Tag: Bill Pope

  • Crítica | Homem-Aranha 3

    Crítica | Homem-Aranha 3

    Homem-Aranha 3 fecha a trilogia de Sam Raimi sobre o herói tangível e cheio de defeitos criado por Steve Ditko e Stan Lee, mas não sem trazer consigo uma infinidade de reclamações sobre os rumos que a franquia tomou. Na trama, Peter Parker (Tobey Maguire) tem de enfrentar uma crise na relação com Mary Jane (Kirsten Dunst), além de três vilões diferentes.

    No início do filme há uma clara diferença desse para Homem-Aranha 2, o recapitular das aventuras anteriores se dá com arte de Alex Ross e aqui estão apenas as cenas conduzidas por Raimi, sem qualquer tratamento de imagem, como um resumo de capítulos anteriores de uma série barata, o cuidado com a cinessérie mudou e, além disso, se nota uma diferença no tema orquestrado, com tons e acordes diferentes, já que Danny Elfman dá lugar a  Christopher Young na trilha sonora. Esse tom obscuro deveria passar para a abordagem da personalidade de Peter, mas isso não ocorre, necessariamente.

     

    Homem-Aranha 3 é muitas vezes injustamente  criticado, no entanto, uma reclamação justa é o comportamento que o personagem de Maguire tem no início do filme, antes mesmo de ter contato com o “alienígena” que daria origem a Venom. Ele é impulsivo, se deslumbra com a aceitação que o povo lhe confere finalmente, após dois filmes com histórias conturbadas, e age de maneira brutalmente insensível, em especial com MJ. A vida pessoal de Peter finalmente se ajeita, ele está feliz, tanto como Aranha quanto Peter Parker, mas como se trata de um personagem trágico (aos menos aos olhos do diretor), não há como seguir assim por tanto tempo.

    Raimi é um cineasta muito fiel às suas raízes, mesmo quando faz obras mais voltadas para o público mainstream. Desse modo, é natural que existam cenas que remetam ao cinema de horror. E aqui a manifestação se dá no entorno do Homem Areia, tanto na transformação que Flint Marko (Thomas Haden Church) sofre, quanto nos momentos finais. Além de ter um visual arrebatador em ambos momentos, há significados que remetem aos monstros clássicos, em especial na sua gênese. Marko tem características da criatura de Frankenstein de Boris Karloff, e certamente essa referência seria melhor encaixada caso o roteiro fosse mais sólido, pois o evento que transforma o personagem é completamente avulso à trama, sem repercussão antes ou depois do ocorrido.

    As tramas secundárias também variam de qualidade. James Franco está bastante canastrão, não consegue dar camadas ao seu personagem, sua motivação não faz sentido por não ter tempo de tela, sem falar que expõe um dos defeitos do filme, os efeitos visuais primários. Dunst está muito bem, consegue trabalhar bem com o que é lhe dado, mesmo sendo pouco. Já a introdução dos personagens novos, como Gwen (Bryce Dallas Howard), Eddie Brock (Topher Grace) e o Capitão Stacy (James Cromwell) é gratuita ao extremo. Não há desenvolvimento mínimo de nenhum deles, e até os coadjuvantes do Clarim Diário parecem mais sólidos e profundos que o trio, fato que gera até incongruências, já que o J.J. Jameson de J.K. Simmons não sabe quem é Brock, mesmo com uma citação a ele em Homem-Aranha. O personagem é tão irrelevante para Raimi que a direção deliberadamente não o leva a sério.

    Entre as reclamações mais comuns ao filme está a personalidade de Peter modificada pelo simbionte, que muitos atribuíam ao comportamento dos fãs de emocore. Ora, na época, os meninos comuns que usavam esse visual diferia de Peter. Eram introspectivos, gostavam de parecer sombrios, já Parker é o oposto disso, espalhafatoso, inconsequente e age até como um bully em alguns momentos, com uma personalidade tão baixa quanto a do seu nêmese escolar Flash Thompson. Ele claramente não era Emo, só pegou emprestado desse estilo o cabelo e a maquiagem um pouco mais forte, comparar o Andrew Garfield em O Espetacular Homem-Aranha com o estereótipo do hipster até faz algum sentido, mas o Peter de Tobey de emo tinha apenas o visual.

    Parker parece governado unicamente pelo id (parte da mente que quer gratificação imediata de todos os seus desejos e necessidades, segundo o conceito freudiano), e dito assim, esses momentos não parecem tão erráticos, especialmente a cena “musical”, já que é o símbolo maior da breguice que Raimi sempre impôs a sua versão do Cabeça de Teia.

