Tag: Steve Carell

  • Crítica | Vice

    Crítica | Vice

    Vice é um drama de Adam McKay, que assina roteiro e direção  neste longa que segue mais ou menos na esteira de A Grande Jogada, embora seja menos jocoso que o anterior. Desta vez, a câmera acompanha a trajetória do ex-vice presidente dos Estados Unidos Dick Cheney, interpretado desde sua juventude por Christian Bale que para variar sofre com intervenções severas em sua maquiagem, figurino e compleição. A ideia ao retratar essa historia é mostrar como o pior do ser humano pode emergir mesmo do sujeito mais simplório possível, bastando apenas ter perseverança e força de vontade para alcançar o apogeu.

    A historia de Dick é  uma autentica zombaria do conceito de meritocracia. Do sujeito beberrão e pavio curto até o puxa  saco de pessoas que estão no poder, Cheney é sempre uma pessoa desprezível. A bronca que recebe de sua esposa Linny (Amy Adams) após se meter uma confusão é bastante agressiva, e serve de ponto de virada para uma mudança radical de postura, agindo ainda de maneira mesquinha, mas voltando esse lado maquiavélico para uma atitude que poderia lhe dar algum lucro.

    A grande questão é que Cheney conseguiu evoluir suas ambições. Passou de um frequentador de reuniões políticas, assunto do qual não dominava nenhum detalhe, para auxiliar de um figurão do Partido Republicano, Donald “Don” Rumsfold (Steve Carell). Ele começa de baixo, como um bajulador, mas consegue um trabalho na Casa Branca, sem glamour, mas ainda assim um cargo alto. A forma como a historia é contada, narrada pelo personagem de Jesse Plemons, o carismático Kurt é bastante engraçada, por passar ao largo da historia política dos Estados Unidos durantes as ultimas décadas, passando pelo período W. Bush e suas guerras, seguindo até o fim do mandato de Dick como vice-presidente e a sucessão de sua carreira política, apresentando toda essa movimentação de maneira tão divertida e criativa, que quase suaviza a quantidade de atrocidades feitas por quem detêm o poder naqueles tempos e instâncias.

    McKay consegue explorar de maneira estilizada e irônica o pior que a humanidade tem a oferecer. Ele já tinha começado esse movimento timidamente em O Âncora e sua continuação Tudo Por Um Furo, mas em A Grande Aposta que ele atingiu o ápice disso. Da mesma form como no anterior  ele debocha das tecno baboseiras econômicas para falar de lobbystas e chacais financeiros, dessa vez seu alvo é o pano de fundo da política republicana recente e ele enfia o dedo na ferida sendo bem mais explícito e menos técnico do que em outras épocas.

    Toda a construção de metalinguagem que é usada e abusada no longa depende muito do desempenho de Christian Bale, que mais uma vez consegue desempenhar um papel completamente em que precisa fugir de seu biótipo físico, onde basicamente sobressai seu talento dramatúrgico transformador. Kurt só faz sentido enquanto contador de historias graças a figura central da trama, e só se crê que um homem pode ser tão mesquinho, egoísta e insensível graças a forma como Bale age. A evolução do homem medíocre e indisciplinado e que só se educa para continuar vivendo e para dar luxos a si aos seus só não é odiável por conta da entrega de seu interprete.

    Por sua vez, o restante do elenco, mesmo sendo casting de apoio, precisava funcionar bem e esse é um dos principais méritos da obra. Ha uma unidade na família Cheney, seja com Adams que faz sua fiel escudeira, como suas filhas que são feitas por Alison Pill e Lily Rabe, que são personagens que mesmo com pouco tempo em tela são muito bem executadas inclusive nas diferenças entre si. Outro desempenho de excelência é Sam Rockwell, que faz um George W. Bush diferente do feito por Josh Brolin em W. de Oliver Stone mas que é igualmente genial, por se mostrar como o sujeito impulsivo e manipulável que ascendeu ao posto de comandante em chefe com mais sucesso até que seu pai. A forma como ele desempenha isso é sensacional e merece quase tantos aplausos quanto Bale mereceu.

    O filme possui um  ritmo crescente, mas se percebe que passam-se 132 minutos de tão harmônico que é seu roteiro e sua montagem. O final de O Vice se vale de simbolismos e mostra um homem que abdica totalmente dos seus sentimentos para continuar no poder – nem que para que haja essa perpetuação no poder fique somente o sobrenome que carrega – pois o maior torpor do homem é se sentir com autoridade, mesmo que as relações familiares entrem em falência no processo.

