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  • Crítica | Rocky II: A Revanche

    Crítica | Rocky II: A Revanche

    Rocky 2 - blu ray

    Os primeiros minutos do filme dirigido por seu astro, Sylvester Stallone, começa com os momentos finais de Rocky – Um Lutador, mostrando a luta de Balboa (Stallone) e seu adversário, o campeão inconformado com a resistência do Garanhão Italiano, Apollo Creed (Carl Wheaters). A luta que deveria ser apenas amistosa tornou-se uma versão diminuta de uma guerra, o resultado de toda uma vida de sofrimentos, do capanga da máfia residente na Filadélfia que do alto de seu fracasso agarra as chances de enfrentar o maior atleta do mundo, por pouco não o nocauteando.

    O anúncio de Rocky II – A Revanche só acontece decorridos cinco minutos de exibição, após os espólios do capítulo anterior, e tem como primeira cena uma corrida de ambulância, muito bem executada por Sly, repleta de cortes rápidos e de simbolismo, associando o trajeto percorrido à tragédia do homem comum, do pobre e moribundo. No lobby do hospital, Creed se contradiz e o convida para uma nova luta, para provar ao mundo que a odisseia televisionada há pouco foi pura sorte de principiante.

    Apesar de todos os problemas sociais a que é acometido, Balboa toma sua pequena Adrian (Talia Shire), casando-se com ela para finalmente livrá-la dos braços do agressivo irmão Pauli (Burt Young). O decorrer da rotina do aposentado boxer inclui passeios pelas ruas da Filadélfia à noite; convites para investimentos de risco feitos por seu antigo patrão, Gazzo (Joel Spinelli); e gastos com o dinheiro que sequer tem, em tentativas malfadadas de virar garoto propaganda, já que não há talento dramatúrgico que o faça conseguir atuar minimamente bem diante de uma câmera.

    O roteiro deste lembra muito em estrutura o primeiro, ainda que neste haja o cuidado em contrapor Apollo e Rocky em momentos de derrocada distintos, com o vencedor se lamentando e não aceitando a quase derrota que sofreu, piorada sua situação com as cartas que recebe dos fãs raivosos. Sua moral só não está pior que a de seu adversário azarão, que é humilhado nos sets de propaganda. A mensagem passada é que o status quo prossegue intacto, e que todas as consequências da luta serviram apenas de verniz, um despiste para a realidade do mesmo homem sem sucesso.

    Rocky II d

    A limitação de Rocky aumenta, ele não é mais somente um fracassado, é também um deficiente visual, o que impede de seguir seus instintos e sua luta por dignidade. Continuações normalmente são caça-níqueis péssimos, sem chance para evolução de conceito, somente replicando fórmulas e as exagerando. Rocky II apela para todos esses defeitos, exceto na dificuldade em seguir da onde parou, já que o curso natural dos fatos contradiz o convencional e não incorre nas mesmas redenções bobas que permeariam os roteiros futuros de Stallone.

    Após mais uma carga de mini tragédias, depois da autorização de sua esposa, Rocky corre no mesmo trajeto que antes, perseguido por crianças e adolescentes, como orgulho da cidade que um dia o viu como pobre coitado. O pique que consegue executar está longe de ser um exercício puro e simples, é o símbolo tenaz da busca do ignorado e do subestimado por um lugar ao sol, pela oportunidade de enfim brilhar e de desempatar a disputa em aberto, e tal arremedo não é pouco, ainda mais na carreira de um diretor iniciante.

    É neste capítulo que os métodos de treino começam a beirar a insanidade, com táticas esquisitíssimas de Mike (Burgess Meredith), incluindo corridas atrás de galeto, socos desferidos com um dos braços amarrados, entre outros. A distância do método deste para o ministrado por Duke (Tony Burton), ao seu lutador, há claramente um receio enorme por parte de todos os envolvidos no certame, exceto no orgulhoso detentor do cinturão. É arrogância de outrem que poderia facilitar a volta do arruinado pugilista.

    A revanche se diferencia visualmente e em espírito do visto no filme inicial, a começar pelos calções de Apollo, não ostentando a bandeira americana. A postura é invertida também para o Garanhão Italiano, que decide usar uma estratégia que começa contida e que se torna agressiva com o tempo. O tema de Bill Conti ganha contornos de resolução e virada, tendo seus acordes finalmente alinhados com a vitória do protagonista.