    A reunião dos antagonistas não tem nenhuma força, é um pretexto pobre que está lá para justificar uma ação entre amigos com Harry e Peter juntando as forças, que só não é mais vergonhosa do que o momento de retorno do uniforme clássico, ao lado de uma bandeira dos EUA tremulando, que faz automaticamente o povo esquecer dos maus atos do Aranha. Além dessas questões, boa parte da imaturidade de Peter também não cabe, já que ele aprendeu ou deveria ter aprendido com seus erros do passado, e justificar esses atos pelo simbionte também não faz sentido, visto que sua personalidade já havia se transformado antes mesmo dele utiliza-lo.

    Raimi saiu reclamando de interferência dos estúdios, seu desejo seria explorar personagens como o Abutre e a Gata Negra, mas por influência de Avi Arad, teve que fazer o filme com Venom. Desse modo,  Homem-Aranha 4 previsto para 2011 foi abortado, assim como uma segunda trilogia. Ainda assim Homem-Aranha 3 parece mais com o ideal de Ditko e Lee, por ser senhor de sua própria história e seguir dando camadas trágicas, mas humanas ao personagem. Peter segue falho, tolo, mas capaz de se sacrificar e tentar evoluir, mesmo que a mão invisível do roteiro o faça agir como alguém que não digeriu bem seus problemas.

  • Crítica | Matrix Revolutions

    Crítica | Matrix Revolutions

    Crítica Matrix Revolutions

    Matrix Revolutions é o terceiro filme da saga idealizada pelas irmãs Wachowski, e carrega muitas expectativas, em especial, ter que fechar as pontas soltas de Matrix Reloaded, dar sequência aos conceitos filosóficos primordiais de Matrix e pincelar questões ligadas a aceitação de gênero. Todas essas resoluções teriam de ocorrer em pouco mais de duas horas. Se perder em meio a essas demandas é fácil.

    Filmado em conjunto com Reloaded, o longa se inicia em um cenário de limbo, com o Neo (Keanu Reeves) aguardando seu destino enquanto seus amigos tentam resgatá-lo, num conceito bem mais filosófico que as brigas envolvendo Trinity nos dois primeiros. Este trecho é obviamente um paralelo com o purgatório, lugar onde as almas se preparam para o julgamento de danação ou paraíso segundo a fé cristã católica. Este momento serve para lidar com a obsolescência dos programas, e para ratificar o sentimentalismo e “humanidade” desses seres.

    Se a Matrix é programada para domar os homens e precisa se alimentar das emoções deles em um esquema de vida falso, mas que necessita ser congruente para quem nela vive, pode-se dizer que é preciso sensibilidade para equilibrar tudo. Se as máquinas têm anseios e sentimentos, seria natural que os programas do simulacro também fossem igualmente sentimentais, que tivessem desejos e inseguranças. O conceito de um casal de programas, querer que sua filha (Sati) viva apesar da programação de destino fatal relegado a eles faz sentido, e conversa bem com o segmento O Segundo Renascer, do compilado de animações Animatrix, lançado em 2003. Se conceitos relacionados ao potencial de Merovingio e Persephone são abandonadas nesta parte, essa questão é um ponto positivo, e conversa bem com a condição do Agente Smith (Hugo Weaving), já que após sua derrota ele se reinventa, e age como um vírus predatório. Esses programas buscam viver a todo custo, assim como Roy Batty em Blade Runner, buscam se adaptar e seguir vivos, mesmo que essa condição comprometa o funcionamento básico da matrix.

    O subtexto mais rico certamente tem a ver com a transição de gênero. A jornada de Neo não é só um paralelo com Cristo, há a percepção que sua identidade no mundo real também não é “verdadeira” quanto deveria ser. Para muitos, o fato dele ter poderes fora da Matrix é incongruente ou é a demonstração cabal de que Zion era outra camada de simulação, hoje faz  mais sentido comparar isso com a descoberta da identidade, no caso de Neo sua relação com os poderes, enquanto para as diretoras têm toda a conotação de gênero. A Matrix não permite que Neo tenha poderes não por ele estar acima do código-fonte, mas por conta das habilidades que ele sequer tem consciência. Para acessar essa condição, Neo precisou se entender, descobrir quem ele era, assim como ocorreu com as cineastas anos depois.

