É fato que todos conhecem a estória do Superman, nem que seja apenas em linhas gerais. Bebê chega à Terra sozinho numa espaçonave oriunda de Krypton. Criado pelo casal Kent, Clark cresce tendo que aprender a lidar com suas habilidades sobre-humanas.
Apesar de ser mais um filme da franquia Superman, este não é uma continuação dos demais, mas sim, um filme de origem. E, sendo assim, é em torno do início da estória de Clark que gira a trama do filme. Claramente superior a Superman: O Retorno de Bryan Singer ( morno demais, demasiado entediante ) , este investe suas fichas num personagem mais realista, mais sombrio e, contrariando o senso comum, mais alienígena que todos os anteriores. E por conta disso, pode-se arriscar dizer que este não é um filme do Superman – de um homem com superpoderes – mas sim de um herói ou um deus em processo de construção.
O prólogo, interessante mas excessivamente longo no meu entender, nos mostra o conflito que causou a destruição de Krypton e que levou Jor-El (Russell Crowe), um cientista do alto-escalão, a enviar seu filho recém-nascido, Kal-El – que virá a ser Clark Kent (Henry Cavill) – numa espaçonave à Terra. Não conheço os quadrinhos – aliás, o personagem em si não me agrada muito – e, portanto não faço a menor ideia de como “deveria” ser retratado o planeta. Mas a direção de arte acertou ao optar por um aspecto biomecânico, lembrando um pouco os desenhos de H.R.Giger utilizados em Alien.
E, desde o início, já começam a aparecer os típicos buracos de roteiro, quase inevitáveis nesses filmes de super-heróis. Se, conforme é esclarecido tanto por Jor-El como pelo General Zod (Michael Shannon), todos os kriptonianos já nascem com papéis pré-definidos, o espectador um pouco mais observador certamente se pergunta como Jor-El, predestinado a ser um cientista, luta tão bem quanto (ou quase melhor que) Zod, um soldado nato. Isso e mais a cena “ironman style” em que Jor-El veste sua armadura, diminuem o impacto da sequência do confronto entre eles, enfraquecendo a imersão na trama. Mas ainda assim, esse primeiro terço do filme consegue prender o público o suficiente para querer assistir ao desenrolar da estória.
A opção de retratar a infância e adolescência de Clark através de flashbacks, ao invés de seguir uma narrativa linear, deu certa leveza e dinamismo à estória. Desse modo, o espectador vai, aos poucos, sendo apresentado ao personagem, conhecendo seu passado, seu convívio com os pais adotivos – Martha (Diane Lane) e Jonathan Kent (Kevin Costner), e o modo como descobriu e aprendeu a controlar seus poderes. Algumas sequências poderiam ser mais curtas, mas não chegam a comprometer o ritmo do filme.
Aproveitando a deixa, vale ressaltar que a tentativa de reafirmar o personagem como sendo o “homem que veio do céu para salvar a humanidade” é forçada e fora de contexto. O tom messiânico incomoda bastante em vários momentos. O discurso de Jor-El sobre o destino do filho, afirmando que seu papel é ser um “guia” para os humanos atingirem a paz e a felicidade eternas – algo como um nirvana – soa piegas e até meio ingênuo. Como se já não bastasse Clark falar, sem mais nem menos, que tem 33 anos, a cena em que ele aparece numa igreja conversando com um padre, que surgiu do nada na estória, é patética, além de totalmente desconectada da estória.
O filme não é feito só de cenas intimistas e familiares, logicamente. O que todo fã espera são as sequências de ação, que são inegavelmente muito boas. O problema é que, devido à escala megalomaníaca (justificável), as cenas lembram demais Os Vingadores – principalmente o momento de embate entre Superman e Zod em Metrópolis. E, assim como o prólogo, esta sequência acaba sendo cansativa pela duração extensa e pela falta de estratégia do vilão que afinal, é um militar. E não apenas isso, tem-se a impressão de que toda a ação, a luta, a destruição está concentrada demais nesse momento da estória, quase saturando o espectador.
Interessante reparar que, apesar de não haver semelhança física, em alguns momentos Cavill lembra um pouco “O Superman”, Christopher Reeve – convenhamos que não é muito difícil ser mais expressivo que Brandon Routh – e o ator consegue dar ao personagem tanto a insegurança de quem ainda não tem certeza de que rumo irá tomar, quanto o carisma do herói que vai “salvar o dia”. Não é atuação digna de prêmio, até pela quase bidimensionalidade do personagem, mas é convincente na medida certa. Kevin Costner e Diane Lane estão ok como os pais adotivos de Clark. Amy Adams consegue tirar de Lois Lane aquele ar de mocinha indefesa em perigo. Mas quem se destaca é Michael Shannon, construindo um vilão a seu modo incorruptível e ao mesmo tempo bastante ameaçador.
É natural que um reboot gere estranheza e divida opiniões, e também é natural que não agrade a gregos e troianos – isto é algo inerente aos filmes do gênero. É difícil encontrar o ponto de equilíbrio entre tornar a estória palatável aos “leigos” e agradar aos fãs de carteirinha. E, apesar de alguns defeitos, Man of Steel é um filme que cumpre sua função de entreter.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.