Tag: Peter Stormare

  • Crítica | A Rosa Venenosa

    Crítica | A Rosa Venenosa

    Filme de George Gallo, A Rosa Venenosa reúne elementos de um noir moderno ambientado no ano de 1978, apresentando seu protagonista Carson Phillips como um homem de muitos vícios e afeito a luxúrias. O personagem de John Travolta, um investigador particular de Los Angeles, se vê obrigado por um caso a mergulhar em um antigo problema pessoal que logo desemboca em uma trama de assassinatos e eventos estranhos.

    O filme reúne vários dos clichês do noir, protagonista mal encarado, anti-herói e sem perspectivas, que se vê abordado por uma mulher atraente pedindo um favor ao detetive, tudo isso situado em cenários sujos e uma missão envolvendo mágoas do passado repleta de ambiguidades.

    A tentativa de fortalecer a aura de suspense esbarra na falta de sutileza do filme. Gallo apresenta as curvas de suspense de maneira brusca. As atuações não ajudam, ainda que o maior problema claramente seja textual e não dramatúrgico. Os personagens são bidimensionais, fora Carson, o que se agrava pelo fato do elenco reunir nomes como Morgan Freeman, Robert Patrick, Famke Janssen, Brendan Fraser, Peter Stormare etc.

    As cenas de ação são genéricas e os vilões histriônicos, caricatos e nada convincentes. A persona do médico mau que Fraser faz parece uma paródia de vilão de filmes do 007, tom esse que não tem nada haver com o restante da atmosfera de A Rosa Venenosa. A ideia e intenção do filme é ótima, mas a execução é bastante problemática, falta estofo à realização tanto na direção quanto em roteiro, resultando em última análise em mais um filme com elementos do gênero policial que permeiam o horário sabatino do Super Cine na Rede Globo.

  • Crítica | 8mm: Oito Milímetros

    Crítica | 8mm: Oito Milímetros

     

    8mm: Oito Milímetros, de Joel Schumacher, é produto do seu tempo e gênero, e se valeu de Nicolas Cage atuando como o detetive particular Tom Welles. Sua função primordial é a serviço da viúva de um homem rico que descobriu um filme de 8 milímetros dentro do seu cofre e quer saber se os fatos que aparecem ali são reais ou não.

    A história se passa em Miami com o protagonista no início chegando de avião, à noite. Logo é mostrado que ele é um homem de família, casado com Amy (Catherine Keener). Ele tem problemas bem comuns, tem que ganhar dinheiro o suficiente para sustentar sua família (incluindo sua filha), fuma escondido  de sua cônjuge, ou seja, tem problemas com vícios encarados socialmente como leves e lida com eles de maneira bem comum.

    Tal qual seria em O Custo da Coragem lançado algum tempo depois, em 8mm Schumacher é bem comedido. Traz uma obra que carece de exageros e arroubos visuais, que é bem pontuada inclusive pelo diretor de fotografia Robert Elswit, o contumaz parceiro de Paul Thomas Anderson, que consegue estabelecer bem um clima meio depressivo sobre a vida das pessoas – mesmo em Miami, que é uma cidade normalmente atribuída a farras e comemorações dado o eterno clima de verão e as praias. Além disso, as questões sujas envolvendo o filme encontrado no cofre do Sr.Christian são retratadas de maneira natural, apesar da visceralidade dos atos. Nota-se um incômodo em Welles quando assiste, servindo ele como representante do público (uma vez que aquelas são cenas chocantes), e essa sensação de estranhamento é alastrada ao longo da investigação e do passeio dele às ruas, onde habita a escuridão da pré madrugada, salientando uma obviedade que pode ser ignorada: toda cidade esconde segredos pesados e agressivos.

    O longa apresenta uma história e abordagem bem simples, com elementos típicos de romances detetivescos e suas adaptações para o audiovisual. Há na contratante  Sra. Christian (Myra Carter) uma figura aparentemente livre de suspeitas, uma música incidental que ajuda a aumentar o grau de tensão à medida que as investigações avançam. Também se apelam para cenários onde há destaque para cores de casas e estabelecimentos baseado em tons de cinza, para basicamente evocar que as almas das pessoas da história de Andrew Kevin Walker não são puras, longe disso, dado até sua filmografia que inclui participações nos roteiros de Se7en: Os Sete Crimes Capitais, Clube da Luta e A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça.

