Após o já previsto hiato de dois anos – quase o mesmo tempo do cânone – e após uma introdução pautada na comédia (Manny Happy Returns), onde seria o personagem de Jonathan Aris, Anderson, seria completamente remodelado, um sujeito crédulo, que procurava avidamente rastros de Sherlock pelo mundo – além disto, o prólogo contém uma mensagem em video-tape, contendo um desejo de feliz aniversário ao nobre médico, além de uma promessa de retorno. O início do episódio em si repete os aflitos minutos finais da segunda temporada, ainda que de modo diferenciado, com um forte teor de teoria da conspiração, de cumprimento inverossímil, mas deveras significativo e engraçado pelo deboche com que é feito.
O foco do programa é obviamente no retorno do Detetive (Benedict Cumberbatch), que permanece tendo a moralidade de suas “ações” discutida. A série de Steven Moffat retorna com direção de Jeremy Lovering. John Watson (Martin Freeman) parece abatido, deixou um bigode crescer, talvez para tentar se equiparar em velhice a sua contra-parte literária. Ele claramente sente muitíssima falta de seu parceiro, e esqueceu tudo e todos, inclusive sendo relapso com a governanta, senhora Hudson (Una Stubbs).
Sua primeira fala espirituosa é a declaração de sua heterossexualidade, ao afirmar que casará – é incrível como essa piada segue engraçadíssima. A edição segue frenética e video-clíptica, garantindo mais ótimos momentos de humor absoluto, como a cena em que Holmes finalmente encontra Watson, bem quando este pedirá a mão de sua noiva em casamento. O reencontro, quando acontece é súbito e emocionante, tão indelicado e sem tato quanto as investigações sherloquianas, mas o clima fúnebre é quebrado por mais uma série de tiradas cômicas. O tempo demasiado gasto nas explicações e teorias é tão extenso quanto no conto, A Casa Vazia, publicado na Strand Magazine em outubro de 1903.
Após uma trama não muito complicada, envolvendo o sequestro de seu amigo, Sherlock se lança desesperado ao encontro do perigo, para ver seu companheiro em segurança mais uma vez, trama esta que daria lugar a uma ainda maior. Antes dessa apresentação formal, há um breve momento de reencontro entre o investigador profissional e seus idosos pais, em mais um momentos cujo humor ácido (e até inconsequente) predomina.
O antagonista, Coronel Moran é substituído nesta versão por um Lord, um importante membro do parlamento, maximizando assim sua capacidade destrutiva, dando um significado ainda mais político aos seus atos e aumentando a importância de seus malfeitos, ainda que eles permaneçam tão destrutivos e explosivos quanto no original. A chegada da iminente morte, os dois parceiros se veem sem mais nada além da companhia um do outro, e a mágoa pelo abandono escorre pelas palavras do médico, para logo depois vir o perdão. Após o emocionante “epitáfio” o drama da morte é explicitado, mostrando uma teia de ações complicadas, que apesar de friamente arquitetada, contém muito simbolismo emocional, e claro uma teatralidade que faz toda a explicação mostrada por último ser discutível em relação a veracidade e conteúdo conspiratório.
As postagens de Watson continuam incomodando o sociopata funcional, tanto por seu caráter fantástico, quanto pelo ludismo excepcional, presente na distância entre os relatos romantizados e a realidade factual. O roteiro de Steven Moffat e Mark Gatiss consegue angariar todo o sentimento de alívio que o público sentiu ao ver seu herói retornar as páginas de seus contos, e a transferência desta expectativa para o episódio da TV é feito em grande estilo, superando as expectativas de todo o público que consome a programação da BBC One e elevando o nível das produções televisivas britânicas, fazendo desta algo que em nada deve aos sub-produtos da HBO.