Crítica | O Mundo Perdido: Jurassic Park
De começo inofensivo, mostrando uma família rica em uma região praiana, a continuação de Jurassic Park começa tão jocosa quanto seu protagonista, o Doutor Ian Malcolm (Jeff Goldblum), único remanescente do episódio primário. A mostra dos pequenos dinossauros atacando uma criança é bastante grotesca, dando o tom de como seria a exploração da trama spielberguiana – com auxílio de David Koepp e Michael Crichton.
O chamado aventura começa com a revelação de que Malcolm rompeu o contrato de sigilo sobre os fatos ocorridos no filme anterior, tendo absolutamente negado pela família de John Hammond (Richard Attenborough), especialmente por seu sobrinho e advogado Peter Ludlow (Arliss Howard). Hammond convoca Malcolm para conversar com ele sobre uma ilha reserva, próximo da Costa Rica, onde cultivava os animais pré-históricos, que graças a acidentes naturais, foram liberados. A mudança de postura do ancião é notada logo em seu discurso, de maior preocupação com as criaturas do que com os lucros, mas sua esperteza ardilosa também se nota, especialmente ao analisar o modo de convívio dele junto a Ian, pondo seu antigo par como a estudante de paleontologia responsável pelo grupo.
Mesmo contrariado, o matemático prolixo decide ir ao lugar, para resgatar sua amada como uma espécie de príncipe encantado às avessas. A busca por Sarah Harding (Julianne Moore) revela cenas belíssimas, de estegossauros se exibindo em meio a mata desbravada. O resto do grupo é formado pelo fotografo Nick Van Owen (Vince Vaughn) e Eddie Carr (Richard Schiff), antigos aliados da moça, o que faz com que o isolamento de Ian seja ainda maior, compondo assim um papel de párea no mesmo grupo que deveria liderar. A diferença de objetivos era notória, transitando entre o resgate e documentação fílmica do que ocorria na ilha.
Ainda sob uma égide de contar uma história (também) para crianças, o filme demora a ter baixas humanas, exibindo-se em quase uma hora antes de matar personagens, mesmo os que aparentemente tem mau caráter, como os caçadores liderados por Roland Tembo (Pete Postlethwaite). A excursão que deveria ser de quatro (na verdade cinco) pessoas logo é mostrado em dezenas, homens que buscam capturar os monstros para leva-los a cidade.
O primeiro momento de absoluto suspense, ocorre quando há um confronto entre o cuidado com as crias, mostradas com a caça da casal de tiranossauros indo atrás do quinteto, que tem a posse do pequeno filhote destes. A cena da queda do carro trailer é emblemática e simbólica, pois revela a fragilidade do homem diante das monstruosidades, revelando a impotência destes mesmo quando eles se esforçam para ser justos e bons com as criaturas. Outro bom confronto, é o esmero de Ian com sua filha Kelly, que o enganou, partindo junto a ele, escondido em sua bagagem, refutando qualquer possibilidade do protagonista de fugir daquela paternidade incomum que exerce. No âmago dos “dois pais”, há somente o desejo por ter seus filhotes em um habitat seguro, no alto, longe da ação frenética típica da predação.
A escolha por tons mais escuros e por lugares mal iluminados, revela uma evolução na narrativa proposta pelo realizador. Não havia mais espaço para a idílica fantasia de Parque dos Dinossauros, ao contrário, o que sobreviveu foi o espírito de caça e caçador, com o homem sendo o principal alvo da fome, apesar dos esforços de Tembo e de seus homens.
A baixa auto estima, unida a clara ganância fizeram Ludlow escolher errado, tolamente decidir por levar um dos tiranossauros para San Diego, planejando exibi-lo onde seria o mais novo parque temático dos Hammonds. Não demora para esta decisão se mostrar a mais desacertada possível, com a fuga da criatura, que atemoriza agora um ambiente urbano, igual ao visto no filme de 1925.
Apesar de os momentos finais deste apresentarem ainda mais maniqueísmo da parte dos T-Rexs, substituindo o Deus Ex Machina do primeiro volume pela vingança a la Charles Bronson, Mundo Perdido consegue ter um desfecho um bocado mais definitivo, completando o arco em si, impossibilitando em partes futuras continuações caça-níqueis, tratando os dinossauros como vítimas da ação predatória e irresponsável humana. Apesar de não conter um caráter tão edificante, o discurso de Hammond valida a frase que foi responsável por deixar Ian Malcolm famoso, de que a vida encontrará um jeito, claro, se o homem não interferir mais entre as criaturas.