Tag: Sondra Locke

  • Crítica | Impacto Fulminante

    Crítica | Impacto Fulminante

    Impacto Fulminante

    Sete anos depois da parte três da franquia Dirty Harry, Clint Eastwood decidiria pela primeira (e única) vez assumir a direção de um filme sobre seu personagem mais famoso, supostamente para salvar Impacto Fulminante da continuação caça-níqueis, um arquétipo que o ícone que era Callahan ajudou a construir no cenário de ação do cinema norte-americano.

    O tom de autoparódia é notado logo em seu início, quando Callahan agride verbalmente um bandido que acabou de ser absolvido pelo sistema legal, usando frases de efeito e um comportamento bastante canastrão, auge que se dá por uma veia sobressaltada na testa de Eastwood. Finalmente os métodos ultra violentos do policial são discutidos, gerando a partir daí uma atitude enérgica, de afastamento deste que é transferido de São Francisco para a Califórnia, onde deveria apenas descansar, o que evidentemente não ocorre.

    A galhofa do filme prossegue, com demonstrações de tiros de Dirty Harry com uma Magnum cujo cano se assemelha a uma vareta de tão grande, bem como o retorno de Albert Popwell em sua quarta participação na franquia, com seu quarto personagem diferente, dessa vez como o amigo do anti-herói, Horace King, um especialista em armas.

    Novamente o detetive se vê em meio a assassinatos em série, mas não ao modo comumente mostrado pelo cinema mainstream. Jennifer Spence, vivida por Sondra Locke, é uma artista que é violentada sexualmente. As lembranças do ato nefasto são traumáticas e reúnem as melhores e mais inspiradas cenas organizadas pelo diretor, que se vale de ângulos estratégicos para causar no público a mesma repulsa ao ato que a vítima sofreu.

    As pinturas da artista retratam as perturbações de uma mulher, remetendo à desconstrução do ser feminino, servindo até de esconderijo para os crimes que ela comete, assassinando cada um dos envolvidos em seu estupro, em cenas nas quais a violência caricatural serve de válvula de escape, como um “descanso” para o caos social em que o filme está inserido, justificando o tom burlesco dos opositores.

    Apesar do final apressado, que inverte os arquétipos de agressor e refém, construídos no decorrer do filme, Impacto Fulminante consegue, por muito pouco, ultrapassar a barreira de ser apenas uma sequência tardia, principalmente por possuir uma direção inspirada, que garante muitos bons momentos para um roteiro que não chega nem perto de ultrapassar a linha da mediocridade.

  • Crítica | Bronco Billy

    Crítica | Bronco Billy

    Bronco Billy - Poster

    Diante da carreira desenvolvida no gênero Western, Clint Eastwood inicia a década de 80 dirigindo mais uma produção que versa sobre o mesmo tema, mas com uma ótica diferenciada. Motivo que fez de Bronco Billy um fracasso comercial devido à alta expectativa que seu nome carregou desde o início.

    A produção visa a parceria do ator com sua esposa, Sondra Locke, representando um casal atípico como em Rota Suicida. A narrativa de Bronco estabelece uma homenagem à figura do cowboy, bem representado por Eastwood em diversos filmes, recondicionando-o a realidade contemporânea. O famoso Bronco Billy é um artista dono de um circo itinerante cuja intenção é apresentar um panorama do que foi o oeste americano. Se o western por excelência observa este passado glorioso, a figura de Bronco Billy e de sua equipe vivem um passado histórico do qual nunca fizeram parte, de fato.

    A tônica da produção é suave, próxima de um filme familiar, com uma das personagens mais doces do ator. A suavidade do roteiro foge das tradicionais tramas densas e situa parte de seu argumento de maneira cômica ao apresentar uma herdeira que casa com um picareta para manter seu dinheiro. É sua fuga deste casamento arranjado que a faz entrar na trupe de Bronco Billy.

    A leveza do roteiro de Dennis Hackin não esconde a intenção de demonstrar tais personagens como homens distantes da realidade, escolhendo uma fuga para viverem em harmonia. Um aspecto que produz uma análise precoce da carreira de Eastwood, que faria futuramente grandes obras revisitando sua trajetória, como Gran Torino e estrelando Curvas da Vida, uma obra sobre envelhecimento e tradição. De maneira sutil, o cowboy é visto como um ser destoante e uma espécie de representante de um passado agora inútil. Ao mesmo tempo que deixa clara a ode ao passado, na progressão de apresentações de Bronco e sua equipe.

