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  • Resenha | Filósofos em Ação – Volume 2

    Resenha | Filósofos em Ação – Volume 2

    Nota-se o quão difícil foi para a dupla dinâmica dos quadrinhos, Fred Van Lente e Ryan Dunlavey, manter o interesse e a irreverência da primeira parte da saga dos grandes filósofos da história da humanidade aqui, na sua continuação publicada pela Gal Editora, a mesma do maravilhoso primeiro exemplar da obra dos dois artistas americanos. Isso porque, se antes eles não precisaram recorrer a uma extensa e desalinhada dialética tanto textual quanto visual para modernizar em uma nova linguagem figuras que já fazem parte de uma imaginário intelectual global (Platão, Freud, Santo Agostinho), há muito, tratando agora de Karl Marx, Jean-Paul Sartre e Descartes, este Volume 2 ganha seriedade ficando órfão da diversão, justamente o elemento mais marcante e bem equilibrado do que veio antes.

    A comparação é inevitável devido à baixa de dinamismo na qualidade narrativa. Uma pena, já que os desenhos caricatos e espirituosos de Dunlavey continuam impagáveis, principalmente no começo, ou seja, nas primeiras vintes páginas que dão conta de evidenciar o próprio e velho Marx, com suas famosas teorias ensinadas nas aulas de sociologia mundo afora, e Nicolau Maquiavel, quando Filósofos em Ação se propõe a provar que o cara nem foi tão mal assim; apenas acreditava piamente que o homem de poder, em prol de sua auto preservação, precisa aprender a ser mal nas situações necessárias a tanto. Dispondo de uma rapidez que já tínhamos atestado antes, é justamente daí em diante que a sensação de dessemelhança começa a apitar, e sem parar, até o final.

    As páginas, então designadas as teorias e a vida de São Tomás de Aquino, o homem que tentou e realmente provou por cinco provas diferentes a existência de Deus, e ao próprio Sartre, o cara que também tornou compreensível – e atraente – a atividade filosófica às massas do seu tempo, sofrem de um certo cansaço criativo jamais sentido quando antes se perguntava “Por que existe o bem?” (Santo Agostinho) ao invés de se afirmar que “penso, logo existo” (Descartes). O capítulo referente a Cabala, um sistema filosófico tido por muitos como doutrina religiosa, é tão corrido que beira a confusão, denotando uma falha no poder de síntese literária ainda inédita nesses dois volumes cheios de humor negro e satirização, a fim de tornar mais acessível esse mundo de ideias atemporais desses ídolos que tanto dedicaram suas vidas a estudar Confúcio, Sócrates, Buda, ou a própria bíblia em exaustão.

    Contudo, é de se admirar a própria premissa dada em continuidade por escritor e desenhista, esmerando-se entre relatos históricos e a sabedoria de grandes mentes e suas criações, inspirações e visões proféticas, criando um mural de lendas que, ora se inspiram umas nas outras para questionarem suas teorias e criarem novas, ora obtém da própria ideia do Divino o ímpeto da busca pela verdade por trás das coisas de uma vida mundana vazia, desprovida de explicações, e carente de um desenrolar reflexivo. Nisso, a série dos Filósofos de Ação termina quase que totalmente ancorada pelo poder do texto, quase que submetendo sua ótima parte visual a um segundo plano. Mesmo assim, com algumas passagens que valem a pena (você nunca mais vai ler Karl Marx da mesma forma), eis um fechamento digno para a co-criação que achou na nona-arte (o mundo dos quadrinhos) a mídia perfeita para as convenções e possibilidades criativamente almejadas, desde o início.

  • Resenha | Filósofos em Ação – Volume 1

    Resenha | Filósofos em Ação – Volume 1

    O quão nobre seria a arte, a artilharia de valores reunidos em uma única publicação, de tornar compreensível para “pessoas comuns” todo o conceito universal da Filosofia? Muito, não é verdade? Contudo, se o(a) leitor(a) já estiver com a resposta pronta entre suas certezas, já está traindo, sem ao menos perceber isso, todo o processo de pensamento não-imediatista que todos os nossos “heróis”, estivessem eles em busca da verdade ou das liberdades propriamente ditas de cada um, tanto defenderam e tentaram disseminar ao longo do tempo – alguns, inclusive, de forma não tão gloriosa ou eticamente admiráveis, assim.

