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  • Crítica | O Filme Da Minha Vida

    Crítica | O Filme Da Minha Vida

    Terceiro longa dirigido por  Selton Mello, O Filme da Minha Vida é uma adaptação do livro Um Pai de Cinema, de Antonio Skarmeta, e remonta as décadas passadas, se situando entre os anos sessenta e setenta, contando a história de Tony Terranova, vivido por um Johnny Massaro, que tenta a todo custo emular as características de Louis Garrell. O lugar escolhido para contar sua história é Remanso, na Serra Gaúcha, e as planícies sulistas ajudam estabelecer uma atmosfera introspectiva semelhante a alguns filmes italianos recentes.

    A narração em off corre o filme quase inteiro, e ajuda a estabelecer todo o ideário de Tony. É nela que se percebe a proximidade emocional que ele tem com seu pai, Nicolas, vivido por Vincent Cassell. Quando garoto, os parentes eram extremamente próximos, e na vida adulta, após voltar dos estudos que fez, ele percebe a partida de seu pai para seu país de origem, deixando o jovem sem o principal referencial masculino em sua vida, usando assim a presença de Pablo (Mello), um grande e antigo amigo de sua família, que por sua vez, também carrega alguns segredos obscuros.

    Tony é obcecado por uma dupla de irmãs, Luna (Bruna Linzmayer) e Petra (Bia Arantes). Cada uma delas possui uma beleza diferente mesmo que sejam cativantes ao seu modo, ainda que com uma profundidade limitada em seus papéis. Além disso, um dos destaques significantes dentro desse núcleo familiar é o papel do irmão mais das irmãs, Augusto, vivido por João Pedro Prates.

    A questão primordial do longa é que ele se baseia em uma ponto-chave dramático e polêmico. Há uma exploração bastante novelesca, lembrando demais os folhetins antigos publicados em papéis preto e branco e de qualidade duvidosa. A tentativa de valorizar o drama com uma bela fotografia não consegue esconder a falta de um desenvolvimento mínimo por parte dos personagens periféricos, especialmente por parte de Pablo, interpretado pelo diretor, que parece estar lá basicamente para desenvolver mais um sotaque genérico e apresentar uma boa forma física. Por sinal, os embates de Tony com essa figura quase paterna incluem uma cena de embate bastante risível, dado a sequência de enquadramentos bastante confusa.

    As explicações ligadas ao abandono de Nicolas a sua família não fazem qualquer sentido e não há qualquer esforço do argumento em tentar justificar isso. Apesar de conter em si muitas semelhanças com O Palhaço e em menor grau com Feliz Natal, O Filme da Minha Vida não consegue repetir o mesmo êxito de suas obras anteriores.

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  • Crítica | A Frente Fria que a Chuva Traz

    Crítica | A Frente Fria que a Chuva Traz

    A Frente Fria q a Chuva Traz 1

    Evocando símbolos típicos do Rio de Janeiro, a começar pelo cartão postal do Cristo Redentor, passando pelas montanhas onde se fixam as favelas, A Frente Fria que a Chuva Traz começa com um medley musical, que tem seu ápice no hit Sou Foda dos Avassaladores. Quase completando um jubileu de carreira, e após longos anos sem executar longas, Neville de Almeida renova sua filmografia referenciando seu clássico Rio Babilônia e adaptando a obra teatral de Mario Bortolotto, trazendo para seu filme uma atualidade quase inesperada.

    O cenário principal é o Morro do Vidigal, palco de um teatro fútil e patético de garotos e garotas que não precisam trabalhar ou se esforçar para viver. Um grupo de indivíduos da classe média alta usa o dinheiro de seus pais para alugar uma laje na favela, sem em momento algum permitir que a cultura dos moradores comuns adentre o seu cotidiano, apesar de consumirem enlatados de suas músicas, além de lançarem mão dos serviços de alguns dos moradores, pagando doses cavalares de dinheiro basicamente para humilhá-los sem qualquer preocupação.

    O texto de Bortolotto – que inclusive tem um papel de coadjuvante, como o segurança entediado e depressivo cuja função é evitar que nenhum morador suba a laje – lembra em partes a obra literária de Breaton Easton Ellis, primeiro pelo caráter anti-burguês e também por explorar, através de diálogos francos e rasgados, o modo de vida junkie e yuppie, ainda que estas versões sejam uma versão paródica do explorado em The Canyons, Abaixo de Zero e Informers, dada a falsidade dos meninos e meninas que dançam semi-nus na sacada.

    Um dos pontos altos do filme são os diálogos escrachados sobre sexo, colidindo curiosamente com a nudez pouco explorada no filme, onde o diretor simplesmente abre mão de uma de suas marcas, que é o erotismo explícito e exploração do sexo visceral e não sugerido como neste. A pornografia ainda está presente, primeiro nas falas aproveitadoras dos dois garotos inseguros quanto a sua sexualidade: Espeto (Chay Suede) e Alisson (Johnny Massaro) se valem das drogas para esse fim; e, especialmente, a viciada sem dinheiro Amsterdã, que conta com a inspiração de sua intérprete Bruna Linzmeyer.

    O argumento não trata de assuntos fáceis, a despeito dos clichês apresentados. O trato sobre o desdém com os pobres rivaliza em importância com a luxúria pouco expositiva em momentos chave filmadas ao longe, além de outros eventos fortes e completamente desglamourizados. Ambos os aspectos são triviais perto da crise existencial dos únicos personagens que vivem a vida real, e que permitem não se sentir anestesiados pela alienação dos enriquecidos, mesmo quando entorpecidos pelas drogas, ainda que usem as substâncias livremente.

    O roteiro de Almeida, Bortolotto e Marcelo Melamed (o qual uma aparição hilária que gera uma nova gama de discussões na trama) trata do niilismo como uma reação natural ao capitalismo exacerbado, aludindo ao exploitation de corpos perfeitos, segundo a métrica padrão, além de desconstruir a nova burguesia brasileira, que se apropria de outras culturas sem qualquer pudor.

    Mesmo quando surgem momentos de epifania, o texto não se rende a gratuitas redenções morais, seja com o sexualmente confuso Alisson ou a carente e desesperada Amsterdã, que tem em seu nome o resumo de sua loucura e vazio existencial, apesar de ter conteúdo superável a todo o repertório de seus “colegas”. Seu grito, perto do fim, é formado por uma sinceridade que não se vê em todo o escracho da curta duração do filme, denunciando um mundo habitado por gente falsa e mostrando a fácil transição entre o discurso ideológico e a amoralidade que este A Frente Fria que a Chuva Traz consegue transmitir.

    A obra não apela para coitadismos ou irrealidades, mostrando que, mesmo tendo a verdade denunciada nos rostos dos jovens, não há evolução se não houver tentativa de saída da letargia. A visceralidade é o pico de qualidade do filme de Almeida, que acerta em praticamente todos os pontos propostos, mostrando uma grata renovação do cineasta.