    A carreira de Joel Schumacher é bastante prolífica e  dividida por fases que são determinadas por fatores externos e até alheios aos seus filmes. Ele produziu fitas sérias como Um Dia de Fúria, outras mais voltadas para o humor nonsense em A Incrível Mulher que Encolheu, fez um clássico juvenil com Os Garotos Perdidos , até cair para si a responsabilidade de adaptar as historias do homem morcego, em dois filmes que tiveram muitas controvérsias, mas que na época foram exaltados (sobretudo Batman Eternamente). Depois que Christopher Nolan lançou seu Batman Begins e especialmente Batman: O Cavaleiro das Trevas, houve um revisionismo por parte do público na filmografia de Schumacher, que passou tanto pelos filmes do Batman, até as outras obras do diretor, que passaram a ser não só mal avaliadas, mas também mal frequentadas por gente de produção e atores principalmente da segunda metade dos anos 2000 para frente. As oportunidades para o diretor foram rareando, e bons parceiros também, o que é curioso, pois o roteirista responsável por boa parte da fragilidade dos produtos que Schumacher capitaneava ganha cada vez mais poder e influencia na industria. Akiva Goldsman tentou comandar os filmes de monstro da Universal (um fracasso retumbante), hoje escreve e produz a maioria dos produtos televisivos de Star Trek, que também não são unanimidade em crítica. Para o diretor, sobrou o ostracismo.

    Os personagens mostrados no filme são executados por atores que teriam seu apogeu pouco depois do lançamento em 1999, a participação de figuras como James Gandolfini, Joaquin Phoenix e Peter Stormare são bem pontuais, há carisma em cada um deles e é fácil acreditar em seus dramas.

    8mm: Oito Milímetros é um longa que fez muito sucesso durante o início dos anos 2000, mas hoje é bem pouco lembrada (e talvez até subestimada) e o que se vê nela é um mergulho bem fundo na alma da perversidade humana, além de um retrato do submundo BDSM que, apesar de caricato, não era tão agressivo em abordagem quanto tantos outros filmes de sua época. É tolice não se ater a fatos cronológicos, o filme é fruto de seu tempo e como Tempo de Matar tem pontos complicados na abordagem de algumas minorias. Além de não ser feito para todas as plateias, ele esbarra em um certo maniqueísmo (especialmente ao tratar as pessoas que fazem bondage como se fossem criminosas e más). Fora isso, a parte criminal é bem explorada, as atuações por mais canastronas que possam ser em alguns pontos são bem encaixadas e o ritmo do filme é frenético e honesto.

  • Crítica | Em Má Companhia

    Crítica | Em Má Companhia

    Em Má Companhia é um filme de Joel Schumacher de 2002, que mirava as fitas de super espiões que faziam sucesso naquela época, em especial os da franquia Missão: Impossível e a duologia As Panteras. Sua trama começa em um lugar suntuoso, num cenário no estrangeiro onde são colocados frente a frente Anthony Hopkins, Peter Stormare e Chris Rock, que fazem respectivamente o mentor Oakes, o bandido Adrik Vas e o suposto herói Kevin Pope.

    O filme não perde tempo, já começa com a ação em alta, ocorrendo até a morte de um dos personagens centrais. A música animada de Trevor Rabin ajuda o filme a manter uma tônica mais otimista, mesmo com a tragédia que aparece ali. Todo o roteiro tenta apresentar de maneira séria uma ideia esdrúxula, com a CIA, que deveria ser uma  agência que prima pela inteligência, procurando em Jacob Jake Heyes, o irmão gêmeo perdido de Kevin, o substituto para ele, basicamente por ser um esperto malandro de rua, que fala gírias e parece ser maroto o suficiente para lidar com criminosos graúdos do cenário mundial.

