Tag: Reginaldo Farias

  • Crítica | Roberto Carlos em Ritmo de Aventura

    Crítica | Roberto Carlos em Ritmo de Aventura

    Lançado em 1967, Roberto Carlos: Em Ritmo de Aventura é um filme de Roberto Farias, a época ainda não era diretor da Embrafilme, ainda que agradeça os esforços da Junta Militar  já no início do longa-metragem. Seus créditos iniciais tem desenhos do mocinho vivido pelo Rei, onde toca sua musica Olha dentro dos meus olhos em versão instrumental, e já tem ação desde o começo, ao mostrar o herói numa Ferrari vermelho, tocando Eu Sou Terrível ao fundo.

    Não demora ao roteiro mostrar suas características básicas, de quebra da quarta parede, uma vez que Roberto reclama com o diretor sobre os rumos da trama. Além disso, ele emula 007,  – até cita que não é James Bond – tal qual os Trapalhões faziam com blockbusters, tal qual a Jovem Guarda fazia com os sucessos do Rockabilly e Classic Rock internacionais.

    Além de ser um (belo) pretexto para tocar as músicas do disco homônimo do cantor e astro, o filme brinca demais com sua formula. O herói liga para o diretor, perguntando os rumos de sua vida,mostrando o roteiro sendo formado bem as poucos. É uma pena que ele não tenha sofrido uma re-masterização digna, pois o nível da produção era alto, as cenas filmadas no Rio de Janeiro, em São Paulo, com capangas do tal vilão misterioso imitando os estereótipos dos filmes de ação, além de ter um câmera nervosa, que acompanha a ação do protagonista e os movimentos dos possantes que o sujeito bonzinho conduz.

    Mesmo o papel de José Lewgoy é discutido, ele afirma que fez mais de 50 bandidos no cinema, sempre entrando pelo cano, e morrendo no final, e seu desejo é conseguir derrotar o mocinho. O desenrolar da trama não segue tão bem construído quanto seu início e ideia. A realidade é que o filme parece um bocado trash, pois ao tentar repetir os clichês das fitas antigas de ação e espionagem, se esbarra em um orçamento nada pomposo em comparação com as versões de Sean Connery para o agente criado por Ian Fleming.

    A ausência de trilha fora as músicas de Roberto  faz com que o filme aparente ser vazio de ação em alguns momentos, mas não demora a ocorrerem novos números de cantoria. O filme se leva tão pouco a sério, que o final é desconstruído, mostra o maniqueísmo dos filmes de ação indo por água abaixo, em um empate entre forças positivas e malévolas, com direito a entrada de tanques de guerra, paraquedistas etc, fato que de certa forma, justifica o agradecimento as forças armadas brasileiras. Há quem defenda que esse filme critica o período da Ditadura Militar recém instituído, graças não só ao final, que é completamente anti bélico, mas também por sua característica de desconstrução metalinguística, incluindo ainda Reginaldo Farias fazendo o papel de seu irmão Roberto, o diretor do filme, mas ao menos numa leitura mais simplista, Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura é só uma comédia com pitadas de inteligência, mas sem intenção de ser uma crítica ao período político do país nos anos 60.

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  • Crítica | Pra Frente, Brasil

    Crítica | Pra Frente, Brasil

    Pra Frente, Brasil

    Focando o ufanismo e discutindo a máxima de “Ninguém segura esse país”, Roberto Farias faz uma obra que tem em seu começo um clima muito semelhante ao das pornochanchadas. O intuito é ludibriar o espectador, fazendo-o acreditar estar vendo mais um espécime comum do cinema brasileiro dos anos oitenta e em poucos momentos de tela já é apresentada uma reviravolta. Misturando o ideal do Dream Team da seleção, destacando “as feras do Saldanha” — injustamente retirado do cargo antes da Copa de 70. Já na introdução é desenhado o mapa político e social de Pra Frente, Brasil, sem se valer de esterótipos bobos, de militares caricatos e maniqueístas e apresentando os oposicionistas como pessoas comuns, agindo cautelosa e disfarçadamente.