  • VortCast 02 | Darren Aronofsky

    VortCast 02 | Darren Aronofsky

    Bem Vindos à bordo. Voltamos com mais a segunda edição do VortCast, e dessa vez contamos com Flávio Vieira, Amilton Brandao, Mario Abbade, Carlos Voltor, Rafael Moreira e Marcos Noriega em uma conversa profunda, perturbada, esquizofrênica e divertida sobre um grande cineasta contemporâneo: Darren Aronofsky. Adentre a mente deste diretor quando sentamos para analisar e compreender a sua curta, mas preciosa filmografia. (mais…)

  • Crítica | O Lutador

    Crítica | O Lutador

    O Lutador

    Darren Aronofsky traz de volta aos holofotes Mickey Rourke, em um filme quase autobiográfico do próprio ator. O Lutador utiliza uma abordagem com um caráter bastante documental, Aronofsky passa a seguir Rourke com sua câmera durante boa parte da filmagem, sendo bem comum, olharmos as costas do ator durante o longa, o que remete não apenas a um documentário, como a algo bastante pessoal, registrando os  acontecimentos da vida do protagonista.

    O filme conta a história de Randy “The Ram” Robinson, um astro de luta livre que foi muito conhecido durante os anos 80, mas que hoje em dia vive das glórias do passado, já que foi esquecido pela maioria, não só pelo desinteresse pela atração nos dias atuais, como também por sua personalidade autodestrutiva. A partir daí, se faz necessário um comparativo com a carreira do próprio Mickey Rourke, que como um dos grandes astros do cinema, caiu no esquecimento devido a sua vida repleta de excessos, e com isso passou a ganhar a vida fazendo filmes baratos, sem nenhum apelo do grande público.

    Randy tinha um futuro promissor, mas devido a uma série de escolhas equivocadas e da forma destrutiva que levou sua vida pessoal, chegou em um situação difícil financeiramente e familiarmente, já que nem sua filha o quer por perto. Na sequência inicial vemos uma série de montagens de sua época áurea, para logo depois o reencontrarmos vinte anos após, sozinho, com uma saúde já debilitada e se preparando para uma luta em uma escola infantil. A câmera demora a mostrar o rosto de Rourke, o que torna um triste reencontro, pois vemos que de galã de uma época, ele se tornou um homem de meia-idade completamentamente destruído pelo tempo e seu modo de vida.

    Stallone já havia ajudado o amigo em O Implacável (Get Carter), dando um papel de destaque para o astro em 2000, porém, o próprio Stallone estava tentando se reinventar na época e assim como o próprio Rourke, vivia de glórias do passado e filmes menores até se reencontrar com Rocky Balboa, de 2006. O reconhecimento merecido de Rourke, só viria anos depois com “O Lutador”, graças ao roteiro de Robert Siegel e a direção de Aronofsky.

    Os anos foram cruéis com Randy, que apesar de demonstrar um bom físico, notamos que  isso é devido ao uso exarcebado de anabolizantes, o que acabou lhe rendendo um problema no coração. Seu personagem sofre grandes dificuldades financeiras e com isso, se sujeita a trabalhar em um supermercado enquanto continua com suas lutas nos finais de semana. O contraste entre seus dois empregos é brutal, enquanto como lutador, recebe o carinho dos fãs e vê seus companheiros de luta como uma verdadeira família, o oposto ocorre no supermercado, onde recebe um tratamento degradante através do seu patrão.

    Rourke se doa por inteiro, transmitindo uma onda de emoções a cada momento em tela, deixando exposto a enorme sensibilidade da personagem, como quando recebe a notícia de quem não poderia mais subir aos ringues, ou mesmo nos diálogos com a stripper Cassidy, personagem de Marisa Tomei, que se identifica com Randy. Cassidy passa o mesmo que Randy, o pesadelo da idade, pois mesmo continuando linda, seus clientes já acham ela velha demais, e sente que em breve, terá que abandonar o palco. A troca do velho pelo novo.

    Entre os personagens centrais da trama, temos tambem Evan Rachel Wood interpretando a filha de Randy, Stephanie, e conhecemos um pouco mais do lado autodestrutivo de Randy e sua capacidade de magoar todos à sua volta, já que ela hesita em permitir uma reaproximação com o pai, devido ao passado onde foi magoada por ele. Rachel Wood traz uma grande atuação, mesmo com poucos momentos em tela. É impossível não sensibilizar com a vulnerabilidade da garota e as trocas de olhares que tem com o pai, muitas vezes sem necessitar de diálogo algum entre eles.

    Aronofsky adota um estilo narrativo completamente diferente de seus filmes anteriores, exibindo uma direção mais realista, quase documental, linear e pessoal, trazendo o expectador para a trama e apesar de não cair no lugar comum usando um tom melodramático, O Lutador emociona por esse pé na realidade, e claro, as atuações, bom roteiro e excelente direção, tudo sem soar clichê ou mesmo forçar uma identificação com o protagonista, como ocorre com tantos dramalhões por aí, pelo contrário, Randy é uma pessoa que vive cometendo os mesmos erros, autodestrutivo e trágico, mas que nem por isso, não se torna inesquecível.

    O Lutador é um filme sobre envelhecer, o que nos define como pessoas e o quanto podemos seguir adiante sem perder nossa identidade.

    Ouça nosso podcast sobre Darren Aronofsky.