    Da parte da ação houve um salto de qualidade. Os confrontos melhoraram muito entre Reloaded e Revolutions, inclusive no que toca o agente Smith. Foram utilizados mais dublês e efeitos práticos, além de mais cenas noturnas que disfarçam melhor as fragilidades dos efeitos em computação gráfica. Outro bom ponto são as batalhas em Zion, que lembram animes de mechas e robôs gigantes, tais como Gundam. Aqui também se dribla a máxima de batalha em várias frentes carente de emoção, diferente de outros filmes, é fácil ter empatia pelos humanos nessas lutas.

    Essa terceira parte também faz justiça a Niobe (Jada Pinkett Smith). Sua jornada é bem pontuada e mesmo com pouco tempo de tela se percebe a difícil decisão que ela teve que tomar. Trinity também é valorizada, sua relação com Neo é mostrada como um grande pilar na franquia, e Carrie-Anne Moss está de novo muito bem.

    Matrix Revolutions não é um fechamento ideal, mas a decisão de Neo em estabelecer a paz entre os dois povos guerreiros é sábia, mostra que seus poderes enquanto paralelo de Cristo não são só de onipotência, mas também de conhecimento e sabedoria, finalizando bem seu papel de sacrifício. Ao menos nesse ponto o roteiro seguiu tão inspirado quanto o filme original, e certamente essas continuações seriam melhor construídas caso houvesse um espaço de intervalo maior entre elas.

  • Crítica | Matrix Reloaded

    Crítica | Matrix Reloaded

    Crítica Matrix Reloaded

    Matrix foi um sucesso estrondoso e mudou os paradigmas do cinema de ação. Natural que continuações surgissem, e em 2003 Matrix Reloaded foi anunciado em conjunto com sua continuação, Matrix Revolutions, ambos gravados simultaneamente. Segundo as irmãs Wachowski, a história sempre foi pensada para ser uma trilogia, embora o primeiro filme tenha um fechamento satisfatório.

    O início desse remete ao primeiro, com uma cena de ação com Trinity (Carrie-Anne Moss) em um momento de perigo iminente, com uma possibilidade de fracasso ligeiramente provável. Essa sequência é breve, e serve para mostrar que as lutas com arame seguem bem feitas e, em contrapartida, também prevê o uso de computação gráfica mais extensivo nessa parte da saga, quase sempre com problemas.

    No primeiro filme, a cidade dos humanos, Zion, é apenas citada. Já aqui é um cenário grande, belo à sua maneira, mesmo que seja paupérrimo, com famílias amontoadas em pequenas baías que se assemelham ao cenário favelizado dos morros cariocas e em diversos outros lugares suburbanos nas metrópoles do mundo. A liberdade de escolha tem um preço.

    Muito se reclama a respeito dos roteiros das sequências, mas a realidade é que os paralelos com as mitologias e religiões segue sendo um ponto bem explorado. Entre eles está na adulação que boa parte dos habitantes de Zion fazem a Neo, tratado realmente como uma figura divina, inclusive com sacrifícios e oferendas. A reação que Keanu Reeves tem a esses momentos de agradecimento surpreende pelo desempenho do intérprete, conhecido por não ter dotes dramáticos tão valorosos, a exemplo de Drácula de Bram Stoker, mas o destaque maior está obviamente na referência ao culto a personalidade, denunciado por Cristo, mas tão presentes nas religiões.

    Outro fator é a figura de Morpheus como o profeta que prepara a vinda do Messias. Laurence Fishburne ratifica e evolui sua variação de João Batista. Tal qual era o primo carnal de Cristo que anunciava a vinda do Escolhido à Terra, ele segue auxiliando o Salvador. Batista vivia no deserto se alimentando de gafanhotos e mel, enquanto Morpheus no primeiro Matrix se alimenta sem luxos, de forma precária e ainda arrasta os seus seguidores da Nabucodonosor a fazer o mesmo. Aqui outro sacrifício também é mostrado, já que ele abriu mão da relação com Niobe (Jada Pinkett Smith), cortando os vínculos carnais.

    Há muitos bons conceitos, como a expansão dos programas, representados de forma complexa, com anseios humanos, como também os novos personagens introduzidos que ajudam a expandir a mitologia da série de filmes, ainda que muitos deles não tenha nenhum aprofundamento. Outro destaque fica para as cenas de ação, em especial a de perseguição na auto-estrada, certamente o ápice emocional do filme. O segmento põe à prova toda a extensa preparação do elenco que durou oito meses, e isso é visto nos momentos de luta, como nos choques de carros e perseguições que resgatam os clássicos Bullit e Operação França, em um circuito de cinco quilômetros, feito exclusivamente para a produção.