    Mesmo sem um enredo brilhante, a história se destaca por apresentar um Eastwood diferente do habitual, mas conectado a uma narrativa com tom familiar, evocando com alegria mais um passado do que explicitamente sua verve violenta. Mesmo que seja evidente que a obra causaria um impacto negativo de bilheteria, Bronco Billy é cativante pela simplicidade.

  • Crítica | Rota Suicida

    Crítica | Rota Suicida

    The Gauntlet - Rota Suicida

    Encerrando a década de 70 com seis filmes na direção, Clint Eastwood explorou, a cada uma de suas produções, vertentes diferentes de histórias como se desafiasse seu talento a cada novo projeto. Rota Suicida retorna a vertente urbana de suas narrativas, apresentando o ator em uma de suas composições tradicionais – a de um policial durão – selecionado para uma missão específica: escoltar do estado vizinho, Nevada, até o Arizona uma prostituta para depor em um importante caso.

    Apoiado em um argumento simples de uma travessia urbana, uma espécie de road trip policial, o filme explora com qualidade as locações no Arizona e Nevada em uma trajetória aparentemente simples que se torna repleta de empecilhos. Uma missão que se complica quando o policial Ben Shocley descobre ser bode expiatório de uma conspiração que, na verdade, deseja matá-lo com a testemunha.

    Ao lado de Eastwood como o policial central, a parceira Sondra Locke visa uma relação cinematográfica iniciada em Josey Wales – O Fora-da-Lei, contracenando com o companheiro. A relação que se expande na tela intensifica a química do casal e equilibra a produção em sua vertente policial simultaneamente, quando flerta com o humor através do conflito entre policial e testemunha. Shockey, como o bronco policial traído pela corporação que deseja a todo custo realizar sua missão para provar sua capacidade, e Gus Mally como a impaciente testemunha a contragosto.

    Ambientada nas rodovias interestaduais destes dois estados citados, a história é quase inteiramente voltada aos problemas dos personagens que, tentando sobreviver e chegar à delegacia, se metem em peripécias fugindo daqueles que desejam matá-los. Um filme que necessita do carisma de seu casal. As cenas de ação são cruas, claramente filmadas sem nenhum efeito especial sobreposto, um estilo não mais utilizado atualmente e que transmite urgência, além de perícia técnica. Como Shocley fugindo em uma motocicleta roubada enquanto um helicóptero atira no casal, uma cena comum em tantos filmes de ação, mas bem filmada e angustiante. Sem mencionar a cena mais popular deste longa-metragem, um tiroteio contra um ônibus filmado na claustrofóbica longa sequência que carrega o ápice dramático e de ação da história.

    A ação predomina na condução narrativa sobrepondo-se a história e demonstrando, mais uma vez, a potência do diretor ao conduzir tais cenas. Mesmo que pareça redundante observar a evolução de Eastwood filme a filme, é interessante ponderar em panorama como, nestas primeiras produções, o diretor evitou um único registro, aventurando-se em estilos diversos, como se experimentasse uma paleta de composições cinematográficas buscando, acima de tudo, o conhecimento e o desafio. Fazendo das diferenças, a cada filme, suas características como diretor.

  • Crítica | Punhos de Aço: Um Lutador de Rua

    Crítica | Punhos de Aço: Um Lutador de Rua

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    A possante continuação de Doido Para Brigar… Louco para Amar, dessa vez capitaneada por Buddy Van Horn, começa semelhante à anterior, com uma trilha incidental tão baseada na música country e folk quanto no primeiro episódio. Mais uma vez, a caminhonete de Phillo e Clyde está na estrada para mais desventuras em cenários repletos de areia e personagens bidimensionais. O grupo de heróis procura mais porradaria.

    Logo se nota a diferença nas duas versões, pois nesse Punhos de Aço: Um Lutador de Rua as lutas são estilisticamente mais bem filmadas, com maiores variações de ângulos e planos filmados, além de um belo enfoque nas gostosas genéricas — algo que fez muita falta no primeiro filme. Com um espaço de apenas dois anos, a estética mudou, e Punhos de Aço mostra no primeiro ano da década como seria a tônica das comédias dos anos oitenta.