    Facebook – Página e Grupo | Twitter Instagram | Spotify.

  • Crítica | Café Society

    Crítica | Café Society

    Cafe Society - poster

    Desde o início dos tempos uma capacidade e uma verdade vieram para separar o ser humano dos demais animais. A capacidade é o uso do polegar opositor, usado para apanhar e agarrar, nos permitindo produzir e manipular ferramentas e assim construir mundos. A verdade é a inexorabilidade do tempo, que traz consigo a presença constante da morte e irreversibilidade dos fatos, e assim saber que todos os mundos construídos, reais ou platônicos, uma hora verão seu fim. Será doloroso, haverá angústia, haverá rebelião, mas o tempo atropelará a todos.

    O filme inicia-se com uma declaração de estranheza e amor com a Hollywood de antes e de hoje, com seus egos inflados, vidas boêmias e casamentos de fachada, a Califórnia parece vir sempre com um filtro laranja fazendo de suas paisagens um paraíso tão brilhante quanto estéril, e por isso geratriz de tantas ficções. Desta forma o jovem Bobby (Jesse Eisenberg) muda-se de Nova York para a ensolarada California atrás de dias menos monótonos trabalhando para o seu tio (Steve Carrel), onde se apaixona por Vonnie (Kirsten Stwart).

    E é assim o tempo, compositor dos destinos e tambor dos ritmos.

    É natural pensar que com o passar dos anos Woody Allen tenha tido tempo para repensar sua vida e ações, mas aqui surge o filme onde ele é mais colocado de escanteio, permitindo-se análises mais cruas. Se não é incomum que ele se reinterprete como protagonista de suas histórias, ou que outros atores façam o papel de Woody Allen, aqui ele se coloca como um estereótipo intelectual que faz pouco mais do que um coadjuvante. Um cunhado comunista versado em filosofia, último na hierarquia familiar dos EUA.

    Poucos morrem de amor. Talvez ninguém. Uma hora melhora, e se não melhora é porque há mais do que a rejeição para ter de lidar. Muitos se apoiam na carreira, na ambição, no adorno de ter ao seu lado alguém que satisfaça suas necessidades pessoais e sociais. A parceria amorosa gera todo um ecossistema de vida ao redor, amigos se misturam, amigos são agregados e em algum momento as pessoas optam por substituir a pessoa antiga por outra que lhe sirva a este papel. Este ecossistema nos nutre e dá algum arcabouço para uma vida mais plena e satisfatória. Tão importante quanto o romance é a sua bagagem, e na vista de um amargurado a bagagem é mais importante que a pessoa em si. Nisso estabelece-se protocolos de “gostar” que nunca serão alcançados por uma pessoa real, e não importando mais quão boa a vida, esta será sempre frustrante. A vida é uma comédia roteirizada por um sádico.

    Mas o amor ingênuo, aquele quase impossível surge eventualmente como nota amarga do champanhe de final de ano. Um amor que nunca seria mais do que acabou sendo não deveria pautar vidas inteiras, mudanças de endereço, mudanças de comportamento e nem mesmo saudade. Mas o faz, e faz por percebermos que simplesmente não há amor suficiente para todos.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

     

  • Crítica | Minions

    Crítica | Minions

    mns_scarlet1sht_rgb_0126_1_0

    Meu Malvado Favorito foi uma grande surpresa de público, e provavelmente nem os mais otimistas acionistas da Illumination Entertaiment — produtora que, além da franquia composta pelos Minions e o malvado Gru (Steve Carrel), possui apenas filmes de público médio-baixo em seu currículo — imaginariam. Fora o sucesso de público, que alcançou seu ápice com Meu Malvado Favorito 2 e seus retumbantes US$ 970 milhões alcançados mundialmente, e com a memeficação dos Minions, realizar uma prequel que explica como Gru encontrou seus capangas favoritos era questão de tempo.