    Há muitas fragilidades no filme, em especial o primeiro embate de Neo com a nova versão do Senhor Smith. Um produto que foi tão bem cuidado não merecia uma computação gráfica tão artificial quanto esta, e isto resume os problemas de Matrix Reloaded, um produto mal-acabado tecnicamente, imaturo enquanto história solo e pouca dramaticidade. Tudo parece mecânico e presunçoso, e essa é uma história de homens, não de máquinas.

     

  • Crítica | Alita: Anjo de Combate

    Crítica | Alita: Anjo de Combate

    Pelos meados dos anos noventa, James Cameron pensou em adaptar A obra Gunnm ou Gun-Mu, de Yukito Kishiro, uma historia sobre uma adolescente encarnada em uma inteligência artificial capaz de matar qualquer pessoa. O tempo passou e entre as duas maiores bilheterias do cinema, Titanic e Avatar e Cameron passou um bom tempo sem dirigir produtos para o cinema, e graças a sua dedicação as continuações de Avatar, a adaptação de Alita: Anjo de Batalha recaiu sobre outro diretor, Robert Rodriguez, que é um cineasta de produtos mais autorais mas que também sabe fazer filmes que rendem bem. Cercado de expectativas, ele possui alto e baixos, mas não erra tanto quanto outras versões americanas de mangás.

    A historia da adolescente guerreira começa com a introdução de Ido, um doutor interpretado por Christoph Waltz que tem por costume consertar ciborgues. O cenário aqui é muito bem explorado, se explica bem como funcionam o sistema de castas dessa sociedade, com a elite vivendo no alto, em uma cidade flutuante, e a ralé vivendo em baixo. Os restos da ciborgue/androide são encontrados no lixão, como restos de Zalem, a tal moradia dos ricos, mas obviamente que ela é mais do que isso.

    A primeira hora do filme consegue dar vazão a toda a mitologia que Kishiro pensou, e embora hajam problemas sérios com as motivações dos personagens periféricos a protagonista, em especial Ido, que faz o mentor clichê que não tem qualquer firmeza como figura paterna (além de ter uma assistente que sempre está presente mas quase não profere palavras), de Hugo (Keen Johnson) que é o interesse romântico da personagem-título cuja vontade de ascender socialmente o faz um personagem confuso moralmente (além de oportunista), a interpretação de Rosa Salazar como Alita é bastante crível e verossímil, e conseguir atuar embaixo de muita maquiagem já é difícil, sendo uma boneca digital então é mais difícil ainda, e tanto visualmente quanto em espírito, Salazar consegue imprimir uma menina carismática, intrigante e que gera muito interesse no espectador não só sobre seu passado, mas também como ocorrerá o seu futuro.

    Há um pequeno problema de ritmo no filme, a segunda metade se dedica demais a construção do possível romance entre Alita e Hugo, e não há qualquer química entre os dois, talvez pela dificuldade de Johnson em lidar com um par digital, além disso, se dá muita vazão a alguns vilões bobos, como os personagens de Mahershala Ali (Vector) e Jennifer Connoly (Chiren), essa ultima, ao menos no final, consegue se redimir de certa forma.

    No entanto, toda a configuração tirada do mangá como a questão dos caçadores de recompensas que lidam com os ciborgues marginais e o esporte Motorball são exemplificadas de modo muito rico, e é nessa parte que se percebem semelhanças visuais com Jogador Nº1 de Steven Spielberg, filme recente que tem coincidências temáticas. De resto, há também referencias a Blade Runner e a continuação mais recente Blade Runner 2049, e a dúvida que pairava sobre Rodriguez conseguir lidar com computação gráfica de orçamento alto foram completamente sanadas, e o resultado é lindíssimo visualmente, muito por mérito da fotografia de Bill Pope, de Mogli: O Menino Lobo e Homem-Aranha.

    As cenas de ação são muito bem coreografadas, e por mais que perca tempo demais com os personagens periféricos e em draminhas fúteis, a construção da personagem de Alita é muito bem feita, ao menos no que tange a personagem não há muitas liberdades poéticas ou suavização de qualquer drama seu. Há uma possibilidade de  continuação em um dos confrontos finais, fator que preocupa, pois além do filme ser caro, em torno de 200 milhões, os vilões são péssimos, em especial o visual de Nova, feito por Edward Norton que está irreconhecível no papel. Mesmo não tendo uma execução tão divertida quanto no mangá, Alita: Anjo de Combate acerta mais do que erra, e talvez seja a adaptação Hollywood mais fiel  ao material original e que consegue imprimir melhor o caráter da arte japonesa, embora obviamente não seja tão complexa em temática e reflexão.

