Crítica | As Névoas do Terror
A produção de 1965, dirigida por James Hill, começa em tom folhetinesco, com o assassinato de uma messalina, utilizando um enfoque bastante sensacionalista, unindo dois dos maiores ícones britânicos em um só universo ambiente. A vida burlesca da grande metrópole é mostrada como em um grande pastiche, em uma visão debochada da faceta marginal em plena Era Vitoriana.
A cena do segundo assassinato varia em dois ângulos – a moça é jogada em uma bacia cheia de água, e de cima o estripador toscamente esfaqueia a vítima, num plano muito mal enquadrado; mas de outro ângulo, vê-se nos olhos da martirizada mulher a arma branca invadindo a água, e, para o seu terror, o sangue subindo, numa belíssima tentativa de imergir o público, pondo-o no lugar de sofrimento da assassinada.
John Neville faz um Sherlock esguio, como nos desenhos de Sidney Paget, exceto pelo penteado sem entradas de calvície. Vivaz, ativo, praticamente irreconhecível quando disfarçado, diferente de sua contraparte nas películas do final dos anos 30, se diferenciando de Basil Rathbone em qualidade, claro, livre das amarras temporais do intérprete anterior.
A caça aos libertinos passa a ser prioridade para alguns da comunidade, ao contrário da captura do vil assassino – a crítica à hipocrisia desta sociedade não é velada, ao contrário da larga utilização dos serviços das mulheres pouco respeitáveis por parte de senhores da alta classe.
A câmera usada como os olhos do monstro/assassino, 10 anos antes de Tubarão de Steven Spileberg, registra o modus operandi de uma das profissionais do sexo, além de mostrar o fim inevitável que sua vida de pecados lhe causou. Os zoom outs que contemplam a arma do crime e a trilha sonora histriônica causam no espectador um misto de temor e impaciência em descobrir quem está por trás dos temíveis e atrozes crimes de Jack, O Estripador.
O desfecho é mais do que satisfatório, misterioso até o fim. A hipótese da película de James Hill é a de que, se Sherlock habitasse o mesmo mundo de Jack Estripador, sua identidade não seria incógnita por tanto tempo. O espectador não é subestimado, e o roteiro de Derick Ford é muitíssimo bem construído, fazendo do paupérrimo orçamento algo irrelevante diante dessa história tão bem urdida.