A terceira tentativa de contar a história do cabeça de teia começa com uma pequena introdução de seu antagonista, Adrian Toomes (Michael Keaton). Sua intimidade é mostrada como a rotina de um homem comum, um sujeito de meia-idade que investe dinheiro se especializando na coleta de artefatos alienígenas pela Nova York após a invasão chitauri ocorrida em Os Vingadores, no entanto, acaba impedido pelas autoridades de continuar seus trabalhos. A crise e o capitalismo motivam a ganância do homem que usaria os esforços de seus empregados para formar uma gangue que cometeria alguns pequenos delitos, que se agravam com o decorrer de mais de duas horas de filme.
Após uma introdução ao estilo mockumentary, se estabelece que Peter Parker (Tom Holland) ficaria a disposição de Tony Stark (Robert Downey Jr.), fingindo ter um estágio com o magnata, mas na realidade tendo contato direto apenas com o motorista Happy Hogan (John Fraveau), responsável pela mudança da mansão dos Vingadores para o outro lado da cidade.
Haviam dois grandes receios em relação a este novo Homem-Aranha, e em ambos os erros não são completamente bem resolvidos. O primeiro medo geral é que fosse esse mais um filme de origem genérico, como foi o primeiro Homem de Ferro, Homem-Formiga e Doutor Estranho, e nesse ponto, o filme de Jon Watts ganha um pouco em originalidade, já que a referência principal não são os filmes da Marvel, e sim as comédias oitentistas ao estilo do que John Hughes escreveu e produziu. No entanto, fora dessa estética, não há espaços para grandes surpresas.
O outro aspecto de preocupação era que esse fosse mais um filme onde Stark seria super explorado, como havia ocorrido em Capitão América: Guerra Civil, e apesar do ator não ter tanto tempo de tela, seu personagem é utilizado como muleta emocional inúmeras vezes, ao ponto de deixar o público exausto diante de tantas situações óbvias e previsíveis.
Watts é um diretor que até então havia feito trabalhos mais independentes, sem um grande estúdio interferindo como certamente Kevin Feige e outros produtores fizeram neste longa. A Viatura (Cop Car) e Clown foram ótimas surpresas, mas o repertório do diretor em seus trabalhos anteriores é pouco utilizado aqui, fato semelhante ao que ocorreu com Louis Leterrier, em Incrível Hulk, e Gavin Hood, em X-Men Origens: Wolverine, claro, excluindo o montante de equívocos que foram ambos os filmes. A capacidade de trazer um filme bem resolvido esbarra num defeito de não se ousar em quase nada.
A esperança de risos fáceis repousou no núcleo adolescente. Holland não faz feio, reprisando os bons momentos do último filme do Capitão América, e seu melhor amigo, Ned (Jacob Batalon) também é um bom personagem, mas o restante é completamente dispensável, desde o interesse amoroso do herói, Liz (Laura Harrier), até a amiga Michelle (Zendaya) e o bully latino Flash Thompson (Tony Revolori). A tentativa de emular um Clube dos Cinco chega a ser irritante pelo conteúdo e espírito, sem reprisar a rebeldia adolescente presente no clássico.
No que diz respeito as ações do Abutre, se mostra o ponto alto do texto, mas infelizmente soa sub-aproveitado para mais uma vez dar vazão a tramas bobas, como as questões juvenis de Peter, as preocupações da bela Tia May (Marisa Tomei) ou as tentativas de agradar o Homem de Ferro. Keaton faz o que pôde em tela, mas mesmo suas pequenas ações são quebradas por interferências dos heróis mais graúdos, com o livre uso do artificio do Deus Ex Machina. O excesso de moralismo barato só não irrita mais do que a capacidade que a história tem de banalizar perdas, uma vez que até as pequenas bombas que são expostas causam estragos mínimos, mesmo sendo de um material alienígena de força e origem desconhecidos.
É irônico e curioso que não haja qualquer sacrifício ou perda significativa exatamente no filme de herói que mais se exigiria isto, já que o Homem-Aranha apesar de ser um personagem irônico e popular, carrega também um destino cheio de lições e tragédias típicas do homem comum. Nesse ponto, Homem-Aranha: De Volta ao Lar soa frio e genérico demais, reduzindo o ideal do vigilante criado por Stan Lee e Steve Ditko a um mero promoter de material de merchandising, com pouca alma e espirituosidade e muitas frases feitas, gírias e situações clichês, que servem mais para abastecer a necessidade de fan service do que a contar uma boa história em si. O avanço em relação aos filmes de Marc Webb – em especial O Espetacular Homem-Aranha 2: A Ameaça de Electro – é grande, mas ainda assim muito pouco para a expectativa criada em torno do amigo da vizinhança.
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