    Apesar das animações de gosto duvidoso, o uso dos bichinho sem vocabulário é um acerto comercial de alto valor por parte do estúdio, pois trata-se de uma eficiente forma de comunicar-se com seu principal público: crianças pequenas. É obviamente um produto muito diferente de sua concorrente atual Divertida Mente, filme da Pixar com ambições muito mais elegantes e ousadas, e por isso mais restrita em público. Se a animação da Pixar foi capaz de fazer crianças chorarem com o desaparecimento de um querido personagem, Minions sequer arranha emoções muito profundas, ou mesmo uma profunda alegria.

    A aventura sobre a busca de um vilão mestre ao qual possam servir culmina no embate dos pequenos contra a vilã Scarlet (Sandra Bullock na versão original, e Adriana Esteves na dublagem nacional) e seu marido Herbert (John Hamm na original, e Vladimir Brichta na versão nacional), e busca desde o início incendiar-se feito rastilho, usando o característico déficit de atenção dos Minions para garantir que a cada período específico de tempo o cenário mude para um próximo e com ação ainda mais estridente. Esta estratégia é comum em animações que tentam seguir o ritmo de desatenção das crianças e falar a linguagem de seus espectadores, hoje acostumados com emojis e memes, seguindo para uma comunicação mais próxima do grunhido.

    Longe de lembrar a qualidade do humor físico de Looney Tunes e seus pares, a característica periódica dos acontecimentos pode afetar a a simpatia dos mais atentos, já que garante a certeza e previsibilidade de quase tudo o que se passa em tela, enquanto as piadas de duplo sentido, que têm os adultos como alvo, soam apenas enfadonhas e deslocadas.

    Assim, o ritmo não é frenético como se espera, e em comparação com a excelente trilha sonora — que passa por The Police e se concentra em The Beatles para ornar com o cenário —, falta harmonia entre as diversas notas que o filme gostaria de alcançar.

    Texto de autoria de Marcos Paulo Oliveira.

  • Crítica | O Verão da Minha Vida

    Crítica | O Verão da Minha Vida

    o verão da minha vida

    Curiosidade: os produtores e o elenco são de filmes consagrados pela maioria do público, crítica e premiações. Indagação automática: por que esse filme não fez sucesso na temporada de prêmios entre 2013 e este ano? Resposta: O Verão da Minha Vida é uma aula de como desperdiçar um ótimo elenco com um rascunho que ousaram chamar de Cinema. Um mundo de aparências, afinal.

    O filme começa e termina feito uma cópia menos inspirada e mais broxante da modesta obra americana recente de Alexander PayneOs Descendentes, com ideias, cortejos e arranjos individuais bem semelhantes à película, mas que não consegue achar o adendo louvável que diretores, com o talento genuíno de Payne, trazem através de sua pegada no material, tratamento e calor aos produtos – os quais, mesmo que adaptados de livros, caso dos dois filmes, chegam nas mãos dos cineastas ainda em estado bruto, carentes de lapidação e fomento artístico. Os escritores de Descendentes, sob influência de fórmulas que também deram certo, como Pequena Miss Sunshine e Juno, conseguem a proeza de rodar um filme de contexto semi-inexistente e mostram que têm fogo de palha nas veias e não seguram por um segundo sequer o interesse e a evolução gradual do filme, jamais linear do começo ao fim; tão imaturo quanto os irritantes personagens adultos, que agem como adolescentes de quatorze anos, e os adolescentes, espécies de virgens melancólicos mimados que tentam amadurecer no fluxo de esquetes frias e gratuitas que forjam a vergonha de conter semelhante projeto no currículo de qualquer um.

    É justamente esta a razão de ser do filme: mostrar, sem densidades além da superfície, os contrastes de gerações. Uma quer ser igual à outra, com a primeira com mais vontade que a segunda, e por isso, corre para se modernizar, evitando ser esquecida pela modernidade, enquanto ela mesma esquece seu lugar de direito na vida dos filhos. Contudo, é de se louvar, em meio a uma incômoda disfuncionalidade crônica da história, as veredas que a trama ganha na narrativa regimental, mesclando as personagens idiotas com uma agradável leveza que aflora das doces intenções, na visível tentativa de tornar tudo menos unilateral do que é, nesta irreversível “quase-tragédia” anunciada após as primeiras sequências, cheias de risadas e piadas fúteis sobre uma sociedade fútil com problemas e dilemas fúteis – ainda que universais – no jogo imagético da eterna reprodução.

