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  • Review | Meu Amigo Bussunda

    Review | Meu Amigo Bussunda

    Meu Amigo Bussunda é uma série de quatro capítulos idealizados e dirigido por Cláudio Manoel, que ainda divide a parceria na direção com Micael Langer, e no último dos quatro capítulos, por Júlia Besserman, filha do humorista conhecido como Bussunda. O especial possui uma atmosfera alegre, criativa, super colorida e sacana, como era o humor e a identidade civil de Cláudio Besserman, o Bussunda, e tenta se equilibrar entre a memória afetiva, as polêmicas da carreira e a fatalidade de sua morte precoce com 43 anos.

    Manoel divide seu estudo em quatro partes, Fama de Famoso de 1962 a 1989Ih, ó o cara aí de 89-98, Fala sério 1998-06, dirigidos por ele e Langer, e claro, Meu Pai Bussunda, cujo tom é bem diferente graças a direção da filha Júlia. O início do filme brinca com os gostos da personagem-título, embalada por Rock and Roll, mostrando pessoas do passado do humorista. Cláudio Manoel diz ser colega de escola do gordinho, cabeludo e dentuço que se tornaria Bussunda, desde a época em que ele era magro e orelhudo, fato que o fez ser apelidado como Topo Gigio, uma personagem infantil dos anos 80 bastante popular.

    O seriado captura bem a alma brincalhona de Bussunda, e não ignora o passado de sua família, a formação política do humorista e a influência de intelectuais comunistas do Partidão (PCB) em seus pensamentos e na influência de seu caráter. Filhos de judeus, Bussunda era o filho “sem futuro”, o “temporão”, seus pais pensavam que ele passaria fome, tanto que pediram aos irmãos para cuidar dele, caso eles morressem. Manoel entrevista a família e consegue preciosidades, pérolas do passado e ajuda a montar o quebra cabeça do homem engraçado que fazia piada consigo mesmo desde cedo, fruto do fato de ser filho de uma psicanalista, o que influenciou obviamente em toda a percepção de mundo que tinha.

    A narração de Claudio é um pouco invasiva, em alguns momentos é até boba, séria e sisuda demais, especialmente para quem conhece ele e seus personagens. Um diretor tão especializado em documentário deveria se atentar mais para isso, já que dirigiu (ou co-dirigiu) Simonal: Ninguém Sabe o Duro que Dei, Tá Rindo de Quê?, Rindo à Toa: Humor Sem Limites. Ainda assim, o conteúdo das conversas ajudam a desvendar quem era Bussunda, passando detalhadamente pela formação teatral e universitária.

    Há um bom detalhamento do ponto de vista político do personagem, das brincadeiras que ele fazia com a UNE na época  que estudava comunicação e na completa falta de ambição que tinha. É tratado como um Bon Vivant desleixado com a imagem, mas extremamente mordaz e inteligente. Claramente o documentarista tem receio em falar de política, não só por conta da polarização política atual, mas também pelo caráter meio “chapa branca” dos documentários da Globoplay. Se isso ocorre com produtos sobre políticos, imagina sobre uma celebridade dita “neutra”. Ao invés de tomar lado, prefere mostrar bastidores, sobre a união dos jornais Planeta Diário e Casseta Popular, nos ingressos destes na televisão e nos shows da noite carioca, além da luta para emplacar um projeto após trabalharem na redação da TV Pirata.

    Em determinado ponto a série passa a ser um documentário mais sobre o Casseta e Planeta e suas diversas fases. Isso seria perdoável caso ao menos se abordasse um pouco sobre o declínio do grupo pós-partida do companheiro finado. O episódio ao falar da morte em si é um acerto, é emotivo, traz muita coisa inédita, resgata sensações fortes. Já o restante, acaba soando repetitivo. É fato que a TV Pirata e o próprio Casseta tinham um lugar especial no humor da televisão aberta, e quebravam um estilo já consolidado, mas isso tudo já foi muito discutido, aparentemente Manoel quis se permitir valorizar seu legado, deixando de lado a intenção de homenagear o amigo e companheiro de longa data.

