Tag: William H. Macy

  • Crítica | O Cliente

    Crítica | O Cliente

    Joel Schumacher, dentre os diretores de cinema, talvez tenha sido o que melhor entendeu a literatura de John Grisham – o que não é pouca coisa, já que diretores de alto calibre já haviam feito filmes baseados em seus livros, como Alan J. Pakula, Francis Ford Coppola, Robert Altman e Sidney Pollack. O Cliente começa seguindo os passos de Mark Sway (Brad Renfiro), de 11 anos, e seu irmão caçula, crianças que vivem seus dias entre brincadeiras, com um certo flerte com a delinquência juvenil, como foi em Os Garotos Perdidos.

    Esses aspectos logo se revelam um despiste, uma variação do MacGuffin que Alfred Hitchcock tanto utilizava, já que toda a inteiração entre os meninos resulta no testemunho de um suicídio que os meninos acompanham. Eles testemunham uma movimentação estranha de Jerome ‘Romey’ Clifford (Walter Olkewicz), um advogado que se entorpece com barbitúricos para dar um fim à sua vida, não sem antes contar segredos sobre a morte de um político e o envolvimento de um mafioso. Já no início a tensão é jogada num nível bastante alto, estabelecendo uma situação de perigo urgente.

    Schumacher resolve bem sua obra, estabelecendo o caráter de thriller com uma trilha sonora incidental conduzida por Howard Shore, e com temáticas interessantes o suficiente para atrair a atenção do público nos primeiros 15 minutos, algo bastante típico da literatura de Grisham, como o próprio O Cliente. Ao mesmo tempo que apresenta figuras caricatas, como a do gangster Barry ‘the Blade’ Muldano (Anthony LaPaglia), toda a estrutura de vida dos Sway é mostrada de forma pragmática, como pessoas sem dinheiro, e portanto, sem muito direito à defesa ou cuidados médicos adequados.

    Dentro do elenco, destaque para Will Patton, Mary-Louise Parker, William H. Macy, além da advogada e quase protagonista Reggie Love (Susan Sarandon), e o promotor e celebridade, Roy Foltrigg (Tommy Lee Jones). A história se desenrola de forma fluida e com uma bela construção de suspense e perigo constante de maneira gradual. Schumacher sabe exatamente quando intervir com sua câmera, dosando bem suas intervenções e a simples vazão aos escritos originais, aliás, aqui também se percebe uma atuação bastante assertiva de Jones, que faz um personagem tridimensional, bem o inverso do que seria o seu Harvey ‘Duas Caras’ Dent em Batman Eternamente. O dueto com Susan Sarandon funciona muitíssimo bem, desde sua abordagem machista inicial até o desenvolvimento da trama e a apresentação de novas camadas no texto e interpretação.

    O filme acerta o tom na parte emocional envolvendo o elenco infantil. Outro fator bem encaixado é a tentativa falaciosa de deslegitimar as vítimas por parte da promotoria, com a tentativa de tirar a guarda do rapaz por conta do passado de dependente químico da mãe, além de abrir possibilidade para leituras mais profundas, uma vez que a catatonia do garoto Rick (David Speck) pode representar a letargia da sociedade diante de cenas de violência tão fortes como as que ocorrem no dia a dia das zonas urbanas pelo mundo.

    O último terço não é tão potente quanto o começo, o modo os fatos se desenrolam soam fantasiosos demais, e a fidelidade que o diretor tem ao retratar o texto base tem seu preço. Ainda assim, O Cliente causa furor, seja pelas atuações de Sarandon, Lee Jones e Renfiro ou pelo alto grau de tensão com que é conduzido.

  • Crítica | O Quarto de Jack

    Crítica | O Quarto de Jack

    O Quarto de Jack - poster

    Um ano após realizar Frank, obra metafórica sobre a criação artística, o diretor Lenny Abrahanson volta às telas em O Quarto de Jack, produção com maior apelo cinematográfico e com maior sensibilidade em sua narrativa. Baseada no romance de Emma Donoghue, a qual também assina o roteiro, a obra apresenta a delicada história de Joy e seu filme Jack, isolados em um quarto há sete anos, cativos de um homem conhecido como Velho Nick.

