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  • Crítica | Edward Mãos De Tesoura

    Crítica | Edward Mãos De Tesoura

    Uma das obsessões de Tim Burton são os contos de fadas. Ele já havia participado de Teatro de Contas de Fada, com um episódio sobre o conto de Aladdin e a Lâmpada Maravilhosa, mas ainda carecia de algo original em formato longa-metragem, e um pouco depois do sucesso que foi o seu Batman, ele viria com o lúdico Edward Mãos de Tesoura, um filme que se vale da nostalgia e de uma América que apesar de um pouco idealizada, reúne muita realidade em torno de sua história escapista.

    Os primeiros momentos se assiste uma avó já bastante idosa colocando sua neta para dormir, e para que ela possa finalmente descansar, a senhora conta uma história passada, em um subúrbio sem nome – as gravações foram em um bairro pacato, de Tampa, Flórida – cujas casas e lugares tem cores gritantes ou pastéis. Nesse lugar, a vendedora e mãe de família Peg Bogg (Dianne Wiest) bate de casa em casa, inconvenientemente tentando vender seus produtos, até que depois de ser ignorada por todos os vizinhos, ela encontra um castelo, cujo jardim é todo decorado com belos arbustos personalizados.

    A casa aparentemente abandonada é na verdade lar de um sujeito diferente, que vive nas profundezas da escuridão, vestido de couro, de cor pálida e com pequenas cicatrizes no rosto. Esse é Edward, vivido pelo ator em ascensão Johnny Depp, antes de toda badalação que o faria ser um intérprete mecânico de seus arquétipos. Peg decide retirar o rapaz de sua solidão e levá-lo para morar com sua família, ignorando até mesmo o seu potencial destrutivo, uma vez que Edward tem lâminas de tesouras no lugar das mãos.

    A adaptação de Edward ao mundo comum é curiosa, já que ele jamais havia tido qualquer contato com outras pessoas que não o seu criador. O filme se mostra gradual em demonstrar a ambientação do personagem neste novo mundo, e nesses primeiros momentos os eventos mais engraçados são a chegada de todas as donas de casa que querem saber quem é o novo visitante na casa dos Bogg, o fato do rapaz dormir em um  colchão de água que é um objeto bastante frágil tendo em vista suas mãos, e a primeira cena do jantar em família, onde os demais não entendem muito bem quem ou o que ele é.

    Burton filma os carros saindo das casas pelo alto, quase todos em fila, referenciando um método e rotina compartilhado por absolutamente todos. Os moradores daquele vilarejo são exatamente iguais, e não fogem nunca do usual. Edward é diferente, o único capaz de aprender coisas novas, e ele não demora a se soltar, mostrando a Bill (Alan Arkin), pai da família o que ele é capaz de fazer com uma simples planta a ser podada.

    Burton sempre foi conhecido por ser um diretor que ignorava o trabalho dos roteiristas e esse certamente é exceção à regra. O argumento é assinado por si e Caroline Thompson (com roteiro de Thompson), e a forma como é mostrada a origem do protagonista, sem apelos grandiosos, com flashbacks econômicos, que mostram um cientista já idoso – Vincent Price, ídolo de Burton – chamado apenas de O Inventor, que tem o sonho de dar sentimentos as máquinas que o ajudam na fabricação dos biscoitos e demais doces de natal. A sua sina é parecida em essência com a de outros cientistas, com a diferença clara de que não há ganância nele ou uma vontade incontrolável por poder, ao contrário, ele é um sujeito altruísta, e passa essa condição a Edward.

    Por incrível que pareça, a pessoa que menos explora Edward é justamente a pessoa que o rejeitou de início, a bela e jovem Kim (Winona Ryder), ao se assustar com o sujeito ocupando seu quarto. A família se aproveita de suas habilidades com tesouras para decorar os jardins da vizinhança, tosar os cachorros das madames e até replicar a excentricidade dessas donas de casa também em seus cabelos. Esse quadro muda quando a menina cede a pressão de seu namorado, para que convença Edward para ajudá-lo a assaltar um lugar, se tornando então um pária para toda a comunidade.