    Ao menos há o artifício positivo de Jacob ser um sujeito engraçado. Rock está solto, e entre os momentos mais malucos estão o fato de ele, ao começar a aprender uma nova língua, se focar em traduzir frases sobre infecções que jamais teria, como como complicações vaginais e ausência se menstruação. O humorista tem liberdade para fazer toda graça que lhe cabe e esse talvez seja o filme mais caro onde ele tem espaço, muito mais do que normalmente fazia nos filmes da Happy Madison com Adam Sandler e seus capangas. No entanto, o fracasso na bilheteria freou certamente a carreira dele como frontman em filmes de ação ou produtos mais caros, o que de certa forma, é uma lástima, já que filmes muito piores conseguiam êxito (como a franquia A Hora do Rush), enquanto o longa de Schumacher mal se pagou.

    Por mais genérica que seja a historia – e é muito! – há um número grande de situações tensas e cenas de ação absurdamente bem conduzidas. A fotografia de Darius A. Wolscki ajuda a estabelecer essa atmosfera de super espionagem e, mesmo tendo inúmeros problemas narrativos contando até com um final adocicado, há um  certo charme na interação de Rock e Hopkins. Ambos possuíam uma química inesperada juntos, fazendo desse Em Má Companhia não um filme subestimado, mas certamente muito competente dentro de seu filão, mesmo com todas as críticas negativas a seu respeito.

  • Crítica | O Mundo Perdido: Jurassic Park

    Crítica | O Mundo Perdido: Jurassic Park

    De começo inofensivo, mostrando uma família rica em uma região praiana, a continuação de Jurassic Park começa tão jocosa quanto seu protagonista, o Doutor Ian Malcolm (Jeff Goldblum), único remanescente do episódio primário. A mostra dos pequenos dinossauros atacando uma criança é bastante grotesca, dando o tom de como seria a exploração da trama spielberguiana – com auxílio de David Koepp e Michael Crichton.

    O chamado aventura começa com a revelação de que Malcolm rompeu o contrato de sigilo sobre os fatos ocorridos no filme anterior, tendo absolutamente negado pela família de John Hammond (Richard Attenborough), especialmente por seu sobrinho e advogado Peter Ludlow (Arliss Howard). Hammond convoca Malcolm para conversar com ele sobre uma ilha reserva, próximo da Costa Rica, onde cultivava os animais pré-históricos, que graças a acidentes naturais, foram liberados. A mudança de postura do ancião é notada logo em seu discurso, de maior preocupação com as criaturas do que com os lucros, mas sua esperteza ardilosa também se nota, especialmente ao analisar o modo de convívio dele junto a Ian, pondo seu antigo par como a estudante de paleontologia responsável pelo grupo.

    Mesmo contrariado, o matemático prolixo decide ir ao lugar, para resgatar sua amada como uma espécie de príncipe encantado às avessas. A busca por Sarah Harding (Julianne Moore) revela cenas belíssimas, de estegossauros se exibindo em meio a mata desbravada. O resto do grupo é formado pelo fotografo Nick Van Owen (Vince Vaughn) e Eddie Carr (Richard Schiff), antigos aliados da moça, o que faz com que o isolamento de Ian seja ainda maior, compondo assim um papel de párea no mesmo grupo que deveria liderar. A diferença de objetivos era notória, transitando entre o resgate e documentação fílmica do que ocorria na ilha.

    Ainda sob uma égide de contar uma história (também) para crianças, o filme demora a ter baixas humanas, exibindo-se em quase uma hora antes de matar personagens, mesmo os que aparentemente tem mau caráter, como os caçadores liderados por Roland Tembo (Pete Postlethwaite). A excursão que deveria ser de quatro (na verdade cinco) pessoas logo é mostrado em dezenas, homens que buscam capturar os monstros para leva-los a cidade.

    O primeiro momento de absoluto suspense, ocorre quando há um confronto entre o cuidado com as crias, mostradas com a caça da casal de tiranossauros indo atrás do quinteto, que tem a posse do pequeno filhote destes. A cena da queda do carro trailer é emblemática e simbólica, pois revela a fragilidade do homem diante das monstruosidades, revelando a impotência destes mesmo quando eles se esforçam para ser justos e bons com as criaturas. Outro bom confronto, é o esmero de Ian com sua filha Kelly, que o enganou, partindo junto a ele, escondido em sua bagagem, refutando qualquer possibilidade do protagonista de fugir daquela paternidade incomum que exerce. No âmago dos “dois pais”, há somente o desejo por ter seus filhotes em um habitat seguro, no alto, longe da ação frenética típica da predação.