    O difícil tema do abuso sexual e psicológico vivido pelas personagens é narrado sob a ótica do garoto Jack ao recém completar cinco anos de idade. Local em que é concebido, o quarto, ao qual o título original se refere, representa o mundo palpável do garoto. A escolha de uma criança como ponto de vista narrativo faz parte de uma vertente literária que transforma a voz infantil em um observador diferente do usual, nem sempre capaz de compreender com profundidade os atos dos quais é testemunha. Obras como Pelos Olhos de Maisie, de Henry James, e Extremamente Alto e Incrivelmente Perto de Jonathan Safran Foer partem de premissas comuns a diversos romances mas reciclam seu contexto ao explorar a psicologia infantil dentro de situações-limite. Inserido neste contexto, o menino é como um personagem criado com lobos, vivendo uma visão à parte daquela narrada pela mãe e vista na televisão. Sob um espaço determinado e condicionado a uma situação desde que nasceu, o garoto observa a tudo com intensa novidade, mesmo que seja um observador limitado, como um representante de um mito da caverna.

    Mesmo sendo uma história ficcional, o enredo atinge o espectador pelo choque e se transforma em um símbolo que representa de maneira ampla, devido ao alcance do cinema, os casos anônimos de sequestro e cárcere privado. A escolha de adaptar um romance ficcional diante de histórias reais sobre casos de sequestro é favorável na exploração dramática do roteiro sem recorrer a liberdades artísticas para esconder nomes ou intensificar o relato. Ainda que não seja um testemunho, a veracidade da história se projeta em casos reais, como o de Jaycee Dugard, raptada aos onze anos de idade e encarcerada nos 18 anos seguintes em um local semelhante ao visto na produção. Autora do livro Vida Roubada, sobre seu longo período vivendo sobre o jugo de uma família, Dugard narra sem nenhuma projeção o drama vivido ano após ano em companhia de seu captor. Se literariamente a obra não transcende nenhuma barreira, é forte suficiente pelo intenso relato.

    A trama delimita bem o espaço-tempo em cena, desenvolvendo tanto a intensa agonia das personagens no cárcere, e a maneira pela qual mãe e filho se unem para viver um universo paralelo sob o peso da dor, como demonstrando quanto seria difícil um processo de adaptação de volta à sociedade. A narrativa é bem conduzida no limite entre um tema explosivo, de alto impacto, e a vertente dramática, ainda que em sua parte final o drama se estabeleça em um tom mais leve do que inicialmente. Em cena, Brie Larson se destaca centralizando a agonia dos anos aprisionada e a dor de uma personagem que perde a liberdade devido ao delito doentio de outra pessoa. À procura de verossimilhança para a interpretação, a atriz revelou que se condicionou em espaços fechados para compreender a sensação de aprisionamento de sua personagem. Sem recorrer a uso de maquiagens, aliado a uma fotografia pálida de Danny Cohen, O Quarto de Jack se transforma em uma cruel representação da realidade em um bom drama.

  • Crítica | Jurassic Park III

    Crítica | Jurassic Park III

    Jurassic_Park_III_Poster

    Dando sequência ao universo imaginado por Steven Spielberg a partir da obra de Michael Crichton, Jurassic Park III utiliza a grife estabelecida pelo diretor em uma trama inferior aos dois movimentos iniciais. Spielberg deixou a direção a cargo de John Johnston, o qual já havia demonstrado interesse em realizar O Mundo Perdido: Jurassic Park mas fora relegado a uma possível segunda sequência.

    Mesmo responsável por dois bons projetos familiares, Querida, Encolhi as Crianças e Jumanji, Johnston não possui a mesma capacidade técnica de seu mentor e, além das limitações artísticas, tinha em mãos um roteiro mal executado. A trama utiliza apenas algumas cenas das obras de Crichton e desenvolve um argumento inédito. Entretanto, os possíveis roteiros desagradaram a produção e, apenas cinco semanas antes do início das gravações, uma nova história foi desenvolvida. O curto espaço de tempo para a composição bem delineada de um roteiro deixa a impressão de que assistimos a um esboço inicial que precisaria de ajustes para ser eficiente.