    O ano de lançamento da fita era 1982, enquanto os militares ainda estavam no poder, apesar de já não exercerem “a mão de ferro” com tanta veemência. A história começa mostrando Jofre Godoi, interpretado por Reginaldo Farias, um pacato servidor público que é confundido com um militante pelos militares, por estar no lugar errado e na hora errada. Logo que ele é capturado, é levado a um interrogatório. Sem circunlóquios, é submetido a algumas provações físicas e palavras de humilhação, envolvendo até a figura de sua esposa. O desaparecimento de Jofre faz com que a polícia entre em contato com o irmão dele, Miguel (Antonio Fagundes) e a esposa Marta (Natália do Valle), numa alusão a um defeito das autoridades, levantando a possibilidade ou de fingimento e sonegação de informação por parte da polícia ou de completa falta de estrutura e comunicação entre os órgãos.

    Jofre é submetido à violência, mas não sofre as surras calado; sua reação faz com que os torturadores ajam com mais dureza ainda. As mortes envolvidas no caso não são sequer noticiadas nos jornais. A personagem Marta serve de orelha para o discurso de que toda a imprensa é censurada. Do núcleo principal, somente Miguel tem clarividência sobre o panorama da nação: sua fala “Isso aqui não é a Suíça” evidencia o descaso com que o cidadão comum é tratado. Mesmo dentro do oikos de Miguel e Jofre, há quem ignore por completo a ausência de liberdade.

    A ansiedade e a preocupação fazem Marta ir às vias de fato, investigando o caso do desaparecimento de seu marido, inclusive utilizando-se de uma identidade falsa. Ela não vai presa por um triz. Paralelamente, Jofre é mostrado em seu cárcere, sem conseguir responder convenientemente aos seus agressores por tipificar-se categoricamente como um apolítico e de ideologia neutra. O típico sujeito normal que valoriza a família, a moral e os bons costumes e que, de um momento para o outro, tem todos os seus direitos retirados, como se não fizesse diferença alguma a sua postura anterior. Sua conclusão é de que aquele tratamento desumano é imerecido para todos os brasileiros.

    Mariana (da ainda muitíssimo bela Elizabeth Savalla), a amada de Miguel, engaja-se na militância de protesto. Num dos encontros com um dos “companheiros”, o personagem Zé Roberto é mostrado em uma iluminação diferente, com uma sombra sobre o rosto, emulando uma dualidade justificada pelo pretenso comportamento subversivo no âmbito político.

    Episódios comuns à historiografia são mostradas ou mencionadas no roteiro de Roberto Farias, Reginaldo Faria e de Paulo Mendonça, como, por exemplo, os casos dos “dedos-duros”; o controle das comunicações por meio de telefones grampeados; blitz organizadas em inúmeras estradas públicas. O posicionamento neutro não garantia aos civis a segurança de não serem reprimidos, graças à paranoia destes, pelo contrário, fazia com que fossem malvistos pelos membros da oposição que enxergavam-nos como acomodados, conformados com a situação calamitosa do Brasil. Os membros da repressão invadem os domicílios sem qualquer menção à permissividade, humilhando e maltratando mesmo os colaboradores do Regime. Até alguns dos homens fardados contestam a violência das ações, claro, de forma moderada, para que não sejam confundidos com os vermelhos.

    Miguel cansa de esperar a polícia e se posiciona contra os milicos, ameaçando o empresário Geraldo (Paulo Porto) de morte. Junto a ele, Miguel vai até a uma sessão de tortura, assistida por outros homens importantes, tornando óbvia a participação dos cidadãos influentes e comuns. Sem o apoio destes, a ditadura jamais seria legitimada.

    O desfecho narrativo ainda guarda algumas surpresas, como um embate entre um grupo de controle dos subversivos, que cerca Miguel e os seus dentro de uma casa, pondo em risco até a vida dos filhos de Jofre. O tiroteio generalizado deixa muitos mortos e é bem otimista se visto pelo lado dos protagonistas, até que ocorre a perseguição de carros na frustrada tentativa de fuga.

    O filme ficou somente um dia em cartaz: o regime censurou o copião logo que veio a público, por achar que o roteiro de Roberto Farias tivesse sido inspirado em situações reais, ligadas à Operação Bandeirantes, algo que realmente ocorreu.

    O momento da tragédia para Miguel é mostrada paralelamente à vitória da seleção de Zagallo no México, transitando entre o esporte inebriante, como os efeitos do ópio, e a dura realidade das pessoas comuns. Ao final, pouco antes do início dos créditos, há uma citação em texto, com a imagem da torcida congelada e os dizeres: “Este é um filme de ficção”. Traz uma dualidade ao tema, pondo em xeque a postura do governo e, claro, o papel alienante que o esporte tão idolatrado exercia na mentalidade do povo. Para a execução da fita, foi necessária muita coragem por parte de seus idealizadores.