    A escolha por tons mais escuros e por lugares mal iluminados, revela uma evolução na narrativa proposta pelo realizador. Não havia mais espaço para a idílica fantasia de Parque dos Dinossauros, ao contrário, o que sobreviveu foi o espírito de caça e caçador, com o homem sendo o principal alvo da fome, apesar dos esforços de Tembo e de seus homens.

    A baixa auto estima, unida a clara ganância fizeram Ludlow escolher errado, tolamente decidir por levar um dos tiranossauros para San Diego, planejando exibi-lo onde seria o mais novo parque temático dos Hammonds. Não demora para esta decisão se mostrar a mais  desacertada possível, com a fuga da criatura, que atemoriza agora um ambiente urbano, igual ao visto no filme de 1925.

    Apesar de os momentos finais deste apresentarem ainda mais maniqueísmo da parte dos T-Rexs, substituindo o Deus Ex Machina do primeiro volume pela vingança a la Charles Bronson, Mundo Perdido consegue ter um desfecho um bocado mais definitivo, completando o arco em si, impossibilitando em partes futuras continuações caça-níqueis, tratando os dinossauros como vítimas da ação predatória e irresponsável humana. Apesar de não conter um caráter tão edificante, o discurso de Hammond valida a frase que foi responsável por deixar Ian Malcolm famoso, de que a vida encontrará um jeito, claro, se o homem não interferir mais entre as criaturas.

  • Crítica | João e Maria: Caçadores de Bruxas

    Crítica | João e Maria: Caçadores de Bruxas

    João e Maria 1

    Na última década, o cinema tem explorado muito os contos escritos pelos Irmãos Grimm, responsáveis por Branca de Neve, Cinderela, João e Maria, Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel e A Bela Adormecida, todos estes conhecidos por todo o planeta por conta das adaptações infantis de grande sucesso feitas pela Disney. Com o sucesso da Saga Crepúsculo e se aproveitando do fato de que todos os contos citados estão em domínio público, Hollywood resolveu reaproveitar o vasto material, trazendo um conceito um pouco diferente, mostrando ao espectador uma abordagem mais adulta, gótica e com teores de suspense.

    Assim como A Garota da Capa Vermelha (que adapta Chapeuzinho Vermelho), Alice (que adapta Alice No País das Maravilhas), Branca de Neve e o Caçador (que adapta Branca de Neve), Jack: O Caçador de Gigantes (que adapta João e o Pé de Feijão) e Malévola (que adapta A Bela Adormecida), João e Maria: Caçadores de Bruxas adapta, de maneira divertida, João e Maria, dois irmãos que, após passarem por um evento traumático, sendo sequestrados por uma bruxa, decidem dedicar suas vidas a caçá-las.

    Diferente das outras adaptações, a história de João (Jeremy Renner) e Maria (Gemma Arterton) que conhecemos é contada apenas nos 10 minutos iniciais do filme, dando mais espaço para a fase adulta do casal de irmãos e isso, talvez, tenha sido um erro, uma vez que não haveria problema se a infância deles fosse novamente retratada, já que o tempo de fita é muito curto, resultando em apenas um hora e vinte minutos de filme (sem contar os créditos), o que prejudicou, de certa forma, não só o desenvolvimento dos personagens, mas também o da história escrita pelo também diretor Tommy Wirkola .

    O desenrolar da trama é muito simples, sendo que, por conta de sua fama, os irmãos chegam a uma cidade com o intuito de investigar o desaparecimento de crianças, entrando em confronto direto com a bruxa Muriel, vivida por Famke Jansen. Como dito, os personagens são mal desenvolvidos e, dentre todas as bruxas que aparecem no longa, Muriel não chega a ser tão ameaçadora ou poderosa quanto parece. E o destaque, ironicamente, fica para as outras bruxas, todas bem distintas umas das outras, carregadas de maldade, com visuais lindos, porém grotescos e que, ainda assim, necessitam de algum pedaço de madeira para que possam voar. As bruxas siamesas ligadas pelas costas são fantásticas.