    Jurassic Park – O Parque Dos Dinossauros e O Mundo Perdido fundamentavam e desenvolviam o universo que inseria dinossauros no mundo contemporâneo. Sem nenhuma novidade aparente, essa continuação retoma o personagem de Alan Grant (Sam Neil) – que não participa do acidente em San Diego – como um ponto forte para o público. O enredo parece fora de tom, sem a mesma visão estética e narrativa dos anteriores. Além de uma metragem enxuta, a necessidade explícita de novidades modificou os dinossauros mais conhecidos da franquia: velociraptor e T-Rex são deixados de lado para dar lugar a duas novas espécies: o gigantesco Spinossauro – cujo esqueleto substitui Rex até mesmo no pôster – e o voador Pteranodone (em tempo, os raptores ainda se destacam em parte da história mas, devido a estudos lançados na época, ganharam penas na cabeça, parecendo topetes irados que destoavam da concepção dos outros longas).

    O núcleo central de personagens, representados por uma família que vai até a ilha com auxílio de Grant para resgatar um filho desaparecido, não possui o carisma necessário e não transparece a urgência da perda. Sem nenhuma sintonia, William H. Macy e Tea Leoni são o elemento cômico da trama, tanto em momentos propositais como em situações involuntárias. Nem mesmo o apelo infantil do garoto desaparecido – o infante em perigo, recurso clássico das obras de Spielberg – é bem executado.

    O maior orçamento da trilogia não impediu que as cenas de ação parecessem simuladas em um cenário cenográfico. Os ataques de dinossauros aleatórios não produzem medo aparente e são ineficazes diante de uma trama irregular. A obrigatoriedade de inserir novas espécies leva as personagens a locais não explorados anteriormente, como uma travessia pelo mar somente como pretexto para a cena de ação com o dinossauro voador. Cenas episódicas que tentam pelo impacto esconder a trama sem emoção.

    A sensação de uma obra inacabada é ainda mais evidente quando a trama se encerra de maneira breve, sem um terceiro ato dramático. Um anti-clímax que parece finalizar antecipadamente a história por falta de tempo em desenvolver um roteiro adequado. Nem mesmo a cena final é inédita, se assemelhando ao final do primeiro filme, com os personagens saindo da ilha, com direito à música original de John Williams como lembrete ao público de que essa trama fez parte de uma trilogia. De qualquer maneira, ainda é uma cópia pálida que pouco lembra as divertidas e familiares aventuras anteriores.

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  • Crítica | Cake: Uma Razão Para Viver

    Crítica | Cake: Uma Razão Para Viver

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    Apontando a desistência da vida como mote para a mudança de postura, o filme de Daniel Barnz mostra um grupo de apoio mútuo formado por mulheres, em sua maioria depressivas, que sofrem dores intensas devido a doenças raras. Juntas, elas lamentam o suicídio de uma das integrantes mais novas, Nina (Anna Kendrick). O ato quase teatral é valorizado através das ações de uma desfigurada Jennifer Aniston, que abre mão de sua intensa beleza para interpretar Claire Simmons, uma mulher desesperançada, que guarda em sua face marcas e sinais de descuido próprio, que em suma representam as muitas feridas que ainda manifestam-se dentro de si.

    Assistida somente por sua serviçal Silvana (Azana Bezerra), Claire não tem qualquer alento em sua rotina. Mesmo os poucos sentimentos passionais a que tem direito são frutos do comércio, com visitas noturnas de um amante que sequer entra pela porta da frente. Do alto de seu desespero sentimental, a protagonista não aparenta dar muito valor à mulher que a ajuda, suprimindo até seus vícios ilícitos. O momento primário em que a heroína, falida e monotônica, demonstra qualquer reação destemperada é quando esta assiste à própria piscina. A despeito de seu ateísmo, a protagonista vê boiando a figura de Nina, trajada de maneira sensual, conversando com ela através do além-túmulo.

    Sem ter certeza se a aparição era fruto de um delírio após o uso das substâncias das quais lançava mão, Claire começa a se interessar pelo dia a dia de Nina, chegando a ponto de dar vazão à agressividade que já era anunciada anteriormente ao ameaçar a organizadora do grupo, pedindo os dados e o endereço da menina que viu. Na antiga casa da moça, ela encontra Roy, interpretado por Sam Worthington, o marido da falecida, o qual permite que a depressiva mulher dê vazão ao seu comportamento tresloucado.

    Toda a compreensão que Claire não achava nas forçadas reuniões, ela passa a achar nas interações com Roy, unidos pela dor, desespero e também por interesses sexuais – que, ao próprio entender destes, significam intenções escusas – de ambas as partes. Trabalhando a culpa pelos atos ainda não praticados, um vê no outro a chance de finalmente se reabilitar, trabalhando os traumas de uma forma que, em algum dia, ambos possam finalmente dar prosseguimento a sua existência.