    A proximidade com o natal vem junto com um evento curioso, que é o de revelar a total hipocrisia do povo suburbano, que passa a culpar o elemento externo por tudo de ruim que houve naquela vizinhança. Essa dicotomia torna-se um evento inteligente do texto, já que o pregado em cantatas e teatros natalinos é a solidariedade e união suprema entre os povos, e não o preconceito que se vê aqui. Os corais que entoam os temas de Danny Elfman ajudam a restabelecer a magia do conto, mesmo após a enxurrada de hipocrisia e demonstração da podridão da alma humana, presente no discurso preconceituoso e ressentido dos vizinhos. A cena em que o personagem principal faz uma escultura no gelo é fechada com um acidente em que ele corta Kim, logo no momento em que os dois finalmente começam uma conexão sentimental. Ferido emocionalmente, ele age de maneira instintiva e foge, causando pequenos transtornos pelo caminho, assim como no romance de Mary Shelley, sobre o monstro de Frankenstein.

    Edward Mãos de Tesoura possui uma singeleza e sensibilidade ímpar em sua historia, realizando uma fantasia com tons modernos que mesmo atualmente segue poderosa em essência.

    https://www.youtube.com/watch?v=__dB7t0853U

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  • Crítica | Despedida em Grande Estilo

    Crítica | Despedida em Grande Estilo

    Willie (Morgan Freeman), Joe (Michael Caine) e Albert (Alan Arkin) são amigos há décadas. Levam uma vida sossegada de aposentados, o que inclui partidas de bocha. Até que inexplicavelmente param de receber sua aposentadoria. Numa ida ao banco para discutir a hipoteca de sua casa, Joe testemunha um assalto bem sucedido. E, querendo dar um fim a seus problemas financeiros, começa a pensar que cometer seu próprio assalto é uma boa saída. E chama Willie e Albert para a empreitada.

    Remake do filme homônimo, de Martin Brest e estrelado por George Burns, Art Carney e Lee Strasberg em 1979, o filme – dirigido por Zach Braff com roteiro de Theodore Melfi – lembra algumas outras obras recentes que seguem a mesma linha: amigos de longa data, chegando ou já na terceira idade, que se reúnem para “viver altas aventuras” – por exemplo, Última Viagem a Vegas (de que Freeman também participa), Amigos Inseparáveis e Motoqueiros Selvagens.

    Apesar de a motivação dos três amigos ser algo bastante sério, não há como não rir ao pensar nesses três senhores executando um assalto a banco. A essência do humor é justamente essa inversão de expectativa em eventos que contrariam a lógica. Parece simples. Contudo não é fácil conduzir um filme todo assim. Obviamente, o roteiro é uma sucessão de pequenas e (quase sempre) bem boladas gags. Mas amarradas num ritmo que não cansa o espectador e consegue manter a trama coesa. Infelizmente, no terceiro terço do filme, esse ritmo se perde um pouco e a narrativa fica um tanto arrastada. Ainda mais ao se contrapor à segunda parte, em que o longo se torna um “filme de assalto”, com o planejamento e a preparação para o roubo. Não chega a comprometer, mas deixa a impressão de que o humor se esgotou a essa altura.

    A premissa é simples. A história, bastante previsível. E há algumas coincidências um tanto forçadas para garantir o desenrolar da trama. Mas fica claro que é essa a proposta do filme. Não há planos rebuscados, nem enquadramentos mirabolantes. A meta não é ser original e revolucionário, mas sim entregar algo fluido e agradável de assistir. E, logicamente, o elenco é garantia de que isso ocorra. “The three caballeros”, além do talento inquestionável, têm uma sinergia que transcende a tela, ao se comportarem como um casal antigo – discutindo por qualquer coisa, mas completando as frases (ou ideias) uns dos outros. Sem contar a ótima participação de Christopher Lloyd como Milton, responsável pelas piadas mais pastelão da história. A exemplo de Os Mercenários, é visível o quanto estão se divertindo fazendo o filme. E isso, sem dúvida, conquista o espectador.

