Vale dizer que Harry Potter e A Ordem da Fênix, o quinto filme da cinessérie veio pra colocar nos trilhos o que já estava perdendo a direção, logo após o desorientado e azedo O Cálice de Fogo. Quando o filme foi lançado em 2007, ninguém esperava uma pegada (pela primeira vez na saga) tão realista e sombria ao mesmo tempo. Isso porque David Yates tem o mesmo estilo aceitável que Chris Columbus apresenta na direção de A Pedra Filosofal, mas o que poucos estavam dispostos a entender (Fã é assim, ama ou odeia) é que o segundo nos iniciou à magia da forma mais clássica e infantil possível, enquanto Yates teve de pegar as crianças de bochechas rosadas e atirar num mundo cada vez mais ligado tanto ao universo real, quanto ao universo adulto que a série iria alcançar em Relíquias da Morte – Parte II, 4 anos depois.
Uma transição difícil, cuja mudança de tom reflete no nosso contato com um conto de fadas pessimista, azul tal a famosa fase de Pablo Picasso, onde girassóis dão lugar a espinhos e ao invés de humor, doses de drama e romance exageradas, mesmo para quem cresceu vendo Daniel Radcliffe se enterrar cada vez mais na pele de um bruxo finalmente humano! Reparem que não se deve mais citar “bruxinho”, já que o Harry do começo encontra o canto do cisne de sua ingenuidade neste quinto filme, logo no começo bastante revoltado, hormônios à flor da pele, lutando contra forças das trevas para salvar o que restou de sua família e pagando o preço disso. Nota-se como Hogwarts nunca tinha sido tão pouco explorada antes, afinal: Há vida fora da escola.
Além de traçar novos contornos na tradução ao Cinema do mundo de J. K. Rowling, contrastando por exemplo o mundo real, do mundo da magia, para criar um significado mais amplo à odisseia, Yates também nos propõe o seguinte: Ele desobedece a nossa noção de Harry que tínhamos até O Cálice de Fogo (herói básico de personalidade unilateral) para subverter sua figura à um moleque cheio de falhas, e que se intimidado não ficará encolhido diante dos perigos à tona. Del Toro teceu essa “desconstrução” do herói em contexto político e sensacional, no belo O Labirinto do Fauno, filme de narrativa fantasiosa, cheia de paralelos com esse A Ordem da Fênix, e o mais importante: Livre das exigências de fãs fanáticos que Yates, tadinho, não pôde (ou não quis) se libertar.
Como se grilhões é o que faltasse nesse cineasta: Suas cenas de ação simplesmente não funcionam, dando muito mais peso ao drama que a vibração das emoções do momento. Para Yates, ação é câmera tremida e muito barulho, mais nada. Um cineasta pintor, onde a imagem funciona bem enquanto não se grita AÇÃO! Talvez por isso, o clímax do bem contra o mal é dramaticamente vibrante para fazer os fãs pularem, mas ao mesmo tempo frustrante no viés do espetáculo. Em 2007, ao assistir a aventura no cinema com vários colegas da escola (sim, cabulamos aula afinal era Harry Potter, matemática vem depois), o grande conflito descrito no livro vem com tanta fidelidade às páginas que nem a batalha final, nem qualquer outro momento do filme, longo demais, usa do potencial completo que suas bem arquitetadas cenas poderiam oferecer.
E aqui chegamos ao motivo da crítica: Quando a gente começa a desenhar hipóteses e especular o lado would das coisas, bem, é porque a gente sente que a luta no Ministério da Magia (um cenário gigantesco), ou mesmo a presença de Voldemort que só cresce a partir deste episódio (sem esquecer o beijo assexuado e virginal de Harry e Cho-Chang) poderiam ser mais, muito mais e melhor, tornando um episódio 100% esquecível na saga, assim, em um belo filme de autoconhecimento, transição, com possíveis e desperdiçados momentos-chave na jornada de Potter e seus amigos; um longo e moralista conto de fadas, onde não temos certeza se Yates planejava um final feliz para uma história calcada em morte, já que aqui, a única força capaz de vencer seus demônios é o poder e a harmonia das amizades duradouras – algo naturalmente mágico e irresistível, aliás.