Sofia, aquela menina tímida que interpretou (terrivelmente) a Mary Corleone de O Poderoso Chefão III, carrega consigo um dos nomes mais pesados da Indústria Cinematográfica do século XX: Coppola.
Tendo isso em mente, pode-se imaginar que uma pressão enorme, tanto por parte dos profissionais desse meio quanto da expectativa dos fãs de seu pai, deve ter caído sobre ela quando foi anunciada em 1999 que dirigiria e escreveria seu primeiro longa-metragem: As Virgens Suicidas. Hoje em dia Sofia Coppola tem em seu currículo quatro longas, mas não deixa de ser válido mencionar o primeiro deles, já que para uma obra de estreia, um filme desse porte não pode nunca ser deixado em segundo plano.
Produzido por Francis Ford Coppola e baseado em um romance homônimo de Jeffrey Eugenides, As Virgens Suicidas mostra a fase final da vida de cinco irmãs do ponto de vista de um grupo de garotos que cultivam grande fascinação por elas. É importante mencionar a diferença de idade entre elas que é de apenas um ano, o que significa que o cenário consiste em uma casa onde vivem simultaneamente cinco garotas na adolescência. Mantidas pelos pais autoritários e religiosos em isolamento domiciliar, as irmãs Lisbon tornam-se ídolos inalcançáveis para os meninos que, sendo seus vizinhos e frequentando a mesma escola, analisam e especulam sobre cada aspecto da vida delas que são capazes de observar. Da perspectiva da narração (feita por Giovani Ribisi, ator que também está presente na obra posterior da diretora, Encontros e Desencontros), um desses garotos tenta, a partir dessa obsessão, entender os motivos que as levaram a cometer suicídio (quem disser que é spoiler, leia o título do filme) de uma maneira no mínimo bizarra.
Com uma direção inspirada e controversa, Sofia conta em um turbilhão de cores, gestos e expressões uma história poderosa e comovente. A fotografia do filme é delicada, feminina e incitante, exibindo em muitos momentos um brilho ofuscante e uma aura sonhadora. A trilha sonora é impecável, contando com a introspecção eletrônica da maravilhosa banda francesa “Air” e algumas faixas da banda de rock “Sloan”.
O pontapé inicial do enredo é a tentativa de suicídio da irmã mais nova Cecilia, logo de cara deixando claro que a melancolia dessa história não será manipulada pelos recursos clássicos de suspense e drama que normalmente vemos em filmes que focam a natureza feminina – os girl flicks. Em vez disso, a diretora carrega sutilmente ao longo do filme a tristeza de uma vida limitada por dogmas culturais no contexto da juventude dos subúrbios americanos. Geralmente ao assistir a filmes que relatam “dramas adolescentes”, o que se vê é uma verborragia um tanto novelesca, além de conflitos banais que acabam por serem resolvidos magicamente por fórmulas igualmente banais.
O diferencial dessa obra é que para entender o que se passa com as irmãs Lisbon, é preciso acima de tudo observar atentamente aos detalhes, que são o ponto forte desse filme. Um bom exemplo é a cena do cinema, em que o talento de Sofia consegue de uma belíssima maneira transmitir as emoções implícitas na situação proposta, e com apenas uma frase, culminar no grande clímax da história do carismático casal que lidera o elenco das personagens, Kirsten Dunst e Josh Hartnett. Alguns críticos atiraram tomates dizendo que as personagens são superficiais e mal construídas, quando na verdade, para um observador externo, é impossível definir os sentimentos e anseios que ditam o comportamento de pessoas reais e, consequentemente, o que se vê pode não fazer perfeito sentido dentro dos parâmetros de uma história linear simplesmente por não conhecer o contexto das vidas delas por completo.
Para enxergar a realidade da (des)motivação dessas garotas é preciso imaginar o que não se vê, através de gestos e detalhes, justamente como fazem os garotos que espionam as vizinhas com binóculos para satisfazer sua curiosidade. Compreender plenamente o que se passa com elas é uma tarefa impossível, afinal sabemos que muitos pais passam a vida toda sem ter a menor pista de quem seus filhos realmente são. No final o espectador ainda se encontra sem saber exatamente o que concluir, deparando-se com um desfecho ambíguo e aberto a diversas interpretações diferentes, o que faz jus ao peso dessa história e ao realismo das circunstâncias em que ela toma forma.
Com atuações sensíveis de Kathleen Turner e James Woods, As Virgens Suicidas é um filme que pode comover ambos os gêneros, especialmente para o cinéfilo que gosta de analisar as personagens sem que sua caracterização seja mastigada e entregue de bandeja pelo autor. Não é um filme fácil, mas não pelos motivos óbvios. É perfeitamente inteligível mesmo para o espectador mais leigo, porém exige um total envolvimento com a trama e as personagens para que se compreenda o que ele realmente tem de melhor. A princípio, na história pode parecer que existe uma falta de propósito, mas pra quem gosta do Cinema que expressa através da linguagem visual, é um prato cheio e uma deliciosa viagem de sutileza e melancolia.
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Texto de autoria de Thiago Debiazi.
Interessante a história. Mas viver na sombra do pai…
Bom review irmão!
Ola amigos, sou o Sal do sextameianoite.com, estou passando para retribuir, contudo, também para conhecer o espaço de vocês e adiantar que estou gostando do que vou lendo, este artigo por exemplo, ainda não vi o filme, mas depois do que eu li, fiquei curuioso…
estarei olhando os casts, e depois voltarei para comentá-los..
um abraço a todos… e espero encontrá-los sexta meia noite em mais um super sextacast….
nosso 20º programa….
Pude conferir recentemente este filme. Entre outras considerações, posso dizer que ele se mostra peculiar, intrigante e inteligente, assim como a resenha acima.
Cheers
O foco do filme basicamente é sobre as garotas que se suicidam mesmo, não existe grandes reviravoltas, elas não mudam de idéia no final, nenhuma consegue voltar atrás, nenhum consegue fazer alguma das meninas continuar vivendo, é como no título. Mas o principal assunto que o filme quis tratar, não é apenas este. Observamos que é mostrado toda uma história mórbida e perturbadora de um lado sentimentalista, a ótica de garotos mantendo uma espécie não muito rara de amor platônico. Essa é a parte que torna o filme diferente, perceber os fatos absurdos acontecendo, e já saber que eles vão acontecer, mas mesmo assim conseguir enxergar um pouco da vida dessas virgens antes de seu fim fatídico.