    Em Meu Pai Bussunda, Julia busca entender quem foi seu pai, como foi sua carreira, visto que quando ele se foi, ela tinha apenas doze anos, e não tinha tantas memórias e percepções de como era o humor dele e do resto da trupe. O tom aqui é completamente diferente, emocional e visualmente mais interessante. O conteúdo reflete sobre o tipo de humor que do personagem e não cai no pecado de ser condescendente. Há críticas a ele, mas também ao humor atual, com falas de vários humoristas envolvendo temas e visões díspares.

    Meu Amigo Bussunda tem dois tipos de abordagens diferentes, e isso faz com que o caráter dele não seja tão fácil de definir. Ainda assim, é um bom resgate de alguém que fez e faz  parte da história do humor, da comunicação e da televisão brasileira.

    https://www.youtube.com/watch?v=WScB05qBz7o

  • Crítica | Simonal: Ninguém Sabe o Duro que Dei

    Crítica | Simonal: Ninguém Sabe o Duro que Dei

    Assistir Simonal: Ninguém Sabe o Duro que Dei hoje provoca no espectador uma sensação estranha, seja pelo seu formato que não condizia com sua época, 2008 – que aliás influenciaria o estilo da atual cena documental brasileira especialmente no quesito edição, ou por seu  tempero de teoria da conspiração, esse sim condizente com o fim dos anos 2000. O longa-metragem busca redimir a figura de Wilson Simonal, um dos maiores cantores brasileiros da história, acusado de ser informante durante à Ditadura Militar, sendo depois apagado da história que ajudou a construir dentro da música popular brasileira.

    Cláudio Manoel e seus codiretores Calvito Leal e Micael Langer cravam bem a identidade do cantor, os depoimentos de Chico Anysio, Tony Tornado, Luís Carlos Mielle, Sergio Cabral Pai, Nélson Motta, os filhos Simoninha e Max Castro, e até membros do Pasquim como Jaguar e Ziraldo ajudam a montar quem ele era e o peso que  tinha sobre a música.

    O documentário passa bem pelos momentos históricos da vida de Simonal, como o show do Maracanãzinho e a polêmica sobre o número de pessoas que estavam  na abertura do premiado Sergio Mendes, um fala que tinham 30, outro 40, um terceiro afirma que eram 50 mil, essa sacada aliás é muito boa, pois se torna um comentário metalinguístico, de que cada fala sobre o cantor sofre com memória afetiva. Simonal foi grandioso, dominador de multidões e maestro do povo, até de forma literal. Inebriante, sedutor, provocador e marrento, a pilantragem não morava só na música e estilo, mas também no seu estilo de vida.

    O filme não convence no que diz respeito a sua participação como informante do regime. O filme não consegue estabelecer sua culpa, nem que foi manipulado, muito menos ajuda a fomentar a teoria de que ele era só um sujeito ingênuo e impulsivo. Na época de seu lançamento, essa foi a principal crítica a esse respeito, talvez a recepção de público e crítica hoje fosse diferente, afinal boa parte da opinião geral a respeito de documentários não passa necessariamente pelo convencimento que as obras produzem, e sim pela gama de assuntos que suscita, e nesse ponto, o filme é riquíssimo e dá voz a um personagem fantástico de nossa história e identidade nacional.

    A cena de Simonal cantando, já idoso, magro, com rosto fino e debilitado era o retrato da decadência de um país mal resolvido. Sendo informante ou não, Simonal não foi anistiado, enquanto membros do próprio regime, inclusive torturadores, convivem normalmente sem qualquer peso pelo que fizeram ou deixaram de fazer, enquanto Simonal foi apagado de nossa história. Um registro belo e necessário.