    Podemos, portanto, entre tantas outras coisas, afirmar de antemão que fazer a filosofia e seus representantes típicos terem um grande apelo popular, através da diversão que emana dos quadrinhos, é algo realmente nobre por si só. Afinal, não é todo dia, no tempo ultra corrido do século XXI, que nos sentimos animados de verdade para lidar, com livre e espontânea vontade, com ensinamentos filosóficos (e suas reflexões) em meio as múltiplas tarefas que esses idos contemporâneos nos impõe, categoricamente. Ainda assim, caso a resposta para aquela ou qualquer outra pergunta fosse feita às pressas, como nos ensinou o tempo atual e o senso comum, seria preciso voltar e tentar entender o motivo que levou essa primeira parte de Filósofos em Ação ser tão brilhantemente bem escrita por Fred Van Lente, e graficamente posta em vida com uma vibração invejável por Ryan Dunlavey.

    Ao calcular a viabilidade de uma história em quadrinhos que condensa toda a moral filosófica de Platão (tido aqui como um lutador mesmo, metáfora para sua incansável luta pela verdade, cujo preço foi alto e cruel), Sigmund Freud (o grande pesquisador da sexualidade humana, e sua rixa histórica com seu próprio discípulo, Carl Jung) e vários outros, aqui tidos como símbolos centrais de suas próprias teorias e atividades que, de uma forma ou de outra, tanto influenciaram as sociedades que se originaram após seus estudos, é de se notar o esforço de Van Lente para resumir, em dez páginas cada, a história de vida e as forças ideológicas que, rumo a iluminação e a imortalidade histórica, moveram esses homens e a única mulher entre eles, a russa Ayn Rand, a mais objetiva de todos – até ser traída por seu companheiro, momento esse que resulta num dos pontos chave do livro desenhado: o uso de um bom humor impagável.

    Este é expresso tanto nos diálogos, quanto nos traços de Dunlavey. Sempre expirado, tal o coleguinha escritor, formando uma unidade visual deliciosa ao longo de quase cem páginas divertidíssimas, que levam qualquer um a entender e querer praticar o ato da reflexão – nem que seja só por um instante, o cara faz o uso da cor além dos tons monocromáticos que emprega ser tão necessário, em Filósofos em Ação, quanto mais páginas além das dez já mencionadas aos seus protagonistas. Com total irreverência e credibilidade, conhecemos as mentes filosóficas revolucionárias e traduzidas aqui através de uma centena de situações fantásticas, mas que nunca se distanciam da realidade – a forma irônica como é ilustrada a relação do iluminista Thomas Jefferson com os negros (o homem que redigiu a declaração de independência dos E.U.A. com a Inglaterra abominava a escravidão, mas se viesse a abolir seus escravos, iria à ruína financeira), fica sendo nada menos que genial, ainda que dolorosamente justa. A história dos fatos nunca perdoa.

    Seja como for, e deixando claro que todo fato é linguagem, e portanto, mera opinião, segundo os ensinamentos de Bodhidharma, o homem que trilhou a China e seus templos para mostrar como a verdade é relativa a consciência de cada ser pensante, é de se surpreender como Filósofos em Ação não diminui nem simplifica, ou desmistifica a aura lendária dessas personas já mortas, mas cuja semente de suas ideias e ideais seguem mais vivas do que nunca. A publicação da editora Gal, perfeitamente traduzida ao português, toma o cuidado de provar isso página por página, redigidas com um esmero impressionante, evidenciando todo o processo artístico de Van Lente e Dunlavey, e promovendo na graça e na inteligência que tem em comum todas as histórias envolvendo Nietzsche, Platão e Santo Agostinho, a importância, o fascínio e a diversão que existem em todo e qualquer tipo de questionamento humano.

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