    Após sua primeira luta, Phillo demonstra enfado e cansaço, já não quer mais lutar. A maturidade o atingiu em cheio, e seu desejo de aposentar veio à tona. Ganhar o pão com o suor e sangue das lutas de rua é cada vez menos atrativo. O grande motivo disso ainda era o chute que Phillo tomara. O brucutu valente acusou o golpe, mas não deixa de frequentar os lugares onde Lynn (Sondra Locke mais uma vez) possivelmente poderia cantar. Apesar da aproximação da cantora, ele ainda se mostra ressentido pelo término.

    Os opositores dessa vez têm questões um pouco mais sérias, ainda que a abordagem seja leve e caricata ao extremo, mostrando grandes empresários engravatados que se entretêm com rinhas de animais silvestres. Os embates clandestinos são cruéis e desiguais, além de muito toscos, dado o seu caráter completamente irreal. Até a gangue das Viúvas Negras é repaginada, ainda sendo um dos alívios cômicos, mas bem menos risível que antes. Clyde tornara-se mais ativo na comédia, protagonizando cenas muito espirituosas, especialmente para um ator que não é humano. Mais do que isso, sua irmandade com Phillo é ainda mais forte que antes, com o auxilio… do símio até em questões amorosas.

    Phillo recebe uma proposta de milhares de dólares para retornar às brigas de rua. Ele reage recusando a proposta, mas mostra uma ponta de reticência na recusa. A prova da mudança de tempos é a mentalidade libertária de todos. Lynn invade o celeiro dos Beddoe e flagra Clyde e Phillo dormindo de conchinha, e como uma autêntica mulher pra frentex, não titubeia com a cena homo-besti-afetiva que assiste, e tem com o protagonista ali mesmo, diante do macaco e em meio a um ambiente sujo, com o terceiro elemento da equação claramente no cio. Sua volúpia o faz ficar mais forte, e suas exibições aumentam, tendo uma especialização em desmonte de veículos em questão de segundos. O orangotango apresenta uma força descomunal quando é ordenado pelo seu dono. As contravenções de Phillo, que visam ajudar seu parceiro animal, incluem dopagem, insinuação de estupro, rapto de animais silvestres, tudo isso para prosseguir até um swing-inter-espécies.

    Uma terrível trama envolvendo os vilões que tentaram contratar Phillo no começo do filme é desenvolvida, com o sequestro da mocinha. Apesar da execução geral ser melhor que a do primeiro filme, o desfecho é muito fraco, contendo uma mensagem agridoce demais. Outro problema é a longa duração, acumulados 113 minutos de uma comédia que carece muito de ritmo.

  • Crítica | Doido para Brigar… Louco para Amar

    Crítica | Doido para Brigar… Louco para Amar

    Doido para Brigar... Louco para Amar

    Hollywood sempre foi louca por fórmulas, e uma das mais largamente usadas era a junção de heróis com parceiros símios. Macacos, que geravam uma interessante interação com as figuras fortes e incorruptíveis do cinema, antes eram tidos como vilões e figuras de terror — vide King Kong de 1933 — mas aos poucos ganharam a simpatia do público e dos produtores de cinema.

    James Fargo, de Sem Medo da Morte e Golpe Mortal, dirige a comédia de valentões estúpidos protagonizada por Clint Eastwood 14 anos após a sua primeira parceria com Sergio Leone. Phillo Boddoe é um típico americano do sudoeste afeito a brigas descerebradas e desafios sem uma motivação maior que a pura demonstração de testosterona, e parceiro de Clyde, orangotango de estimação criado numa casinha no quintal de sua residência. A selvageria não é particularidade de Clyde, pois sua contraparte humana vive de forma quase tão silvestre quanto o animal, arrecadando dinheiro em lutas clandestinas por meio de apostas.

    Mesmo ainda jovem, Clint Eastwood, quando mostrado sem camisa, mais lembra um tiozão do que um legítimo lutador. O primeiro embate carece de maior apreço e grafismo visual, e é até porco na maior parte das filmagens, fazendo da fita um protótipo do que seria os filmes-pipoca dos anos 80. E, claro, a multiplicidade de desventuras que os brucutus da próxima geração fariam entre um filme de ação arrasa-quarteirão e outro.