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  • Top 20 | Diretores de Fotografia – Parte 1

    Top 20 | Diretores de Fotografia – Parte 1

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    Direção de fotografia é uma forma de arte quase que subestimada. Quando muitas pessoas vão ao cinema, elas podem perceber que a fotografia foi bonita, mas são poucas as pessoas que vão atrás do responsável por dirigir esse trabalho. Na grande parte das vezes essa pessoa pode passar despercebida do público geral, tirando a ressalva dos indicados ao Oscar. Mas cinéfilos com a paixão pela fotografia sabem que a sétima arte é completamente um meio colaborativo que enquanto alguns diretores trabalham ao mesmo tempo na fotografia, a grande maioria dos resultados que vemos na grande tela envolve o diretor, fotógrafo, designer de produção, figurinista e etc.

    Quando a fotografia digital começou a aparecer, de repente houve um boom de diferentes novas maneiras de capturar o filme. Alguns realizadores abraçaram as vantagens do digital, enquanto outros optaram por isso como um recurso visual extra. No fim do dia a câmera é uma das muitas maneiras de dar vida ao visual do seu filme. E hoje posso dizer que, vivemos um momento muito interessante para a fotografia.

    Existe um número considerável de fotógrafos que tem trabalhos dignos de serem ressaltados, mas para fechar esse artigo eu selecionei apenas 20. Os citados aqui representam profissionais que atuam hoje na indústria, com diferentes maneiras e estilos para fascinar o espectador, o que ligam todos é que estão fazendo um trabalho fenomenal na sua área.

    20 – Roger Deakins

    Trabalhos: Skyfall, O Assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford, Fargo.

    Roger Deakins é um mago. Ele vem lapidando seu talento há quatro décadas e só continua melhorando. Deakins recusou as escolhas óbvias, resultando na iconografia marcante que permeia Onde os Fracos não tem Vez e Um Sonho de Liberdade, e ele parece completamente confortável fotografando um longa cômico como Queime Depois de Ler assim como um épico histórico como Invencível. Suas colaborações mais frequentes são com certeza com os Irmãos Coen, mas comparando seu trabalho nesses filmes com A Vila ou Sicario de fato denota a competência do mesmo para atribuir diferentes estéticas para cada visão de diretor. Você conhece quando um filme é fotografado Deakins, mas o mesmo tem uma capacidade de camaleão de atravessar os gêneros. De uma maneira técnica Skyfall e  O Assassinato de Jesse James pelo covarde Robert Ford são suas obras-primas mesmo sendo filmes completamente diferentes.

    19 – Jody Lee Lipes

    Trabalhos: Manchester à Beira Mar, Girls (1ª Temporada), Martha Marcy May Marlene.

    Jody Lee Lipes é relativamente um novato em comparação aos outros nomes da lista, mas ele chegou com o pé direito, estreando sua carreira com o sombrio Martha Marcy May Marlene e a primeira temporada de Girls, da HBO. Com esse último, Lipes aceitou o desafio de capturar Nova York de maneira completamente diferente, e ele conseguiu. Cada episódio de Girls parece que foi artesanalmente enquadrado, e muita dessa impressão vem das influências anteriores do mesmo. Desde então, ele pegou projetos como a comédia de Judd Apatow e Amy Schumer, Descompensada, mas é sua colaboração com o diretor Kenneth Lonergan no obra prima dramática Manchester à Beira Mar que marca sua posição como um dos d. de fotografia mais promissores de hoje. Aos que não viram Machester fiquem avisados que verão tomadas extremamente envolventes durante o longa.

    18 – Bradford Young

    Trabalhos: Selma, O Ano mais Violento, A Chegada.