    Feel Good Movies são malditos: podem ser muito bons ou muito ruins, tiros no escuro. E esta não é a única maldição por aqui. Steve Carell tenta a todo custo nos fazer esquecer de seu marcante protagonista na série The Office, mas, à parte de seus esforços, sua veia cômica aflora nos momentos dramáticos – ou que tentam ser e nunca são, na verdade – na cadência fraca e apática de um filme inexpressivo em demasia, portanto exagerado em um sentido contrário e pouco usual no mural dos exageros, causados geralmente por abundâncias. A rasa crosta de existencialismo não aponta a aspectos surreais ou de propriedade na produção, todavia, quem disse que O Verão da Minha Vida desiste de nos fazer acreditar que tal vida e as condições nas quais a tocamos pra frente não são duas coisas completamente diferentes? Perdão aos envolvidos, mas… Errado! Como já sugere a imagem acima, nós estamos ligados uns aos outros pela esperança de ficarmos completos, nalgum dia de sol, talvez.

  • Crítica | Tudo Por Um Furo

    Crítica | Tudo Por Um Furo

    Anchorman-2

    Adam McKay é responsável por dirigir alguns dos filmes mais hilários da carreira de Will Ferrell, como Ricky Bob: A Toda Velocidade, Quase Irmãos, Os Outros Caras e, claro, Âncora – A Lenda de Ron Burgundy. A esperada continuação do filme mais notável da parceria entre McKay e Ferrell começa tão estúpida e boba quanto o primeiro episódio, com toda a gritaria típica dos filmes do ator e a estupidez de Ron, mostrando a perfeita caricatura do jornalista televisivo moderno.

    A trajetória de Burgundy é interrompida com poucos minutos de exibição. Seu status quo é quebrado e a lenda é contestada, sendo logo mandado embora. A sequência de eventos que ocorre após a fatídica notícia é absolutamente hilária, sendo praticamente impossível para o espectador não rir. O renascer deste como jornalista após a humilhante constatação de sua incompetência é reunir a sua trupe novamente – nada mais clichê e certamente não poderia ser menos engraçado do que foi, pois cada um dos seus coadjuvantes está em uma situação das mais curiosas e absurdas: Champ Kind (David Koechner) tornou-se dono um restaurante fast-food que serve asinha de morcego empanada; Brian Fantana (Paul Rudd) faz ensaios fotográficos com pequenos gatos e se excita deveras com isto; enquanto Brick Stamland (Steve Carrell) acredita estar morto e é tão burro que vai ao próprio enterro. Toda a ironia da antiga rotina deles, ao invés de se repetir, é substituída por cenas ainda mais “babacas” que as anteriores.

    Tudo dentro do roteiro faz parecer um teatro dos absurdos. O machismo e racismo de Burgundy parecem não ter diminuído nada com o passar dos anos. Associados à intelectualidade média de norte-americano, esses preconceitos fazem da comédia algo sem muito compromisso com o politicamente correto, o que é muito raro, principalmente com o fato de não ser associada somente a jocosidades sexuais por necessidade. Todos os grupos secularmente excluídos recebem sua dose de gracejos: negros, gays, mentalmente prejudicados, latinos e mulheres.

    Seu retorno obviamente não é fácil, e ele tem de enfrentar novas rivalidades dentro da emissora, que só circula notícias, e na casa de sua esposa e atual ex, Veronica Corningstone, a ainda bela Christina Applegate. O método antiquado como Ron vê o mundo cobra o seu preço. Há necessidade de se reinventar como profissional da informação e como figura masculina, e sua saída é usar um discurso ufanista e sensacionalista voltado para o público que está dentro do maior denominador comum. Sua seleção de matérias visa reforçar a ideia de que a América é o melhor lugar do mundo para se viver, ignorando tudo o que aconteça à volta do mundo e que seja relevante. A falta de noção impera no modo de operar do laureado e premiado jornalista, e a ausência de limites faz com que todos não achem estranho ensinar o público a enrolar e fumar cachimbos de crack na televisão ao vivo. Tudo é tão absolutamente louco que, por mais nonsense que seja o cenário, o circo midiático maluco torna-se lógico e faz total sentido dentro daquele universo tão estapafúrdio.