    No melhor estilo “sessão da tarde”, é um filme que funciona bem. Com mais altos que baixos, cumpre seu objetivo que é entreter descompromissadamente, mesmo levantando alguns questionamentos bastante atuais e relevantes. Não é o filme do ano, nem sequer a comédia do ano. Mas certamente não é esquecível como muitas outras.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | Ajuste de Contas

    Crítica | Ajuste de Contas

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    Aos 67 anos de idade, Sylvester Stallone ainda está no auge, esculpindo o mesmo material de sempre. A crítica insiste em afirmar o óbvio sobre sua limitação como intérprete e sobre seu esforço natural em agarrar-se a uma década em que seu sucesso – bem como o de seus colegas brucutus – era astronômico.

    Sly sofre do preconceito do ator em um único estilo de papel. Síndrome que não afeta somente astros de ação, mas atinge-os com maior fatalismo. A decadência da perfeição física pode destruir a personificação viril e violenta dos personagens ostentados por sua carreira. Não deixa de ser verdadeiro que o ator manteve-se em sua zona de conforto, mas poucos são os atores que se arriscam em estilos diversos e são bem sucedidos no processo.

    A nostalgia que cerca Ajuste de Contas, além da força de Sly, vem do fato de que dois grandes personagens boxeadores se evocam memorialmente em cena: Rocky Balboa, defendido em seis filmes pelo boquinha torta, e Jake LaMotta, uma das interpretações máximas de Robert de Niro em talento, aumento de peso e maquiagem protética.

    A união destes atores traz a mística em torno da produção que faz do boxe enredo central. Sly e De Niro são pugilistas em fim de carreira que aceitam o desafio de uma revanche. A trama alinha-se com o conceito de personagens antigas que retornam para mais um assalto. Porém, em vez de trazerem à tona as personagens citadas, situam-se pela memória afetiva do público que deseja ver os atores de novo no ringue.

    Juntos formam a dupla que ri de si mesma em uma história focada no humor. Riem da velhice, do anacronismo de atores que viveram outra época, no auge, em que a popularidade pesava mais que efeitos especiais. A predileção pela comédia é um foco necessário para que o filme não seja mais um que faz da luta uma redenção. A mudança de polo dramático pode não oferecer originalidade, mas evita que o memorialismo evoque a potência dos dramas de Balboa e LaMotta.

    Pela segunda vez no ano, De Niro entrega uma boa interpretação. Não que seu papel exija muito do ator. Porém, considerando sua guinada desde a década de 2000, com performances canhestras, as atuações em Trapaça e nesta produção lhe dão um fôlego breve.

    A aguardada luta dos rivais é bem realizada e não parece que os atores estão parcialmente em cena, substituídos por esportistas profissionais em diversos ângulos neste improvável crossover.

    A parte mais insossa da produção centra-se no papel de Kevin Hart. O personagem é responsável pela realização da luta mencionada, mas se transforma no típico falastrão, como um Chris Tucker genérico. No elenco de apoio, Alan Arkin faz o mesmo velho debochado de sempre e, ainda que, como Sly, esteja repetindo o mesmo personagem desde Pequena Miss Sunshine, seu papel funciona pelo desconcerto e pela verborragia de palavras de baixo-calão que ainda divertem.

    Rir de si mesmo e reverenciar o próprio passado evidenciam o anacronismo destes atores em relação ao modus operandi atual da indústria cinematográfica. De maneira leve, mesmo que sem completa coesão, realizam uma boa trama.

  • Crítica | O Incrível Mágico Burt Wonderstone

    Crítica | O Incrível Mágico Burt Wonderstone

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    Steve Carell ganhou notoriedade com seu papel de Michael Scott na versão americana de The Office, onde o principal mérito do ator era o fato de não emular a versão original – e muito mais constrangedora – encarnada por Ricky Gervais. No entanto, o que deveria ser apenas um papel tornou-se uma máscara, um modo de atuar, que fracassa algumas vezes e acerta em outros, e este é o caso de O Incrível Mágico Burt Wonderstone, onde o estereótipo funciona.

    Apesar de já ter flertado com filmes onde se exige uma maior capacidade dramática, dando mostras de que não é um ator incompetente, é no filão de comédias de conteúdo estúpido com uma mensagem fofa por trás que Carell se sente mais a vontade e agrada mais o público. Burt Wonderstone, seu personagem, é mais um desajustado, excêntrico, egocêntrico, sexista, além de ser um artista ultrapassado, que teme a novidade e tem óbvias dificuldades em mudar.