    Um outro ponto bastante curioso, mas muito divertido é que João (responsável pelo lado cômico), por conta do consumo excessivo de doces na época em que estava encarcerado pela bruxa, sofre de diabetes e precisa aplicar sempre uma injeção de insulina. Inclusive, João é o único que tem uma trama paralela no longa, ao libertar da fogueira uma mulher do vilarejo que estava sendo acusada de bruxaria.

    O destaque fica para a parte técnica e artística, que desenvolveu um filme com bastante violência visual, sabendo trabalhar bastante a parte fotográfica, trazendo uma cidade medieval que elucida a tristeza pelo sumiço de suas crianças, se utilizando de cores frias, sem vida, numa época do ano que está sempre com o céu nublado, mas de qualquer forma, uma diversão para um dia frio e chuvoso.

    Texto de autoria de David Matheus Nunes.

  • Crítica | Anjos da Lei 2

    Crítica | Anjos da Lei 2

    Na atual era dos remakes e reboots, o receio de tantas produções serem lançadas apenas como caça-niqueis acaba afastando uma parte do público das salas de cinema. Porém, o grande público parece não se importar muito com isso e acaba consumindo vorazmente essas produções, o que incentiva os estúdios a investirem nesse caminho. Em sua grande maioria, essas produções são feitas a toque de caixa, sem muita preocupação estética ou com roteiro e personagens, gerando cópias e mais cópias cada vez mais genéricas e descaracterizadas.

    “Anjos da Lei 2” vem dentro deste contexto. É uma sequência de uma adaptação de uma série de TV dos anos 80, onde jovens policiais se infiltravam na escola como estudantes para investigar o tráfico de drogas. Dando sequência ao bom filme de estreia em 2011, os diretores Phil Lord e Chris Miller mantêm na segunda parte toda a fórmula que se consagrou na primeira: a relação atrapalhada, mas sempre amorosa, entre os amigos Schmidt (Jonah Hill) e Jenko (Channing Tatum), os conflitos com o chefe, Cap. Dickinson (Ice Cube), a dificuldade de Schmidt ao se relacionar com pessoas enquanto Jenko tira isso de letra, e por aí vai.

    O filme conta a história de Schmidt e Jenko sendo novamente direcionados à unidade de infiltrados para investigar a distribuição de uma nova droga antes que ela se espalhe pelo país, mas dessa vez na universidade, já que se provaram incapazes de fazer o trabalho policial convencional. Após várias tentativas frustradas de identificar a origem da nova droga e de brigarem entre si por conta das novas amizades que aparecem em suas vidas, Schmidt e Jenko precisam deixar de lado todas as suas diferenças para solucionar esse caso.

    Se a proposta do filme soa genérica e um tanto quanto inverossímil, o grande mérito de “Anjos da Lei 2” vem justamente de não se levar a sério. Ao saber que se trata de uma comédia com sátiras de vários filmes e seriados do gênero (além do próprio fato de ser uma continuação), as piadas auto-referenciais não são economizadas, especialmente nos créditos finais. As situações embaraçosas em que os protagonistas se metem durante a investigação também são muito mais exageradas do que no filme anterior, o que arranca gargalhadas do público devido, principalmente, a química entre a dupla de atores.

    Tatum não é dos melhores atores, mas ao encarnar justamente um jovem forte fisicamente, com habilidades sociais, mas não muito inteligente (características inclusive reforçadas na continuação), e com a ajuda de Hill, consegue criar um personagem carismático, interessante e engraçado. Quem também cresce no filme é o capitão Dickinson, que ganha mais espaço ao aparecer como o pai de uma aluna da mesma universidade onde os protagonistas estão infiltrados, mas que acaba dormindo com Schmidt, para aumentar ainda mais a tensão entre eles.

    Dentro disso tudo, o desfecho da história principal é o menos importante, e todos os outros personagens inseridos, como os traficantes, servem apenas de trampolim para as crescentes situações absurdas surgidas entre Schmidt e Jenko. Podemos destacar também como é positivo o fato de um filme, teoricamente de comédia, em momento algum desliza para o humor baixo, recurso tão fácil e sempre muito usado. Em momento algum as mulheres, gays ou qualquer outro grupo minoritário é tratado com desdém, muito pelo contrário. Schmidt fica uma noite com uma mulher, que logo o manda embora. Jenko começa a ter aulas sobre sexualidade e logo se posiciona a respeito dos gays, corrigindo termos ofensivos como “faggot” com um discurso politicamente correto, mas sem parecer caricato ao ponto de desvalorizar o próprio discurso.

