Resenha | O Despertar: Parte Dois
Além de uma mera estratégia editorial ao lançar uma publicação dividida em duas partes, a série da Vertigo criada por Scott Snyder e Bryan Murphy se desenvolve em dois momentos narrativos distintos, justificativa para que a revista, lançada originalmente em dez partes nos Estados Unidos, tenha sido publicada em dois compilados pela Panini Comics.
Na sequência de O Despertar : Parte Um, a trama sofre um salto temporal de 200 anos, apresentando um futuro distópico em que as calotas polares foram destruídas pela ação das entidades do mar. Este novo cenário foi apresentado brevemente durante a primeira parte da história, focada, em grande parte, em um crescendo atmosférico de tensão e claustrofobia nas profundezas do mar.
Neste novo cenário, as entidades se tornaram parte do cotidiano mundial. São objeto de caça devido ao seu próprio sangue, que provoca poderes alucinatórios nos humanos, bem como fragmentaram a sociedade em uma nova estrutura, incluindo aqueles que são favoráveis ao despertar destes seres, sendo postos à margem pela política. A nova personagem central, Leeward, é apresentada como um pária nesta nova sociedade e, à semelhança da dra. Lee Archer, captura um chamado das profundezas e decide investigá-lo.
A abordagem nesta parte se difere da inicial: a trama desenvolvida em ambiente fechado cede espaço para uma aventura distópica que intenta apresentar uma nova sociedade. Duzentos anos após o surgimento dos sereios, tem-se a impressão que não houve nenhuma evolução científica aparente, ainda que tal afirmação seja questionável. Mesmo com o despertar destas personagens do mar, seria natural que, antes da queda total da humanidade, houvesse uma tentativa de descobrir quem elas são. A trama, ao menos, não demonstra essa possibilidade.
O roteiro de Snyder desenvolve uma boa base desta sociedade distópica, ainda que não trace uma ponte de ligação aceitável com a história anterior. A teoria que surge para sustentar as entidades se demonstra simplista, sem nenhuma revelação além do óbvio elo perdido com os humanos. O bom suspense da primeira parte se contrapõe a cenas de ação comum neste segundo ato, em um cenário que não parece urgente como ocorreu com a descoberta dos sereios.
Conforme caminha para o desfecho, a trama se enfraquece também ao apresentar novos personagens, demasiadamente comuns e apoiados em estereótipos. Tons que simplificam os bons contornos narrativos iniciais, entregando um final que nada tem de revelador, mas parecendo despreparado em relação à tônica da história, como se o roteiro se prolongasse em demasia em certas partes anteriores e, ao se deparar com poucas páginas para finalizar, escolhesse a saída mais fácil para um fim que fosse confortável aos leitores mas, ainda assim, permanecesse incompleto de explicações.
Ainda que a ficção científica tenha fundamentado um bom argumento inicial, a trama se dilui diante de uma sequência de alternativas narrativas fáceis, repetindo histórias anteriores sem uma boa sustentação. A leitura flui até o término da edição, porém, não o suficiente para se destacar como uma boa história por completo.