    O que se vê na segunda metade do filme é uma jornada de combate ao medo, onde a confiança de ambos é posta à prova, envolvendo os seres que dependem deles, como o filho de Nina e Roy, o pequeno Casey  (Evan O’Toole). É bastante curioso observar o quão tacanho é o flerte entre ambos e o quão pesado é o modo de lidar com seus fantasmas. Quando está começando a mostrar alguma melhora, Claire tem um terrível encontro com a figura de Leonard (William H. Macy), que seria o catalisador de sua angústia existencial. O dramático reencontro faz a protagonista ter uma recaída nos seus antigos erros.

    As “visitas” de Nina seguem crescentes, manifestando, entre outros sentimentos, a vontade de suicídio, além do profundo remorso por estar roubando da defunta a possibilidade de uma boa vida, sentimentalmente plena, apesar das dores. O desespero aumenta de tal forma que os espíritos, da delirante mulher e da personagem espectral, quase se encontram.

    A trajetória vista no roteiro de Patrick Tobin é de total reconstrução, de moral e autoestima através de ações espontâneas. Um panorama que não demonstra compadecimento de suas personagens, tampouco aplaca ou suaviza a mensagem para o espectador, ainda que todo o conteúdo se baseie em conceitos do senso comum. O mérito maior certamente está na atuação de Jennifer Aniston, ainda que não seja algo tão digno de nota quanto foi alardeado, especialmente pela proximidade de outra obra em que se destaca o desempenho de Juliane Moore, em Para Sempre Alice. Em Cake – Uma Razão Para Viver, sobressai uma atuação de sua maior estrela  conduzida na monotonia de um espírito único, sem liberdade para nuances.

  • Crítica | Fargo

    Crítica | Fargo

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    Faz tempo que tenho a mania de ver as filmografias de grandes diretorias na ordem, e recentemente quis ver a de Joel e Ethan Coen. Porém, com eles resolvi começar pelo meio. O que me fez pular a ordem cronológica de filmes dos irmãos Coen e começar por Fargo foi ter lido que eles colocam um aviso no início dizendo que a história foi baseada em um acontecimento real, quando na verdade não foi. Desde quando li isso, já fiquei intrigado, pois adoro subversões desse tipo, sem compromisso nenhum com a realidade. No entanto, apesar de não ter esse compromisso com a nossa realidade, Fargo tem compromisso com sua própria realidade, como todo grande filme deve ter. E, nesse aspecto, entrega tudo o que promete.

    O eixo da história deve ser familiar a todos. William H. Macy interpreta Jerry Lundegaard, um pai de família desesperado para arrumar dinheiro, pois estaria com problemas financeiros (o que se desenrolará em outra história posteriormente). Então, contrata dois bandidos, Grimsrud (Peter Stormare) e Showalter (Steve Buscemi) para sequestrarem sua mulher e assim dividirem o dinheiro do resgate, que seria pago pelo sogro rico e extremamente crítico em relação a Jerry. No entanto, uma sucessão de pequenos acontecimentos vai mudando a história, que vai aumentando e tomando proporções muito maiores do que as planejadas por Jerry, pois, na fuga, os bandidos matam três pessoas na estrada, sendo um policial e dois viajantes que deram azar de estarem ali naquela hora.

    Os assassinatos acontecem na pequena cidade do interior, no norte dos EUA, onde a policial Marge Gunderson (Frances McDormand) é encarregada de investigar o crime, mesmo estando grávida de sete meses. E é quando Marge entra na história que tudo passa a ficar ainda mais intrigante e emocionante. Sem deixar de passar a delicadeza e bondade de uma mulher do interior, Marge passa a firmeza, inteligência e obstinação de uma policial normal, não dos filmes americanos tradicionais, para resolver um crime baseando-se apenas na investigação.

    Conseguimos também ver os detalhes menores, que geralmente não vemos, quando Marge viaja de uma cidade a outra e chega a um hotel, telefonando para a polícia local avisando que chegou, quando estamos habituados a ver simplesmente policiais se teletransportando e estando em cidades diferentes em intervalos de minutos.