    Anjos da Lei 2, então, repete as mesmas fórmulas consagradas do primeiro filme, mas sem se repetir como uma cópia descarada. Há evoluções na história que são interessantes de acompanhar, além das piadas e situações engraçadas que acontecem durante o longa. Quem gostou do primeiro, certamente irá se divertir também com este.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | Fargo

    Crítica | Fargo

    fargo

    Faz tempo que tenho a mania de ver as filmografias de grandes diretorias na ordem, e recentemente quis ver a de Joel e Ethan Coen. Porém, com eles resolvi começar pelo meio. O que me fez pular a ordem cronológica de filmes dos irmãos Coen e começar por Fargo foi ter lido que eles colocam um aviso no início dizendo que a história foi baseada em um acontecimento real, quando na verdade não foi. Desde quando li isso, já fiquei intrigado, pois adoro subversões desse tipo, sem compromisso nenhum com a realidade. No entanto, apesar de não ter esse compromisso com a nossa realidade, Fargo tem compromisso com sua própria realidade, como todo grande filme deve ter. E, nesse aspecto, entrega tudo o que promete.

    O eixo da história deve ser familiar a todos. William H. Macy interpreta Jerry Lundegaard, um pai de família desesperado para arrumar dinheiro, pois estaria com problemas financeiros (o que se desenrolará em outra história posteriormente). Então, contrata dois bandidos, Grimsrud (Peter Stormare) e Showalter (Steve Buscemi) para sequestrarem sua mulher e assim dividirem o dinheiro do resgate, que seria pago pelo sogro rico e extremamente crítico em relação a Jerry. No entanto, uma sucessão de pequenos acontecimentos vai mudando a história, que vai aumentando e tomando proporções muito maiores do que as planejadas por Jerry, pois, na fuga, os bandidos matam três pessoas na estrada, sendo um policial e dois viajantes que deram azar de estarem ali naquela hora.

    Os assassinatos acontecem na pequena cidade do interior, no norte dos EUA, onde a policial Marge Gunderson (Frances McDormand) é encarregada de investigar o crime, mesmo estando grávida de sete meses. E é quando Marge entra na história que tudo passa a ficar ainda mais intrigante e emocionante. Sem deixar de passar a delicadeza e bondade de uma mulher do interior, Marge passa a firmeza, inteligência e obstinação de uma policial normal, não dos filmes americanos tradicionais, para resolver um crime baseando-se apenas na investigação.

    Conseguimos também ver os detalhes menores, que geralmente não vemos, quando Marge viaja de uma cidade a outra e chega a um hotel, telefonando para a polícia local avisando que chegou, quando estamos habituados a ver simplesmente policiais se teletransportando e estando em cidades diferentes em intervalos de minutos.

    Marge segue os passos dos bandidos e chega até a concessionária de carros administrada por Jerry, que logo começa a dar sinais claros de preocupação. Com uma investigação simples, calma e baseada apenas em instinto e interpretação, Marge vai, cada vez mais, se fortalecendo no filme, mesmo transbordando fragilidade com sua imensa barriga de grávida, o que nos deixa apreensivos em relação ao encontro dela com os sequestradores, que mostram várias vezes seu grau de violência no filme, principalmente no terceiro ato, cuja simplicidade da resolução nos deixa satisfeitos justamente pelo realismo da cena.

    Outro ponto positivo é a paisagem branca da neve do norte dos EUA, cobrindo estradas, ruas e casas. Funciona quase como um personagem à parte ao contrastar a homogeneidade e a paz do branco com o sangue derramado pela violência dos bandidos. No entanto, o forte mesmo do filme está nos diálogos, que emulam os sotaques do interior dos EUA, com palavreado local e frases feitas, dando o toque de humor negro, característico dos Coen, a cenas com potencial dramático intenso. Dessa forma, o principal mérito em seus filmes geralmente é a forma como eles a contam, e não a história em si, por mais que a história seja boa.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.