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  • Crítica | Life: Um Retrato de James Dean

    Crítica | Life: Um Retrato de James Dean

    Life

    Falar de cinebiografias não é algo fácil, especialmente quando estas cinebiografias são sobre rostos conturbados, polêmicos, ambíguos, quase sempre uma torrente de emoções e complexidade. O diretor Anton Corbjin já havia se aventurado nesse “gênero” com o cultuado Control, que retratava os problemas pessoais de Ian Curtis, da banda Joy Division. E agora em Life – Um Retrato de James Dean, Corbjin aborda os momentos pré-estrelato da vida e curta carreira de uma das promessas mais genuínas que o cinema já teve, James Dean.

    Curioso é notar que, ao contrário do que o sub-título nacional indica, o filme não é um retrato completo sobre o próprio Dean, mas sim um recorte de um momento específico de sua vida e que fora de grande importância para sua chegada ao estrelato: o desconforto diante das exigências dos estúdios, a reclusão durante a divulgação do filme Vidas Amargas e a amizade construída com o fotógrafo Dennis Stock, e que viriam a ser as imagens capturadas mais famosas de sua carreira. Falando assim, percebemos que este frame da vida de Dean é tão explosivo quanto qualquer outro de sua curta, porém marcante, carreira no cinema. Vemos Dean como uma faceta transbordada de conflitos internos, deslocada do próprio espaço ao qual pertence; um personagem rico e que, num estudo correto, é capaz de render uma análise fascinante sobre sua psique. Mas Corbjin falha justamente no sentimento desta parte da vida de Dean.

    E digo isto pelo fato de Life ser, antes de qualquer outra característica, um filme morno. Há sim, um claro objetivo do roteiro de Luke Davies (de Resgate de Família) em ser cuidadoso e detalhista na desfragmentação da figura de James Dean diante sua visão sobre o mercado cinematográfico, mas não apenas este peca ao ignorar aspectos indispensáveis à figura de James Dean (como sua relação conturbada com as mulheres, algo estranhamente romantizado no filme), como também na construção da relação entre Dean e o fotógrafo Dennis Stock, transformado aqui numa figura redundante e mal delineada por um roteiro e direção que empurram a história a passos de tartaruga. Falta intensidade e paixão em Life, o filme pesa a mão na narrativa modorrenta, na fotografia acinzentada e na contemplação de cada passagem. Life é um filme que tenta encontrar um tom específico e, misteriosamente, se excede nele.

    Tal desestimulação claramente atinge o trabalho do elenco. A escolha de Dane DeHaan para encarnar Dean, mesmo após suas presenças duvidosas em Versos de um Crime e O Espetacular Homem-Aranha 2, parecia promissora diante de sua aparente semelhança com o ator. Mas DeHaan parece bem longe de compreender a real postura de Dean e, num claro quê de indecisão sobre sua postura na tela (ressaltando que o ator havia recusado o papel anteriormente por se achar limitado demais para incorporar Dean), transforma o personagem numa série de trejeitos que tentam emular os aspectos mais visíveis de Dean, como sua fala lenta, o cigarro na boca e a própria personalidade indomável e irritante, transformando-o numa presença desengonçada e caricatural. Robert Pattinson se sai um pouco melhor na pele de Dennis Stock, embora o roteiro pouco valorize a importância de sua figura ao lhe criar um conflito familiar que, no fim das contas, pouco tem a dizer sobre o próprio e, consequentemente, anula qualquer sentimento emocional que poderíamos construir.

    O que faz de Life algo minimamente curioso são as passagens históricas daquele período de Hollywood, como as primeiras tentativas de James por seu papel em Juventude Transviada, além de participações de Ben Kinsgley como Jack Warner e Michael Terriault como o diretor Elia Kazan, presenças também fundamentais na ascensão de Dean. Destacam-se também as inserções das fotografias reais capturadas por Stock durante a reclusão de Dean.

