  • Crítica | A Incrível História de Adeline

    Crítica | A Incrível História de Adeline

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    Adeline (Blake Lively) é um fenômeno inexorável de origem puramente estatística, bem como todos o habitantes deste planeta. Cada nascimento específico tem uma probabilidade de cerca de 1 em 300 milhões, ou 0,0000003% de ocorrer, traduzindo-se em um fenômeno extremamente raro, e que a despeito desta raridade ocorre todos os dias. Adeline, uma mulher independente nascida no século XIX vive hoje como fruto de um fenômeno fabular apresentado pelo narrador que foi capaz de tornar cada uma de suas células indiferente à passagem do tempo. E assim, sem envelhecer, vê o tempo passar e destruir seus sonhos, mantendo existência, fazendo-a se reinventar a cada ponto de cisão de sua vida ou sempre que alguém percebe sua condição especial.

    O tempo físico se constitui de uma variável com sentido bem definido, representado no conceito de Seta do Tempo que diz que processos físicos seguem um sentido prioritário, não havendo a reversibilidade destes mesmos processos. Era, anteriormente à Teoria da Relatividade, um conceito absoluto. Hoje se sabe que é relativo, bem como o espaço trazendo consigo a ideia de que é de alguma forma possível agir sobre o tempo, lhe dando o status de fenômeno físico.

    Os ecos filosóficos de tais elaborações alcançam o imaginário popular, e este objeto de fascínio humano desde sempre vai se transformando como uma forma de protesto ao poderoso efeito do passar dos anos. Nietzsche com sua concepção do “Eterno Retorno” indica que estaríamos presos à uma série sucessiva de eventos fadados à repetição, que se repetiram no passado, ocorrem no presente e se repetem no futuro, tal como guerras ou acontecimentos históricos. Assim é A Incrível História de Adeline, uma repetição de muito do que se viu ou sabe-se sobre fábulas ou romances no cinema.

    Na era da ciência, o ser humano se tornou aquele que seria tratado como demônio, como anunciado por Nietzsche, que surgiria como portador da verdade sobre o tempo, ou que seria tratado como ser dividido caso esta verdade lhe tocasse. Não a toa a fábula de Adeline tem todo um verniz científico, atribuindo dados estatísticos, um contexto histórico tratado como fenômeno determinístico, e uns pequenos falsos fatos para a verossimilhança da trama. Não a toa, também, Adeline vê em conflito moral ao se apaixonar por um cientista sonhador às vésperas de sua próxima mudança de vida para fugir de seu futuro de questionamentos sobre o que ela é. Seu sofrimento consiste em aceitar ou não o demônio citado pelo filósofo, é a decisão entre escolher reviver sua vida ou reiniciar sua existência sem passado.

    Apesar do conceito interessante, o filme sofre de problemas narrativos sérios como, por exemplo, lançar mão da narração em off para toda e qualquer grande resolução. Tal conceito soa normalmente preguiçoso, e o espectador percebe que o recurso será recorrente e constante. Estatisticamente previsível para aquele que já viu algum outro romance, a película se recusa a fugir de estereótipos mesmo que queira dar a entender que sua visão é diferente e eventualmente mais moderna do que seus pares.

    Um bom divertimento, aquém do que poderia ser, não funciona tão bem como fábula e nem como romance, mas é bem mantido pelo bom elenco que conta com surpresas e faz daqueles acontecimentos óbvios algo, ao menos divertido de se ver, novamente.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.