    Uma boa novidade é o romance em que se metem Brick Tamland e Chani Lastname (Kristen Wiig), uma personagem desequilibrada mentalmente com direito a alguns distúrbios e transtorno obsessivo-compulsivo, inclusive com o mesmo background de origem militar para tais demências. Quando este tem de ir ao seu encontro, é apresentada a ela uma miscelânea enorme de variações de preservativos, inclusive os que não funcionam na prevenção de gravidez. A primeira interação do responsável pela previsão do tempo na tela verde é tão incrivelmente idiota que se torna uma das cenas que mais causaram gargalhadas nos últimos tempos.

    A falta de tato social de Ron continua intacta, se não aumentada. O affair que tem com Meagan Good  (Linda Jackson) o faz exagerar ainda mais com os estereótipos raciais. Até na mesa da família da moça utiliza-se de todo tipo de insinuação sexual, especialmente das mais sujas, com o que ele acha ser natural, unicamente pelo fato dos presentes serem negros, o que, em sua cabeça, os faz mais liberais nos assuntos relacionados ao coito poli e monogâmico. Um drama dos mais trágicos acontece com ele, e Burgundy se enfia numa luta contra o vício em crack que o faz agir como um pai ausente e irresponsável seletor de notícias. Quando cobre uma aleatória perseguição de carros, consegue uma entrevista de Veronica com Yaser Arafat, que vem a falar de sua tentativa de pacifismo com Israel. Seus índices de audiência atingem picos estratosféricos, mas sua fama é interrompida por um acidente que tira a sua visão, e consequentemente a capacidade de comunicar notícias via teleprompter.

    Depois da volta por cima e reinvenção enquanto cego, Ron Burgundy tem à sua frente um dilema moral: continuar a carreira cobrindo fatos sem importância ou ir ver o seu filho homenageá-lo em um recital. Sua escolha é a moralmente correta e ele se alinha com as coisas que o fazem bem, reatando as suas amizades e retornando ao seu verdadeiro amor, como na maioria dos último bons filmes de Ferrell. Ficaria um gosto de decepção se não fosse pela ótima cena repaginada da batalha entre jornalistas que reúnem ainda mais cenas de notícias, com participações especiais das mais diversas, entre humoristas e atores consagrados. Uma épica batalha contendo muita violência e referências das menos cabíveis possíveis, num dos exercícios de Deus Ex Machina com justificativa das melhores possíveis e um argumento providencial muito bem encaixado.

    O humor de Tudo por um Furo é universal, mas o roteiro faz ainda mais sentido para quem é comunicólogo. Todas as sandices mostradas em tela fazem da obra algo difícil de se levar a sério, obviamente não fazendo uso de humor inteligente ou cerebral. Por isto mesmo é uma obra única, por ser pensada e feita como uma troça de uma indústria que se leva demasiado a sério pela responsabilidade de informar. O filme é corretissimamente pensado e acerta muito dentro de sua proposta. Analisar algo fora desse escopo é total perda de tempo.

  • Crítica | O Incrível Mágico Burt Wonderstone

    Crítica | O Incrível Mágico Burt Wonderstone

    The-Incredible-Burt-Wonderstone_poster1PPP

    Steve Carell ganhou notoriedade com seu papel de Michael Scott na versão americana de The Office, onde o principal mérito do ator era o fato de não emular a versão original – e muito mais constrangedora – encarnada por Ricky Gervais. No entanto, o que deveria ser apenas um papel tornou-se uma máscara, um modo de atuar, que fracassa algumas vezes e acerta em outros, e este é o caso de O Incrível Mágico Burt Wonderstone, onde o estereótipo funciona.

    Apesar de já ter flertado com filmes onde se exige uma maior capacidade dramática, dando mostras de que não é um ator incompetente, é no filão de comédias de conteúdo estúpido com uma mensagem fofa por trás que Carell se sente mais a vontade e agrada mais o público. Burt Wonderstone, seu personagem, é mais um desajustado, excêntrico, egocêntrico, sexista, além de ser um artista ultrapassado, que teme a novidade e tem óbvias dificuldades em mudar.

    A história mostra desde a sua infância, onde se inspira em Rance Hanson (Alan Arkin), um famoso mágico, para seguir seu caminho. Com o tempo, forma uma bela dupla com seu amigo de infância Anton Lovecraft, Steve Buscemi, com quem faz inúmeros shows em Las Vegas. Sua popularidade é consideravelmente alta, o que o deixa confortável até o surgimento de uma nova “espécie” de mágicos/ilusionistas, muito mais visceral e extrema do que ele, encarnado por Steve Haines.