    Eastwood já tinha uma carreira consideravelmente extensa: já havia dirigido meia dúzia de filmes até 1978, mas tal currículo não o impediu de assumir o protagonismo da comédia. O clima de filme totalmente descompromissado com a seriedade ganha contornos realistas após uma perseguição à dupla de motoqueiros escrotos que decidem ferir a honra do carismático orangotango, xingado com os nomes mais impróprios possíveis. Toda a infraestrutura montada para dar prosseguimento à vingança é atroz e totalmente impensável e faz de Clyde uma figura inteligente, dócil e até genial para os padrões de um animal… irracional. Isso se deve à sua capacidade de dirigir até um mini trator, inclusive com uma carteira de motorista de categoria E. Antes dos 30 primeiros minutos, Phillo acompanha uma dupla de motoqueiros até o lado externo de uma lanchonete e distribui sopapos, que são ouvidos dentro do estabelecimento pelos seus amigos.

    Tudo transpira humor e dos mais constrangedores. A matriarca Beddoe é mostrada como uma mulher ranzinza com início de calvície na sua fronte e com o resto dos cabelos desgrenhados. Os opositores, pretensos criminosos nazistas, são uma gangue de motociclistas dos mais imbecis, numa versão estúpida dos Hells Angels. As brigas de bares têm um show de barulhos quase onomatopeicos, onde até o vocalista da banda, que se apresenta no local, bate nos clientes, claro, sem interrupção da música tocada.

    O personagem mais bem desenvolvido da história é o macaco de doze costelas, que, graças à ossada semelhante à humana, consegue desenvolver capacidades enormes de raciocínio, como senso de humor apurado e ironia, algo que depois seria horrorosamente copiado em Planeta dos Macacos: A Origem. Uma das lutas, filmada junto ao rosto de um dos agressores, garante até mesmo um dos mais curiosos momentos narrativos do filme.

    Phillo é um anti-herói autêntico que não se importa com o politicamente correto, pois dirige enquanto bebe e carrega um animal silvestre sem as instalações necessárias para tal. Essa característica parece ser hereditária, visto que sua mãe prova toda a sua hospitalidade atirando com uma espingarda de cano longo nas motos dos arruaceiros que vêm importunar em sua propriedade. Como uma perfeita cowgirl, ela os espanta, numa cena à la Trapalhões.

    O romance com Lynn Halsen Taylor (protagonizada por Sondra Locke e escalada em razão do romance com Eastwood) é instantâneo e mal resolvido. Até determinado momento da trama, parece que a única relação estável da história será entre Phillo e Clyde, com direito até à música-tema para a trajetória — talvez por isso o orangotango o agrediu no início do filme. Phillo é tão preocupado com o parceiro que até procura um amor verdadeiro da mesma espécie para o animal. Ele sai de madrugada a fim de ajudar o bicho a praticar um estupro dentro da jaula de um zoológico e Clyde não pensa duas vezes: entra no lugar e manda ver na pobre e indefesa macaquinha, não sem antes causar furor na plateia ao acenar em tom de piada para a câmera. Curioso como após o coito de Clyde, Phillo quase perde uma luta. Talvez seu baixo rendimento seja motivado por ciúmes.

    O único confidente do personagem de Clint é o orangotango. Ele não se abre sequer com Orville (Geoffrey Lewis). A sua indestrutibilidade é posta à prova, mas todos que atravessam o seu caminho são absolutamente tolos, se deixando enganar pelos ardis do turrão lutador e seu macaco. Após executar perfeitamente uma armadilha, Phillo comemora levantando os braços, numa das cenas mais vergonha-alheia da carreira de Clint.

    O clima de comédia-pastelão faz da fita uma obra leve. Mesmo com a briga entre o casal de personagens principais, é até engraçado se analisar a discussão de Lynn com Phillo, pois é muito parecida com o término entre Locke e Eastwood, inclusive em como a história termina. Apesar de conter um caráter de redenção, em que o protagonista se deixa vencer por um “bem maior”, é até de se surpreender que o mocinho e a mocinha não terminassem juntos no final. Apesar de todos os pesares, Doido para Brigar… Louco para Amar possui uma veia cômica que acerta em grande parte do filme, e é condizente com o cenário de comédia da época, além de ter uma trilha country das mais prolíficas e bem escolhidas.