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  • Crítica | Curumim

    Crítica | Curumim

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    O caso do condenado Marco Archer, conhecido como Curumim causou polêmica e comoção nos idos de 2014 e 2015, quando estava marcado a sua execução, sob alegação de tráfico de drogas em território estrangeiro, no país da Indonésia. O trabalho do diretor Marcos Prado foi o de resgatar a intimidade do homem, em um esforço pedido pelo mesmo para através de um longa documental, ter mais um argumento para apelar junto a ONU por sua liberdade.

    Prado tem uma carreira prolífica, tendo dirigido o ficcional Paraísos Artificiais, que de certa forma retrata a mesma juventude do qual Archer fazia parte, bem como produziu Ônibus 174 e Os Carvoeiros, que já registram uma outra face tanto da criminalidade como de outra faixa social. Marco não era uma ‘vítima da sociedade’, tinha dinheiro e sua história decadente é regada de muitas festas, drogas e esportes radicais, no entanto, as características negativas esbarram na personalidade doce e carente do personagem biografado.

    Em meio aos seus 102 minutos de duração a uma discussão não panfletária sobre política externa, pena de morte e tráfico internacional, tudo feito de maneira fluída e envolvente. A persona farsesca de Archer é querida por todos que o cercam, inclusive pelo diretor, ao menos aparentemente. As cenas são quase todas retiradas de arquivos de vídeos ou gravadas pelo próprio Marco, que recebe do diretor uma câmera para demonstrar sua identidade.

    A compilação e vídeos soa naturalista, uma vez que o personagem não tem qualquer técnica para se enquadrar da melhor forma. As cenas de intimidade dele mostram ele em posições constrangedoras, com ângulos que mostram até sua falta de dentes. A entrega dele é completa e o intuito de comover ao menos a plateia é alcançado.

    As partes em que se entrevista o padre Charles Burrows são interessantes, por denunciarem a tortura pelo qual passou o homem condenado. Ao saber que estava sentenciado ao óbito, Marco sentiu uma vontade imediata de ter seu fim, inclusive implorando para finalmente ser executado, pedido que lhe foi negado, e só consumido após mais de dez anos. É na fala de Burrows que ocorre também a descrição da morte dos sentenciados, que levam um tiro e esperam entre sete e oito minutos para finalmente falecer, agonizando então. Lembrando que no país a tortura é crime, é notável que isso ocorra.

    A escolha por falar da causa da prisão somente após muito elucubrar a respeito das boas características de Curumim é uma estratégia oportunista, mas não desonesta. As possíveis falácias são dribladas a maestria e o filme apresenta um bom argumento de defesa para o personagem, em especial por expor a extrema hipocrisia do governo indonésio, que prega a luta contra as drogas mas permite o livre comercio dentro das cadeias de todo tipo de entorpecentes, além de ser muito menos rígido com assassinatos e crimes terroristas. O longa serve de contraponto e de denúncia o governo de Joko Widodo, desconstruindo qualquer maniqueísmo exacerbado e atacando os crimes de tortura empregados a Archer e outros prisioneiros, pondo em cheque a pecha de vilania e por isso, soa muito mais profundo do que a premissa aparenta.

  • Crítica | Paraísos Artificiais

    Crítica | Paraísos Artificiais

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    Paraísos Artificiais é uma reflexão acerca de escolhas, e por consequente, consequências. Marcos Prado, diretor e roteirista, além de produtor dos filmes de José Padilha (Tropa de Elite), trabalha com a ideia de uma juventude desvirtuada e/ou incomum. Sexo. Drogas.

    O fato do longa ser conduzido de forma leve, não afeta a intensidade da trama. Esta que, basicamente, entrelaça as histórias de Erika (Nathalia Dill), Lara (Lívia de Bueno), e Nando (Luca Bianchi).

    Erika, DJ que luta por um espaço no cenário da música eletrônica, vive uma relação de amor e amizade intensa com Lara. Adeptas das drogas e das polêmicas raves, cruzam com Nando e Patrick (Bernardo Melo Barreto) em uma festa paradisíaca que dura dias a fio, onde em suma preferem viver estados alucinógenos inconsequentes, ou melhor dizendo – Paraísos Artificiais.

    Prado, não faz da produção uma crítica social às drogas, e faz uso delas como intensificadoras de emoções, sejam elas boas ou ruins. Há sequências em que é impossível não ceder a viagem psicotrópica acompanhada da marcante trilha sonora de Rodrigo Coelho. Isso tudo, aliadado à direção de fotografia de Lula Carvalho (Tropa de Elite 2), que é inegavelmente  magistral em seus planos com ótima iluminação.

    Anos após a festa, Nando reencontra Erika em Amsterdã. Já estabelecida como DJ e com um filho, só ela lembra em que circunstâncias os dois realmente se conheceram, e o que resultou daquilo tudo. A despeito disso, acabam se envolvendo novamente.

    As atuações são excelentes. É incrível como os atores realmente se entregaram aos personagens – inclusive em cenas eróticas, extremamente presentes no filme, mas que são tratadas sob um ponto de vista sedutor, prazeroso, e envolvente. É essencial citar também a montagem do longa, que mesmo trabalhando com duas linhas do tempo juntas, flui de maneira a não deixar quem assiste perdido. Esse formato de construção é quase como um jogo de perguntas e respostas, onde a dúvida que surge em uma linha é respondida em seguida pela outra.

    O debut (ficção) magnífico mostra o que hoje é realidade para muitos jovens. Mostra o quão cíclico esse tipo de pensamento que não tem medo do futuro pode ser. Mostra sim, que Paraísos Artificiais, apesar de intensos, são literalmente – artificiais. Um bom drama definitivamente; que foge de ser um outro entre tantos filmes com a temática droga – é mais sobre, culpa, ódio, amizade, e arrependimentos.

    Texto de autoria de Matheus Porto.