    A nova forma da mágica não tem limites ou normas de segurança muito bem estabelecidas, pondo em perigo o profissional o tempo todo, e isso deixa o público maravilhado, mais por deixá-lo impressionado, confundindo o receptor, do que por sua qualidade em si. A escolha de Jim Carrey para o papel é curiosa e até emblemática por este ser um humorista de uma geração mais tradicional do que a do protagonista, mas fazendo um humor escatológico, que flerta com artistas novos, a exemplo, Jackass. Haines é um agente do caos, com um ar nonsense e bizarro, além dos limites do suportável, que evidencia que os tempos são outros.

    Em contrapartida, após cair em decadência e perder tudo o que tinha, Wonderstone se volta para um público antes desprezível, em um asilo de idosos, e para sua surpresa reencontra a paixão por seu ofício, através do seu mentor Rance Hanson, que com toda sua rabugice e insensibilidade restaura o seu amor pela mágica, fazendo-o lembrar que esta é a responsável pelo rompimento com a realidade dura e cruel.

    A prática do ilusionismo representa algo antiquado, que já foi adorado – em especial por crianças – mas está fora de moda, mais uma vez reforçando a mudança como dificuldade de vida, e rompimento com a rotina como um desafio quase insuperável. Don Scardino, acostumado a dirigir episódios de sitcom, consegue levar o tom de humor e equilibrar o elenco de estrelas de uma forma competente, e apesar da mensagem final ser um pouco piegas, não há  grandes motivos para reprimendas em sua direção.

  • Crítica | O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy

    Crítica | O Âncora: A Lenda de Ron Burgundy

    o ancora

    Mesmo depois da tragédia de Os Candidatos, resolvi ver outro filme do Will Ferrell. Dessa vez, O Âncora, que não poucas pessoas disseram que era bom. Realmente, é melhor que Os Candidatos, mas se só isso não diz muito, O Âncora falha em ter exatamente muitos dos elementos de que não gostei no anterior.

    A ideia é excelente. Ferrell interpreta Ron Burgundy, um jornalista local de San Diego, famoso na cidade, juntamente com sua equipe, por comandar o jornal de liderança no horário, durante a machista década de 70, quando o movimento feminista começava a sair das universidades e dos protestos nas ruas para engrossar a luta diária das mulheres no dia a dia por melhores condições, igualdade e, principalmente, respeito e reconhecimento no ambiente de trabalho e na sociedade. Nesse aspecto o filme é primoroso, pois, se as mulheres reclamam de como são tratadas hoje, nessa época era absurdamente pior, e soa ridículo vermos hoje como os personagens da época as tratavam – mas não soa de modo algum irreal, o que transforma algumas situações engraçadas, mas aquele engraçado que incomoda, no bom sentido.

    Também há a boa ridicularização do papel da mídia na sociedade, que sempre se desvia de histórias relevantes, mas que poderia desestabilizar o status quo para cobrir eventos com gatos fantasiados e partos de animais em zoológicos que são tratados como a maior notícia do mundo, sem a menor cerimônia. Além, é claro, de tirar um sarro do ego enorme de jornalistas da TV que se acham o centro do universo por terem 30 minutos diários de aparição.

    No entanto, o outro lado, o do riso forçado, das esquetes fora de contexto e dos exageros, não me pegam. Ainda não entendo porque Steve Carrell é tratado a toda hora como gênio do humor, já que parece interpretar o mesmo personagem, do mesmo jeito, em todo filme, com as mesmas caras, bocas, frases e trejeitos. Sua única exceção parece ter sido no excelente Pequena Miss Sunshine, quando justamente saiu do seu estereótipo.

    Do final não daria para esperarmos muito, nem sei se o filme deveria tentar algo além do desfecho onde inimigos fazem as pazes e resolve os conflitos nesse tipo de filme justamente pela proposta de satirizar o  gênero, mas seria interessante ver uma elaboração mais inteligente do que essa.

    Como resumo da obra, O Âncora é um filme redondo, que funciona para a plateia certa, mas cansa o espectador que exija algo a mais. Possui bons momentos, e deixa a profundidade que poderia alcançar ser atrapalhada pelo humor raso que tenta forçar a todo instante.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.