Crítica | A Menina Que Roubava Livros
O livro de Markus Zusak, em que se baseia o filme, é muito, muito bom. É um daqueles que dá vontade de reler. Seu grande trunfo é ser narrado pela própria morte, o que confere à trama um ponto de vista único, incomum. Além do narrador, o mais interessante do livro é o contraponto entre o encantamento de Liesel pela leitura e suas experiências com a morte. Há nele um quê de Fahrenheit 451 e de Preciosa, ao focar no poder transformador, libertador, redentor da leitura e da escrita. Contudo, devido a um roteiro que se preocupou apenas em pinçar os eventos – mas não as reflexões – que ocorrem no livro, esse enfoque se perdeu totalmente. E o filme se tornou apenas mais um (melo)drama de guerra. Uma pena. E mesmo o ato de “roubar livros” é vazio de significado, já que pouco se explora a motivação das personagens, tampouco a evolução do relacionamento entre elas – a ladra, Liesel, e a proprietária dos livros, Ilsa Hermann.
A direção é bastante burocrática, com poucos arroubos e nenhuma inovação. A falta de criatividade confirma-se na previsibilidade do desfecho de algumas cenas, mesmo para os que não leram o livro. E, apesar de o ritmo ser arrastado, o final é abrupto. Como se, de repente, o diretor se desse conta de que não tinha mais tempo e precisava concluir tudo em menos de 10 minutos. O que, obviamente, acaba deixando o espectador com a impressão de que perdeu um trecho da história.
Do elenco, vale destacar a atriz Emily Watson como Rosa Hubermann, mãe de Liesel. Apesar de sua performance não ter grandes momentos, é, sem dúvida, a personagem com o arco dramático melhor escrito e desenvolvido. Geoffrey Rush – Hans Hubermann – como sempre não decepciona e consegue uma boa interação com Sophie Nélisse – Liesel.
É um detalhe, mas incomoda bastante se o espectador começar a reparar: o sotaque alemão dos personagens, que vai e vem indiscriminadamente. Todo mundo já está habituado a assistir filmes ambientados em países “não-ingleses” e falados em inglês. Ninguém mais questiona por que em Os Homens Que Não Amavam As Mulheres, que se passa na Suécia, todos falam inglês. Tarantino, em Bastardos Inglórios, optou por colocar os personagens falando em seu idioma nativo. São duas boas opções amplamente aceitas pelo público. Então, por que optar por utilizar um sotaque alemão? E por que abrir mão disso temporariamente e colocar o prefeito da cidade discursando em alemão?
Mais uma adaptação de livro que decepcionou. Como filme “independente” é apenas mediano – a melhor nota seria 2,5. Como adaptação fica bem aquém das expectativas dos leitores. Quem não leu o livro, talvez aprecie um pouco mais.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.