Aos 67 anos de idade, Sylvester Stallone ainda está no auge, esculpindo o mesmo material de sempre. A crítica insiste em afirmar o óbvio sobre sua limitação como intérprete e sobre seu esforço natural em agarrar-se a uma década em que seu sucesso – bem como o de seus colegas brucutus – era astronômico.
Sly sofre do preconceito do ator em um único estilo de papel. Síndrome que não afeta somente astros de ação, mas atinge-os com maior fatalismo. A decadência da perfeição física pode destruir a personificação viril e violenta dos personagens ostentados por sua carreira. Não deixa de ser verdadeiro que o ator manteve-se em sua zona de conforto, mas poucos são os atores que se arriscam em estilos diversos e são bem sucedidos no processo.
A nostalgia que cerca Ajuste de Contas, além da força de Sly, vem do fato de que dois grandes personagens boxeadores se evocam memorialmente em cena: Rocky Balboa, defendido em seis filmes pelo boquinha torta, e Jake LaMotta, uma das interpretações máximas de Robert de Niro em talento, aumento de peso e maquiagem protética.
A união destes atores traz a mística em torno da produção que faz do boxe enredo central. Sly e De Niro são pugilistas em fim de carreira que aceitam o desafio de uma revanche. A trama alinha-se com o conceito de personagens antigas que retornam para mais um assalto. Porém, em vez de trazerem à tona as personagens citadas, situam-se pela memória afetiva do público que deseja ver os atores de novo no ringue.
Juntos formam a dupla que ri de si mesma em uma história focada no humor. Riem da velhice, do anacronismo de atores que viveram outra época, no auge, em que a popularidade pesava mais que efeitos especiais. A predileção pela comédia é um foco necessário para que o filme não seja mais um que faz da luta uma redenção. A mudança de polo dramático pode não oferecer originalidade, mas evita que o memorialismo evoque a potência dos dramas de Balboa e LaMotta.
Pela segunda vez no ano, De Niro entrega uma boa interpretação. Não que seu papel exija muito do ator. Porém, considerando sua guinada desde a década de 2000, com performances canhestras, as atuações em Trapaça e nesta produção lhe dão um fôlego breve.
A aguardada luta dos rivais é bem realizada e não parece que os atores estão parcialmente em cena, substituídos por esportistas profissionais em diversos ângulos neste improvável crossover.
A parte mais insossa da produção centra-se no papel de Kevin Hart. O personagem é responsável pela realização da luta mencionada, mas se transforma no típico falastrão, como um Chris Tucker genérico. No elenco de apoio, Alan Arkin faz o mesmo velho debochado de sempre e, ainda que, como Sly, esteja repetindo o mesmo personagem desde Pequena Miss Sunshine, seu papel funciona pelo desconcerto e pela verborragia de palavras de baixo-calão que ainda divertem.
Rir de si mesmo e reverenciar o próprio passado evidenciam o anacronismo destes atores em relação ao modus operandi atual da indústria cinematográfica. De maneira leve, mesmo que sem completa coesão, realizam uma boa trama.