    Se você esta procurando por novos rostos no quesito direção de fotografia, Bradford Young deve estar no topo de sua lista. Nós sabíamos que pelo seu trabalho no Neo-Western Amor Fora da Lei que ele era capaz de capturar um gênero de maneira intimista, e Pariah provou sua capacidade de se adaptar a fotografia road-movie. Mas foi em 2014 com Selma que ele se mostrou muito mais que um fotógrafo competente. Young tem um controle intenso do ponto de vista do personagem, trabalhando em conjunto com Ava DuVernay, ele ajudou a narrar a solidão marcante que foi a vida de Martin Luther King Jr., fora a cena do terrível ataque na ponte Edmund Pettus. Com a ambientação oitentista de O Ano mais Violento, Young mais uma vez brilhou, e não é surpresa que ele foi escolhido pra substituir Roger Deakins no novo filme de Denis Villeneuve, o sci-fi/drama A Chegada.

    17 – Bill Pope

    Trabalhos: Matrix, Homem-Aranha 2, É o Fim.

    Bill Pope tem uma carreira fascinante. Passeando por gêneros completamente díspares, de Uma Noite Alucinante a um longa de estúdio engessado como As Patricinhas de Beverly Hills, ele pode ter como seu trabalho mais reconhecido o revolucionário Matrix, de 1999, mas seu currículo não para por aí. Pope reprisou seu talento nas sequências da franquia e se manteve em blockbusters como Homem-Aranha 2 e 3, e ainda arranjou tempo pra trabalhar em filmes conhecidos por terem sido produções muito problemáticas como Team America: Detonando o Mundo, e agora se tornou o Diretor de Fotografia oficial do diretor Edgar Wright depois de sua primeira colaboração em Scott Pilgrim contra o Mundo. Pope tem uma incrível capacidade de produzir imagens pop, mas de um maneira intrigante, ele sabe como prosseguir cenas de ação. Mas o mais importante, Pope não aparenta ter medo de tentar coisas novas. Sejam bonequinhos, super-heróis, ou até a série Cosmos. Pope se prova o mais versátil até hoje com o lançamento desse ano Mogli: O Menino Lobo  e o piloto da série Preacher mostram que ele se mantêm confortável tanto no ambiente em CG como numa cidadezinha no meio do nada no Texas, e os dois são incríveis!

    16 – Maryse Alberti

    Trabalhos: Creed, O Lutador, Velvet Goldmine.

    Maryse Alberti é um dos exemplos mais interessantes dessa lista. Ela começou no ramo dos documentários. Suas tomadas mostravam uma carreira já promissora como no filme Um Táxi Para a Escuridão e mostrando ser altamente capacitada para longas quando colaborou com o diretor Todd Haynes, em 1998, com Velvet Goldmine. O trabalho de Alberti alcança destaque para a maioria dos espectadores no filme de Darren Aronofsky, O Lutador, novamente mostrando assim como Bradford Young um enorme talento em capturar o ponto de vista do protagonista. Se já não bastasse, ela foi a primeira escolha de Ryan Coogler quando estava desenhando a ideia de sua sequência de Rocky Balboa, resultando numa obra contundente e emocionante tanto dentro quanto fora do ringue. De fato, existem dois planos-sequências em Creed: Nascido Para Lutar que não são apenas visualmente incríveis mas que tem um propósito em cena. Você consegue sentir a ansiedade de de Michael B. Jordan dentro da montagem da cena.

    https://www.youtube.com/watch?v=pqSSHmr8bR4

    15 – Darius Khondji

    Trabalhos: Se7en, A Imigrante, Meia-Noite em Paris.

    Lá em cima com Deakins, Darius Khondji é um veterano da fotografia cinematográfica, trabalho esse que sempre parece ficar melhor. Nascido no Irã, o diretor de fotografia já deixou sua marca colaborando com David Fincher no longa Se7en – Os Sete Crimes Capitais, capturando a sujeira e o desespero da cidade sem nome com um tipo de beleza mal assombrada. E mais tarde, se tornou co-diretor de fotografia de Woody Allen em Meia -Noite em Paris. Fora isso, foi seu trabalho no longa de James Gray, em 2013, no drama histórico A Imigrante que solidificou seu lugar como um dos melhores de todos os tempos. O filme é carregado de sequências inesquecíveis, mas é nos closes que ele se mostra genial, reforçando de maneira curiosa a temática do longa.

    14 – Claudio Miranda

    Trabalhos: As Aventuras de Pi, O Curioso Caso de Benjamin Button, Tron: O Legado.

