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  • Crítica | Perseguidor Implacável

    Crítica | Perseguidor Implacável

    Começando com o badalar de sinos unido a imagens de uma lista de nomes do Departamento de Polícia de San Francisco que morreram no cumprimento do dever, Perseguidor Implacável já demonstra o lado pelo qual a parceria entre Don Siegel e Clint Eastwood — responsáveis pela construção de um dos maiores ícones dos filmes de ação do cinema hollywoodiano em uma época pré-blockbuster — seguirá nas quase duas horas de filme.

    O paladino e justiceiro se mantém calado, investiga cada detalhe do assassinato de uma jovem mulher. Sem tato para tratar com as autoridades, o inspetor Harry Callahan não se furta sequer em peitar de modo enérgico o prefeito, mostrando sua inquietude diante do mistério que só cresce, se mostrando impaciente diante da burocracia dos seus superiores. A simplicidade de seus atos, por mais autoritários que soem, fazem completo sentido diante dos homens que tentam convencê-lo de frear um pouco seus métodos.

    Dirty Harry tem um poder de convencimento ímpar, por conter em suas atitudes que gira em torno do lugar comum, ou seja, seu discurso é de fácil compreensão, aliado a fúria descerebrada da patuleia, o que obviamente encontra empatia junto ao público médio. A quantidade de bordões dos filmes de ação que incorrem no roteiro Harry Julian Fink, Rita M. Fink e Dean Riesner é absurda. Já na primeira demonstração de seus predicados, Callahan interrompe seu almoço – um cachorro quente, mais uma vez para simbolar  o quanto ele era parecido com o cidadão comum – para impedir um assalto a um banco. Sem qualquer hesitação, o policial saca sua Magnum 44, dita pelo próprio como o revólver mais poderoso do planeta e alveja o meliante em fuga.

    O código moral de Harry era muito condizente com a sua época, incapaz de verificar nuances ou tons acinzentados, um contraponto a dualidade típica da Guerra Fria, que insistia em esconder arquétipos maniqueístas. O lado do inspetor é bastante definido, seu código ético é baseado em um extremo conservadorismo popular, capaz de culpar maltrapilhos, clamando para que sejam presos ou executados a sangue frio, além de ter na perseguição dos sexualmente ativos um estranho hobby, o que dialoga ainda que em modo subliminar, com a hipocrisia latente de muitos retrógrados, que escondem seus desejos sexuais em uma vã tentativa de despiste, em forma de ultramoralismo.

    A perseguição implacável prevista no título brasileiro do filme se dá através do resgate a pistas que Callahan insiste em fazer, e da maratona que sofre para tentar atender aos desmandos do misterioso algoz. O cansaço do policial se manifestam através de suspiros prolongados e ações bem distantes de suas rotinas, onde sua estafa se manifesta até na complacência com um pretenso viciado, em um truque do roteiro que alude primeiramente a um “amolecimento” de sua severidade, podendo também ser interpretado com intenção de não ser tão reacionário ou desconectado com a atualidade.

    O receio em não parecer cruel logo se demonstra um chiste, uma vez que o inspetor apela até para tortura, quando em posse da confissão do facínora. A violência exacerbada se manifesta a partir da catarse de um homem que sente-se injustiçado, e que não vê outra alternativa a não ser praticar o justiçamento via assassinato, ainda que seja impedido pela questão da refém que todo o departamento busca.

    Os momentos finais envolvem uma sucessão de acusações de Scorpion (Andy Robinson), colocando Harry em uma posição constrangedora, elevando o embate para um nível pessoal. O sequestro ao ônibus escolar reúne medos diversos do cotidiano, especialmente àqueles ligados a segurança de crianças. O entrave final entre vilão e herói reprisa o diálogo do começo do filme, com um desfecho mais trágico para o antagonista, métrica que seria muito utilizada no filão, dali para frente. Os méritos de Eastwood enquanto intérprete da figura de brucutu inicial só ficou imortalizada graças a condução de Siegel para lidar com julgamento moral e irônico sobre a figura de Harry e que inspiraria o ator a dirigir seu primeiro longa, Perversa Paixão, em 1971. O longa ainda dá início a uma saga de cinco filmes com o mesmo protagonista, ainda que nas continuações a dualidade de julgamento claramente tenha se perdido.

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  • Crítica | Perversa Paixão

    Crítica | Perversa Paixão

    Perversa Paixão - poster - capa bd

    A inquietude de Clint Eastwood proporcionou em 1971 uma nova função para sua carreira cinematográfica assumindo, além do papel principal, a direção no suspense Perversa Paixão. O primeiro passo de um diretor que seria ilimitado em suas produções, ousando a cada novo lançamento e destacando-se com um estilo pessoal de filmagem apoiado em suas inspirações e nos ensinamentos ao lado de Sergio Leone e Don Siegel, entre outros com os quais trabalhou.

    Rodada em apenas 21 dias, marcando a economia que se tornou exemplo seguido na carreira de Eastwood, sua estreia se destaca pela narrativa intensa e um estilo que, desde já, apontava-o como um grande diretor contemporâneo devido a coerência narrativa. Ainda que este filme não seja destacado como suas produções posteriores, é notável a segurança pela qual o diretor assume o cargo e imprime suas características neste ofício como se fosse um processo natural além de um desejo.

    Na trama, Dave é um radialista de sucesso que mantém um programa diário nas madrugadas. Devido ao estilo mulherengo e bon vivant, perde a namorada após uma traição. Um dia, uma de suas ouvintes o encontra e os dois iniciam um breve romance, o qual faz a garota não se sentir disposta a ser dispensada por outras mulheres, iniciando uma perseguição obsessiva pelo locutor.

    O suspense se apoia na fixação da mulher diante do radialista, uma situação que transforma a adoração em assédio, permeada por uma visão equivocada do amor. Um conflito agressivo que fez de outra produção, Atração Fatal, um clássico do gênero. No decorrer da narrativa, a história cresce acompanhando a loucura da fã através de um amor obsessivo e sem razão aparente.

    A precisão da fotografia em tons escuros apoia a tensão dramática em cenas feitas à meia-luz, representando simultaneamente tanto um cotidiano realista quanto amplifica a carga de suspense. Uma característica de composição de imagem que Eastwood manteve em sua filmografia ao lado de cenas que abrem em panorama e terminam focalizando a personagem principal.

    Como amante obsessiva, Jéssica Walter, cuja atuação concorreu ao prêmio de Melhor Atriz em 1972 no Globo de Ouro, brilha como a fã sedutora que vê no locutor um amor ideal. A sensualidade inicial da personagem vai se transformando em possessão e raiva conforme o radialista nega a relação com Evelyn, resultando em ataques verbais e físicos. Mesmo que a escalada de agressões deixe implícito que atos extremos surgirão, a incredulidade do radialista diante de tais atos reflete a impressão e emoção do público.

    Devido ao distanciamento temporal desta produção, é possível observar a modificação crítica no decorrer no tempo. Inicialmente, a recepção não foi positiva. Porém, a construção de uma carreira sólida na direção aponta hoje para uma melhor análise para esta primeira produção bem composta como um thriller de suspense, e que destacava o estilo do diretor. O talento de Eastwood sempre se fez presente, não à toa sua obra seguinte, O Estranho Sem Nome, retomaria com qualidade o estilo que o consagrou: uma bela releitura que se tornaria seu primeiro grande filme como cineasta.