Crítica | O Peso do Silêncio
Obra de Joshua Oppenheimer, O Peso do Silêncio é um documentário sobre uma família destruída pela violência na Indonésia, graças a repressão da Ditadura Militar e da automática associação de opositores ao comunismo. A esteira do longa evidentemente faz lembrar o filme anterior do diretor, O Ato de Matar. Além de ter sido captado ao mesmo tempo, contendo cenas igualmente fortes, a trama narra os fatos através das vozes dos que sofreram o mal agouro, dos vitimados do mesmo núcleo familiar.
A carga de humor sarcástico é utilizada para desconstruir a paranoia típica da Guerra Fria usada para justificar os mesmo abusos à população que ocorreram também no Brasil, ainda que em registros de mortes, os indonésios tenham números muito mais assustadores que os brasileiros. Usa-se um tempo demasiado focando em crianças tendo aulas, para grafar na mente do público o quão nefasto e digno de repúdio foi esse período no país, afetando-o até a atualidade em muitos de detalhes governamentais do atual presidente Joko Iododo.
Os detalhes das torturas são encenadas por homens despreocupados, com um estilo parecido com o antigo documentário proibido no país Brasil: Um Relato de Tortura, ainda que o espírito seja o completo inverso, já que não há pesar ou trauma da parte de quem reinventa esses passos. Os olhos de Adi, um oculista e principal depoente do longa (que teve seu irmão vitimado) é de completo desprezo por quem quer que compartilhe dos ideais da época, especialmente dos que falam abertamente sobre o Regime como uma época gloriosa.
Sua abordagem é a de receber os homens que praticaram os atos de guerra com a desculpa de realizar exames de vistas, para, enfim, confrontar os demônios do passado. A reação dos entrevistados transita da vergonha ao contínuo desprezo pelo esquerdismo, achando-se ainda donos da certeza e razão, como defensores de uma pátria que tem na moral o seu norte.
A escolha da tradução brasileira não poderia ser mais simbólica (No original, The Look Of Silence, O Olhar de Silêncio), pois todo o conteúdo de discussão deste documentário acontece sobre a desfaçatez de quem impingiu mal e foi incapaz de assumir seus erros e perceber a quantidade enorme de injustiças ocorridas devido a um viés ideológico extremamente opressor, cujas consequências prosseguem ainda atuais e enérgicas. Sobra sentimentalismo no documentário, mais uma vez ultrapassando a barreira de mero exercício documental, para também tocar seu público, em um experimento bem sucedido em essência.