    Como a fotografia em CG ganhou popularidade, a quantidade de diretores de fotografia para CG cresceu progressivamente. Claudio Miranda se tornou referência quando o assunto vem à tona. Miranda se tornou algo como a ponte entre a fotografia real e o CG, do realista O Curioso caso de Benjamin Button até o sci-fi Tron: O Legado. Ele sabe o seu caminho através do cada enquadramento, e nenhum deles é tão atraente quanto em As Aventuras de Pi, de Ang Lee. Os cenários e personagens são todos em CG, o ator Suraj Sharma é o único elemento real enquadrado em boa parte do filme e mesmo assim Miranda encontrou beleza que salta os olhos no longa, resultando em muitas indicações e estatuetas no Oscar.

    13 – John Guleserian

    Trabalhos: Questão de tempo, Paixão Inocente, Casual.

    O diretor de fotografia John Guleserian marcou sua trajetória em passos largos. Iniciando sua carreira com a série Tim and Eric Awesome Show, Great Job!, foi seu trabalho com Drake Doremus em Loucamente ApaixonadosPaixão Inocente, e o último lançado Quando Eu Te Conheci que realmente mostraram o potencial do fotógrafo. Existe algo crespo no universo imagético de Guleserian que traz o espectador para muito perto do que ocorre em tela, e o uso frequente de câmera na mão apenas aumenta essa impressão dos personagens no filme. Mesmo com filmes muito focados em luz como em Questão de Tempo, algo permanece urgente e próximo que permeia até as cenas mais periféricas.

    12 – Jeff Cronenweth

    Trabalhos: Clube da Luta, Retratos de Uma Obsessão, Abaixo o Amor.

    Se tem dito muitas vezes que David Fincher é um diretores que sabe fazer seu trabalho melhor que ninguém, mas existe um motivo pelo qual ele colaborou Jeff Cronenweth em Clube da Luta além de seus últimos três filmes seguidos. A diversidade na paleta entre A Rede Social e Os Homens que não amavam as Mulheres é chocante e o controle de Cronenweth sob cada enquadramento não é menos impressionante. O imagético muitas vezes de natureza estéril reflete a frieza de muitos dos personagens da trama, mas em filmes como Garota Exemplar e até Hitchcock, Cronenweth provou que ele pode manter esse consistência de qualidade a cada enquadramento até hoje.

    11 – Emmanuel Lubezki

    Trabalhos: Árvore da VidaAliA Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça.

    A lista não poderia estar completa sem Emmanuel Lubezki, que está destinado a ser um dos maiores diretores de fotografia que já viveu. Foi indicado ao seu primeiro óscar por A Princesinha, de 1996, mas esse foi apenas o começo. Sua colaboração com Alfonso Cuaron trouxe um trabalho impactante para diversos filmes como E Sua Mãe TambémFilhos da Esperança e Gravidade. A inclinação de Lubezki para a fotografia “câmera-na-mão” é a primeira vista surpreendente e intimista, permitindo que a audiência sinta que elas também são parte importante da trama. Sua parceria com Terrence Malick provou francamente ser um pioneiro, trazendo a audiência tão próxima que chega a ser desconfortável, e mesmo assim conseguiu construir algo bonito e poético com A Árvore da Vida, onde a técnica parece tornar o longa de outro mundo. E nem precisamos citar Birdman e O Regresso. O homem é um mestre na fotografia, mago da natureza e acima de tudo um realizador excitante.

    Gostaram até aqui? Continue acompanhando o Vortex Cultural que em breve postaremos a segunda parte!

    Texto de autoria de Halan Everson.

  • Review | Cosmos: Odisseia no Espaço

    Review | Cosmos: Odisseia no Espaço

    cosmos-a-space-time-odysseyCarl Sagan e seu programa de TV dos anos 80, Cosmos, foram responsáveis por criar uma geração inteira de entusiastas da ciência, além de pesquisadores de carreira, em razão do didatismo do cientista e escritor e de sua paixão pelo conhecimento humano e pela capacidade de evoluirmos enquanto espécie. Por isso, sua morte em 1996 deixou uma lacuna nos corações e mentes dos também apaixonados por ciência e pela humanidade.

    Sua esposa e também cientista e ativista Ann Druyan tentou durante anos colocar de volta no ar uma nova versão de Cosmos, mas ciência e TV não combinam muito bem, de acordo com as emissoras. Tudo isso mudou quando Seth McFarlane – criador de séries de sucesso como Uma Família da Pesada, fã de Sagan e participante do núcleo de uma ala liberal e progressista na TV americana (junto de Bill Maher) -, se ocupou da tarefa de apresentar a ideia do programa a FOX, tradicional rede de TV conservadora nos EUA, o que foi um choque para muitos que a emissora aceitasse a produção do programa. Para apresentá-lo, foi escolhido Neil deGrasse Tyson, astrofísico americano de grande popularidade no meio acadêmico e na internet – também por ter virado um “meme”- , e que possuía uma história de admiração por Sagan. Além, é claro, de também ter uma excelente didática e linguagem moderna, juntamente com a paixão que tanto marcou o programa original. Nasce, assim, Cosmos: Odisseia no Espaço.