    A história mostra desde a sua infância, onde se inspira em Rance Hanson (Alan Arkin), um famoso mágico, para seguir seu caminho. Com o tempo, forma uma bela dupla com seu amigo de infância Anton Lovecraft, Steve Buscemi, com quem faz inúmeros shows em Las Vegas. Sua popularidade é consideravelmente alta, o que o deixa confortável até o surgimento de uma nova “espécie” de mágicos/ilusionistas, muito mais visceral e extrema do que ele, encarnado por Steve Haines.

    A nova forma da mágica não tem limites ou normas de segurança muito bem estabelecidas, pondo em perigo o profissional o tempo todo, e isso deixa o público maravilhado, mais por deixá-lo impressionado, confundindo o receptor, do que por sua qualidade em si. A escolha de Jim Carrey para o papel é curiosa e até emblemática por este ser um humorista de uma geração mais tradicional do que a do protagonista, mas fazendo um humor escatológico, que flerta com artistas novos, a exemplo, Jackass. Haines é um agente do caos, com um ar nonsense e bizarro, além dos limites do suportável, que evidencia que os tempos são outros.

    Em contrapartida, após cair em decadência e perder tudo o que tinha, Wonderstone se volta para um público antes desprezível, em um asilo de idosos, e para sua surpresa reencontra a paixão por seu ofício, através do seu mentor Rance Hanson, que com toda sua rabugice e insensibilidade restaura o seu amor pela mágica, fazendo-o lembrar que esta é a responsável pelo rompimento com a realidade dura e cruel.

    A prática do ilusionismo representa algo antiquado, que já foi adorado – em especial por crianças – mas está fora de moda, mais uma vez reforçando a mudança como dificuldade de vida, e rompimento com a rotina como um desafio quase insuperável. Don Scardino, acostumado a dirigir episódios de sitcom, consegue levar o tom de humor e equilibrar o elenco de estrelas de uma forma competente, e apesar da mensagem final ser um pouco piegas, não há  grandes motivos para reprimendas em sua direção.

  • Crítica | Amigos Inseparáveis

    Crítica | Amigos Inseparáveis

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    Não há duvida que existe uma carência de bons papéis para atores veteranos dentro de Hollywood, principalmente se este for voltado para protagonistas. Mesmo grandes nomes como Al Pacino, Alan Arkin Christopher Walken, não tem lugar para certos papéis, ficando fadados a filmes de gênero ou apenas como coadjuvantes. Amigos Inseparáveis (Stand Up Guys) tenta suprir essa falta, entregando uma comédia policial com atores mais velhos, mas o máximo que consegue é soar como uma homenagem muito aquém do que esses nomes deveriam receber.

    Na trama, acompanhamos a saída da prisão de Val (Pacino), que passou seus últimos 28 anos cumprindo pena pelo assassinato do único filho do seu antigo chefe, o mafioso Claphands (Mark Margolis). Doc (Walken) busca Val e ambos passam o dia se divertindo pela cidade, realizando as vontades que o amigo não pôde fazer nos últimos anos. Contudo, Doc tem uma missão ingrata para realizar até o amanhecer: matar Val à mando do mafioso, como uma vingança pela morte do seu filho. Ambos entendem a gravidade da situação e decidem aproveitar as poucas horas que tem para farrear. Com isso, os dois decidem resgatar o velho amigo Hirsh (Arkin) da casa de repouso onde está internado e relembrar os velhos tempos juntos.

    O roteiro se desenvolve em volta dessa última aventura do trio, durante uma noite agitada com direito à idas a bordéis, boates, pequenos assaltos, uma vingança contra os responsáveis pelo sequestro de uma mulher, entre outras coisas. A direção de Fisher Stevens parece não ter a mínima ideia do que fazer com o roteiro de Noah Haidle e com o material que tem em mãos.