    Mas isso é pouco diante do que Life fica devendo como recorte de um momento tão importante na vida do lendário ator, prejudicado ainda mais por uma narrativa que acredita piamente que o marasmo é seu maior triunfo. Ledo engano, e acaba que Life mais promete do que cumpre.

    Texto de autoria de Rafael W. Oliveira.

  • Crítica | Born To Be Blue

    Crítica | Born To Be Blue

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    – Te pagam dois mil dólares por um beijo e dois dólares pela sua alma. Sabe quem disse isso?

    – Não.

    – Marilyn Monroe.

    Através de diálogos assim, econômicos e não menos vorazes, que logo notamos o tom de Born to te Blue, uma obra não de primórdios, mas sim de recortes.

    Procurando retratar um momento, a obra usufrui de todo intimismo possível para nos situar dentro do controverso e genial mundo do lendário trompetista de Jazz Chet Baker.

    É sabido que o cultuado e problemático músico, que sempre oscilou entre seu brilhantismo dom e momentos auto-destrutivos, acarretados principalmente por seu envolvimento com heroína. Fruto de uma geração transgressora e, portanto, cheia de excessos é importante salientar que a heroína infelizmente assolou grande parte dos integrantes do movimento artístico-musical originado nos E.U.A.

    Aqui encontraremos um Chet em processo de recuperação, confrontando seu demônios, pagando por seus erros passados e tentando ressurgir mental e estruturalmente, buscando se desvencilhar do ostracismo e novamente se firmar no Hall que sempre lhe pertenceu, ou seja – em um palco com holofotes e plateia.

    O filme dirigido por Robert Budreau (produtor e também assinante do roteiro), mesmo não se arriscando, segue uma cartilha precisa e entrega ao público um bom material. Assumindo um caráter minimalista, as tensões se revelam contidas, porém não menos ‘explosivas’, ao contrário, denotam uma angústia que casa bem com o ritmo proposto.

    Abro um parênteses e aponto que, de todos os acertos do filme, indubitavelmente está principalmente a performance de Ethan Hawke que, assumindo a persona de Chet, acerta em cheio. Neste trabalho, o ator vai além do notório arquétipo e constrói uma sutil interpretação merecedora de todos aplausos possíveis. A força de sua interpretação fica mais evidente em seu olhar do que propriamente em seus diálogos, algo que se escancara em um notório momento chave da trama, que se dá entre o diálogo de Chet com seu pai. Há de se apontar também o belo trabalho de Carmen Ejogo (Jane) companheira de Chet que lhe dá bastante força em sua jornada, sendo para o artista uma âncora em seu momentos mais sombrios.

    Não obstante todos os fantasmas acarretados, acompanharemos um outro forte drama do músico que, após perder os dentes em uma briga de rua, deverá encontrar forças para reverter esse quadro, reformulando até sua embocadura se assim for necessário, superando s si mesmo e tudo o que um dia fez dele uma estrela.

    Afiado o cálamo, o garoto da Costa Oeste se encontrará em um complexo dilema de suas escolhas, em que se verá confrontado e advertido sobre isso, pois sabe que, mesmo que “cante com a língua dos anjos, se não tiver amor, será apenas um címbalo que retine”.

    Sobre a efígie de um Fauno, que deixa um rastro de poeira a cada movimento de seu percurso, entre encontros e desilusões, Chet volta aos palcos com seu atípico swing, e é então que as luzes se acendem, as cortinas se abrem e surge pro mundo My Funny Valentine e Born to Be Blue – canções extremamente românticas sublimadas por uma indomável angústia sem fim.

    O que fica evidente, não só ao desfecho mas ao longo de todo o filme, é que o maior inimigo da vida Chet sempre foi “seu eu”, que por muitas vezes, na busca por uma libertação, acabou se tornando refém de si mesmo.

    Texto de autoria de Tiago Lopes.