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  • Crítica | A Era do Gelo: O Big Bang

    Crítica | A Era do Gelo: O Big Bang

    Quatorze anos após o primeiro filme da série A Era do Gelo, a diversão proporcionada por Manny (Ray Romano), Diego (Denis Leary), Sid (John Leguizamo), e claro, Scrat (Chris Wedge), parece pertencer a um passado muito distante, e isso se torna ainda mais evidente com o quinto filme da franquia, O Big Bang (no original, Collision Course). Não que no passado a série fosse um primor, mas cumpria bem a função de divertir por meio de um roteiro coerente, personagens carismáticos e boas piadas, mas como disse, isso parece pertencer a um passado distante.

    Com a saída do diretor Carlos Saldanha (Rio 2), a perda de qualidade se tornou ainda mais evidente. Ainda assim, A Era do Gelo 4 teve uma ótima bilheteria e um quinto filme seria inevitável, o difícil de imaginar era a completa falta de cuidado neste A Era do Gelo: O Big Bang. Se com o filme anterior ficou mais do que evidente o desgaste geral da fórmula, o filme mais recente vai além e nos faz sentir saudade do quarto filme, visto a qualidade do longa ainda que comparado junto aos seus pares.

    Na trama, novamente temos o envolvimento do esquilo (ou cronopio, se preferirem) Scrat em busca de sua preciosa noz: a procura de encontrar um lugar perfeito para guardar sua noz acaba encontrando uma nave espacial congelada (um pequeno easter egg ao primeiro filme), e involuntariamente, acaba acionando os controles da nave e decolando rumo ao sistema solar. Nesta jornada, acaba provocando um acidente espacial e colocando um enorme meteoro em rota de colisão com a Terra, o que nos leva a pensar qual a razão de uma tradução péssima como essa, já que não estamos falando do nascimento do universo, o Big Bang – o que convenhamos faria ainda menos sentido na trama – mas da destruição completa do Planeta Terra. Aparentemente, nossos tradutores têm dificuldades de entendimento, de modo bastante simplista, a teoria do desenvolvimento inicial do universo e a própria trama da animação, já que estas não possuem qualquer ligação lógica. Enfim…

    Em decorrência da iminente destruição de seus lares, Manny e cia. contarão com o retorno de Buck (Simon Pegg), a doninha caolha e maluca de A Era do Gelo 3, e ainda precisarão arrumar tempo para cuidar dos seus problemas pessoais, como a saída de Amora da casa de Manny e Ellie (Queen Latifah), por conta de seu namoro com Julian (Adam DeVine); enquanto Diego e Shira (Jennifer Lopez) pensam em ter um filho; ao passo que Sid tem de lidar com problemas amorosos envolvendo uma nova personagem.

    O roteiro tenta cativar os mais velhos, trazendo diversas referências à cultura em geral, como a aparição de Neil deGrasse Tyson em uma alusão à série Cosmos, além de outros momentos que remetem a filmes de ficção científica mais recentes como Perdido em Marte, Gravidade e Prometheus, e o clássico Alien, o Oitavo Passageiro. Além disso, os temas secundários tentam trazer o espectador adulto para a trama, no entanto, todas elas são mal elaborados e a tentativa soa frustrada, principalmente pelo roteiro não conseguir amarrar adequadamente todas essas pontas à trama principal. Quanto ao público infantil, este é terrivelmente subestimado, abusando do didatismo para aquilo que já é bastante óbvio.

    Os pontos fortes ficam por alguns bons lampejos no trabalho de direção da dupla Mike Thurmeier e Galen T. Chu, como ocorre na cena musical de Buck cantando uma versão adaptada de um trecho da ópera O Barbeiro de Sevilha, de Gioachino Rossini (lembra do episódio do Pica-Pau?). A direção de fotografia se mostra bastante competente, utilizando uma imensa gama de tonalidades e um belo trabalho de luz e sombra, não só dos cenáriosna Terra, como também na história de Scrat no espaço.

    A Era do Gelo: O Big Bang mostra cansaço e falta de fôlego, mas é difícil crer que este será o último longa metragem da franquia nos cinemas. Infelizmente, o meteoro não cumpriu o seu objetivo e nos salvou de outras continuações.

  • Review | Cosmos: Odisseia no Espaço

    Review | Cosmos: Odisseia no Espaço

    cosmos-a-space-time-odysseyCarl Sagan e seu programa de TV dos anos 80, Cosmos, foram responsáveis por criar uma geração inteira de entusiastas da ciência, além de pesquisadores de carreira, em razão do didatismo do cientista e escritor e de sua paixão pelo conhecimento humano e pela capacidade de evoluirmos enquanto espécie. Por isso, sua morte em 1996 deixou uma lacuna nos corações e mentes dos também apaixonados por ciência e pela humanidade.