    Se o roteiro e a direção não colaboram, o mesmo não pode ser dito do elenco. Verdade seja dita, senão fosse por ele o filme não teria nada digno de nota a ser lembrado. O entrosamento entre os três atores é impressionante, bem como a construção de personagens de cada um. Walken, mais contido que o habitual, anda com cautela e precaução, demonstrando a tensão que está sofrendo pela decisão que precisará tomar em breve. Já Pacino, sempre muito expressivo, abusa de movimentos, mas sempre curvado, já que apesar de querer aproveitar intensamente o pouco que lhe resta, deixando claro o que deixou para trás nos últimos 28 anos. Arkin é o último a se unir ao grupo, mas rouba a cena, tornando o filme mais interessante.

    Amigos Inseparáveis tem uma ótima premissa, mas se perde num roteiro pífio, repleto de piadas bobas, diálogos ruins e situações constrangedoras, que se agrava na direção mal empregada de Stevens, o que no final das contas só fica parecendo uma versão terceira idade de um Se Beber, Não Case!, onde os velhos parecem ser obrigados a se portarem como adolescentes para parecerem legais. Ainda assim, o filme possui um certo charme, principalmente pelo trio de atores que estão muito bem no longa, o que só demonstra como esses veteranos são mal empregados e ainda tem muito a oferecer.

  • Crítica | Argo

    Crítica | Argo

    Quando se ouve o nome de Ben Affleck, muitas torções de nariz e desconfiança são dadas. Affleck não construiu sua carreira de maneira tão promissora enquanto ator, porém vem se destacando na direção. Argo é a prova viva da maturidade de Affleck no ramo cinematográfico, evidenciando que merece mais respeito e reconhecimento do que lhe dão de fato.

    Baseado em fatos reais, Argo se passa no contexto do auge da tensão entre EUA e Irã, no final dos anos 70 e início dos 80. Àquele tempo, os EUA haviam dado asilo político ao Xá Reza Pahlevi enquanto fundamentalistas iranianos invadiram a embaixada americana em Teerã, requerendo a extradição do mesmo. Porém, seis funcionários da embaixada conseguiram fugir e se esconder dentro da casa do embaixador canadense. Tony Mendez (Ben Affleck), agente da CIA especialista em “exfiltração”, desenvolve um improvável plano criando um falso longa-metragem de ficção científica canadense intitulado “Argo” e usando-o como desculpa para adentrar o país e retirar os fugitivos a salvo.

    A primeira coisa a se dizer do filme é que a clássica exaltação do heroísmo norte-americano está, sim, presente. Porém, Affleck tem o cuidado de iniciar a história explicando o contexto da época e mostrando a motivação do povo iraniano em suas manifestações. O que se segue dali em diante é a criação meticulosa de uma tensão sincera e real – tendo em vista que vivenciada pelos fugitivos em 1980 -, porém aos olhos da plateia, que acaba participando emocionalmente daqueles fatos (mesmo aqueles que já sabem do final da história). Affleck desenvolve o filme com uma direção muito segura e extremamente satisfatória, demonstrando que sua carreira como diretor só tem a se desenvolver.

    Em alguns momentos, o filme se diverte com as auto-referências a Hollywood, mostrando personalidades e vícios dos bastidores da indústria cinematográfica. John Chambers (famoso maquiador que venceu o Oscar por Planeta dos Macacos, interpretado por John Goodman aqui) e Lester Siegel (Alan Arkin) representam esses momentos do filme, que funcionam como alívio cômico no desenrolar do longa. Apesar de não serem tão expressivos assim para o desenrolar da tensa trama, não depreciam a obra final – principalmente ao considerar que os dois atores esbanjam conforto em seus papéis e o fazem muito bem. A atuação de Affleck é relativamente inexpressiva, mas coerente no papel de um agente da CIA, cujo emprego é lidar com tensão e com a vida de outras pessoas enquanto se está correndo risco da própria.

    Soma-se às qualidades do filme a fotografia, adequada à época retratada, e a trilha sonora, discreta porém intensa. A qualidade técnica de Argo como um todo é muitíssimo bem trabalhada e todo esse rigor merece ser reconhecido.

    Apenas em 1997 o ex-presidente americano Bill Clinton permitiu a publicidade deste caso, cujos detalhes eram confidenciais até então. Hoje temos o privilégio de ver essa história sendo contada nos cinemas e, felizmente, por um diretor tão competente quanto Ben Affleck.

    Texto de autoria de Pedro Lobato.

    Ouça nosso podcast sobre Ben Affleck.