    Marge segue os passos dos bandidos e chega até a concessionária de carros administrada por Jerry, que logo começa a dar sinais claros de preocupação. Com uma investigação simples, calma e baseada apenas em instinto e interpretação, Marge vai, cada vez mais, se fortalecendo no filme, mesmo transbordando fragilidade com sua imensa barriga de grávida, o que nos deixa apreensivos em relação ao encontro dela com os sequestradores, que mostram várias vezes seu grau de violência no filme, principalmente no terceiro ato, cuja simplicidade da resolução nos deixa satisfeitos justamente pelo realismo da cena.

    Outro ponto positivo é a paisagem branca da neve do norte dos EUA, cobrindo estradas, ruas e casas. Funciona quase como um personagem à parte ao contrastar a homogeneidade e a paz do branco com o sangue derramado pela violência dos bandidos. No entanto, o forte mesmo do filme está nos diálogos, que emulam os sotaques do interior dos EUA, com palavreado local e frases feitas, dando o toque de humor negro, característico dos Coen, a cenas com potencial dramático intenso. Dessa forma, o principal mérito em seus filmes geralmente é a forma como eles a contam, e não a história em si, por mais que a história seja boa.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.

  • Crítica | As Sessões

    Crítica | As Sessões

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    Nos caminhos que nos levam ao autoconhecimento, a percepção de si em completude à concepção sexual são dois dentre diversos elementos significativos para esta jornada. Mesmo que muitos vejam a sexualidade como um sistema biológico ou um elemento instintivo, o sexo também é reconhecimento e consciência corporal, tanto da observação dos limites físicos do corpo como da percepção do prazer.

    Baseado na vida profissional de Cheryl Cohan Greene, As Sessões apresenta ao público a terapia sexual, uma vertente que trabalha ativamente com o paciente, de maneira breve e focal, para a melhora de disfunções ou qualquer problema referente ao sexo, esse elemento vital ainda hoje visto como tabu.

    A história apresenta um dos pacientes mais significativos da terapeuta: Mark O’Brien, poeta e jornalista de Berkeley que, devido a uma poliomelite na infância, sobrevive graças a um pulmão artificial, mas incapaz de mover seus músculos, ainda que os sinta. Motivado pelo pastor de sua paróquia, O’Brien procura ajuda terapêutica para tentar compreender, dentro de um corpo paralisado, a funcionalidade do sexo.

    A composição de John Hawkes para viver a personagem é equilibrada. Dividida entre o corpo inerte e uma criação católica que também se torna responsável pelo complexo sexual. Utilizar um personagem central deficiente não é argumento novo. Em Meu Pé Esquerdo, Daniel Day Lewis interpreta brilhantemente Christy Brown, e Sean Penn demonstra uma competente atuação em Uma Lição de Amor. Mesmo que tais comparações de outras produções seja inevitável, o poeta é, acima de tudo, um homem comum, divido entre os anseios de conhecer aquilo que ainda lhe é assustador.

    Nos encontros terapêuticos com Cheryl, interpretada por Helen Hunt, a personagem realiza uma jornada lenta de autoconhecimento, compreendendo que no sexo não só o corpo é funcional, mas também a extensão mental. O laço entre terapeuta e paciente é um dos elementos motivadores da trama. Evidenciando que o processo terapêutico é delicado e, para ser funcional, necessita-se de entrega de ambas as partes.

    Indicada ao Oscar por sua atuação, Hunt não compõe uma personagem carismática como O’Brien. Seu comprometimento com sua atuação vale-se mais da maneira natural com que se despe literalmente em diversas cenas de nudez. Sob este ponto, o roteiro escrito por Ben Lewin está distante de qualquer ideia julgadora. Expõe ao público uma vertente da terapia, com a esperança de que a história mostrada na tela produza a reflexão no espectador, evitando julgamentos precipitados sobre a terapia sexual.

    Mesmo que a composição dramática e a relação entre paciente e terapeuta pudessem ser melhor executadas, a história deixa uma reflexão pontual para o público. Através da vida de O’Brien projetamos também o que compreendemos sobre o sexo e as limitações como indivíduo, muito além de uma deficiência ou de um impulso sexual.

    O filme adapta um dos casos do livro homônimo lançado no país pela Editora Intrínseca que acompanha a vida de Sharon desde o início de sua carreira como terapeuta sexual, até os dias de hoje dando palestras e tentando, sem polêmica, explicar porque teve mais de 900 parceiros sexuais e que esse alto numero não significa nenhum elemento pejorativo sobre si própria.