    Partindo da premissa do programa clássico, Tyson conduz o espectador primeiramente por uma explicação da noção de tempo que trabalhamos, utilizando o conhecido “calendário cósmico”, onde o dia 1º de janeiro seria o início do universo, e 31 de dezembro, a nossa época. Tudo isso é feito com o único objetivo de nos tornar um pouco mais humildes frente à imensidão do espaço e do tempo em que estamos inseridos. Também são introduzidos o método científico e o conceito de como os primeiros cientistas racionalizaram uma forma de se entender o funcionamento da natureza através da observação e da experimentação, e depois se chegando a uma conclusão. Além disso, somos apresentados a uma animação que conta a trajetória de Galileu, em um formato que difere da série original, a qual usou atores. A animação é interessante porque além de permitir dar asas às metáforas que Neil narra, é visualmente mais atraente.

    O ponto alto do piloto, no entanto, é seu final, onde, visivelmente emocionado, Neil descreve a experiência de ter conhecido Carl Sagan e termina dizendo que, até então, sabia o que queria ser da vida, mas depois de ter conhecido seu mentor, descobriu o tipo de pessoa que gostaria de se tornar.

    A partir do segundo episódio, a série não se preocupa muito em manter uma cronicidade dos eventos, variando os temas conforme a necessidade da narrativa. Passamos pela domesticação dos animais, a evolução dos olhos, as grandes extinções, a descoberta do funcionamento da gravidade, da luz, da relatividade, das estruturas do átomo e da eletricidade e tantas outras que foram responsáveis por mudar radicalmente a vida da humanidade.

    Porém, o maior mérito de Cosmos: Odisseia no Espaço é seu tom político e de enfrentamento, o que o original não tinha tanto. Ao citar a luta do cientista Clair Patterson em associar o uso de chumbo na gasolina a doenças que começam a aparecer nos EUA – em oposição aos interesses das indústrias do petróleo e automobilística -, nota-se a comparação com a luta atual de se provar que a emissão de carbono é responsável pela aceleração do aquecimento global do planeta. Ambos os eventos estão fartamente documentados e são consenso na ciência, mas alguns grupos ainda insistem em afirmar que isso ainda não está provado.

    Essa postura honesta – de assumir que a ciência não é neutra, pode ser manipulada por interesses econômicos, e que muitas vezes é refém das limitações dos homens de sua época – é essencial para nos mantermos alertas frente ao poder econômico das corporações que está longe dos interesses da humanidade, como é o caso do aquecimento global.

    Também é importante a abordagem que o programa dá a várias cientistas mulheres que contribuíram para o avanço da ciência, em especial da astronomia, e que foram deixadas em segundo plano na história. Por exemplo, Cecilia Payne, e seu importante trabalho sobre a luz das estrelas refletida na Terra, nos ajudou a descobrir que esses corpos celestes são feitos de hidrogênio e hélio.

    Apesar de às vezes a citação de tantos dados e tantos “bilhões e bilhões” em escalas muito diferentes de tamanhos e distâncias – além da variação de temas por episódios – poder confundir o espectador, o maior mérito de Cosmos: Odisseia no Espaço é não fazer concessão alguma ao poder do lobby religioso nos EUA. Em momento algum é citado o criacionismo ou qualquer outra pseudociência que tenta, no grito, ganhar espaço no debate público e acadêmico. A postura do programa está correta porque essas ideias já têm seu espaço garantido em outros lugares. Um programa de ciência deve se dedicar somente a falar sobre ciência. O programa em momento algum prega que ela é perfeita, e nem pretende ser, mas é a nossa melhor ferramenta intelectual para ajudar a humanidade a se livrar de seus problemas – que muitas vezes ela mesma cria para si própria – e tentar melhorar a vida de todos.

    Por isso, Cosmos: Odisseia no Espaço é tão importante nos dias de hoje. Para fazer com que as novas gerações saibam do nosso poder enquanto transformadores de nossa realidade, e que consigamos fazer algo de positivo com ele.

    Texto de autoria de Fábio Z. Candioto.