    Sua esposa e também cientista e ativista Ann Druyan tentou durante anos colocar de volta no ar uma nova versão de Cosmos, mas ciência e TV não combinam muito bem, de acordo com as emissoras. Tudo isso mudou quando Seth McFarlane – criador de séries de sucesso como Uma Família da Pesada, fã de Sagan e participante do núcleo de uma ala liberal e progressista na TV americana (junto de Bill Maher) -, se ocupou da tarefa de apresentar a ideia do programa a FOX, tradicional rede de TV conservadora nos EUA, o que foi um choque para muitos que a emissora aceitasse a produção do programa. Para apresentá-lo, foi escolhido Neil deGrasse Tyson, astrofísico americano de grande popularidade no meio acadêmico e na internet – também por ter virado um “meme”- , e que possuía uma história de admiração por Sagan. Além, é claro, de também ter uma excelente didática e linguagem moderna, juntamente com a paixão que tanto marcou o programa original. Nasce, assim, Cosmos: Odisseia no Espaço.

    Partindo da premissa do programa clássico, Tyson conduz o espectador primeiramente por uma explicação da noção de tempo que trabalhamos, utilizando o conhecido “calendário cósmico”, onde o dia 1º de janeiro seria o início do universo, e 31 de dezembro, a nossa época. Tudo isso é feito com o único objetivo de nos tornar um pouco mais humildes frente à imensidão do espaço e do tempo em que estamos inseridos. Também são introduzidos o método científico e o conceito de como os primeiros cientistas racionalizaram uma forma de se entender o funcionamento da natureza através da observação e da experimentação, e depois se chegando a uma conclusão. Além disso, somos apresentados a uma animação que conta a trajetória de Galileu, em um formato que difere da série original, a qual usou atores. A animação é interessante porque além de permitir dar asas às metáforas que Neil narra, é visualmente mais atraente.

    O ponto alto do piloto, no entanto, é seu final, onde, visivelmente emocionado, Neil descreve a experiência de ter conhecido Carl Sagan e termina dizendo que, até então, sabia o que queria ser da vida, mas depois de ter conhecido seu mentor, descobriu o tipo de pessoa que gostaria de se tornar.

    A partir do segundo episódio, a série não se preocupa muito em manter uma cronicidade dos eventos, variando os temas conforme a necessidade da narrativa. Passamos pela domesticação dos animais, a evolução dos olhos, as grandes extinções, a descoberta do funcionamento da gravidade, da luz, da relatividade, das estruturas do átomo e da eletricidade e tantas outras que foram responsáveis por mudar radicalmente a vida da humanidade.

    Porém, o maior mérito de Cosmos: Odisseia no Espaço é seu tom político e de enfrentamento, o que o original não tinha tanto. Ao citar a luta do cientista Clair Patterson em associar o uso de chumbo na gasolina a doenças que começam a aparecer nos EUA – em oposição aos interesses das indústrias do petróleo e automobilística -, nota-se a comparação com a luta atual de se provar que a emissão de carbono é responsável pela aceleração do aquecimento global do planeta. Ambos os eventos estão fartamente documentados e são consenso na ciência, mas alguns grupos ainda insistem em afirmar que isso ainda não está provado.

    Essa postura honesta – de assumir que a ciência não é neutra, pode ser manipulada por interesses econômicos, e que muitas vezes é refém das limitações dos homens de sua época – é essencial para nos mantermos alertas frente ao poder econômico das corporações que está longe dos interesses da humanidade, como é o caso do aquecimento global.

    Também é importante a abordagem que o programa dá a várias cientistas mulheres que contribuíram para o avanço da ciência, em especial da astronomia, e que foram deixadas em segundo plano na história. Por exemplo, Cecilia Payne, e seu importante trabalho sobre a luz das estrelas refletida na Terra, nos ajudou a descobrir que esses corpos celestes são feitos de hidrogênio e hélio.

    Apesar de às vezes a citação de tantos dados e tantos “bilhões e bilhões” em escalas muito diferentes de tamanhos e distâncias – além da variação de temas por episódios – poder confundir o espectador, o maior mérito de Cosmos: Odisseia no Espaço é não fazer concessão alguma ao poder do lobby religioso nos EUA. Em momento algum é citado o criacionismo ou qualquer outra pseudociência que tenta, no grito, ganhar espaço no debate público e acadêmico. A postura do programa está correta porque essas ideias já têm seu espaço garantido em outros lugares. Um programa de ciência deve se dedicar somente a falar sobre ciência. O programa em momento algum prega que ela é perfeita, e nem pretende ser, mas é a nossa melhor ferramenta intelectual para ajudar a humanidade a se livrar de seus problemas – que muitas vezes ela mesma cria para si própria – e tentar melhorar a vida de todos.

    Por isso, Cosmos: Odisseia no Espaço é tão importante nos dias de hoje. Para fazer com que as novas gerações saibam do nosso poder enquanto transformadores de nossa realidade, e que consigamos fazer algo de positivo com ele.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.