Crítica | O Prefeito
Após uma tentativa de poetizar em vídeo que dividiu opiniões em O Uivo da Gaita, na Operação Sonia Silk, Bruno Safadi volta a outro projeto conjunto, dessa vez dirigindo somente um filme da Tela Brilhadora, determinado como O Prefeito, uma crítica nada velada ao modo de governo tacanho que vêm afligindo o Rio de Janeiro a décadas.
O personagem de Nizo Neto serve de paralelo não somente ao atual mandatário da cidade, Eduardo Paes, mas coopta em si também os arquétipos de Cesar Maia e Luiz Paulo Conde, políticos da mesma linha administrativa do sujeito que ocupava o cargo no momento. Há na construção do personagem um bocado do comportamento datado e pitoresco de candidatos lacerdistas, de homens cujo discurso é doce as plateias, de comportamento retrogrado e métodos de governo superados a mais de meio século, a exemplo até de figuras históricas como Pereira Passos e seu desejo de expandir os horizontes via engenharia civil na cidade.
O cenário em que o personagem título se insere é a céu aberto, com um gabinete/escritório em meio as pedras das constantes obras que invadiram a antiga capital federal, dentro e fora da trama, uma vez que a intenção do político é audaciosa, visando separar a cidade de “São Sebastião” do resto do país, apesar de todos os gracejos ao receber o telefonema da então presidenta da nação,misturando tempos distintos em seu discurso e prática, referenciando a alcunha que a cidade teve no passado com a atualidade da crise.
O estilo do filme mistura alguns maneirismos pós modernistas com alusões a momentos ensaísticos, que se misturam ao discurso pragmático dos poderosos que só visam o comodismo que é manter-se no poder, propondo uma crítica intensa a governabilidade que impera na maior parte dos poderes executivos do Brasil, incluindo esferas federais, estaduais e municipais, contendo até contradições de inspiração em figuras canônicas do cenário atual e provecto.
As imagens estáticas curiosamente possuem muito mais movimento do que o conjunto de promessas de revitalizações de praças e notáveis marcos culturais da cidade. As partes em que o interprete se veste maltrapilho aludem a questões óbvias, como a intenção separatista, gritada por alguns inconformados mimados que viviam ao sul do país – piorada após a eleição de 2014 – e também a condição de miséria da maioria dos mandantes eleitos pelo povo, não do ponto de vista financeiro, mas sim de caráter, ética e existência.
O personagem composto por Nizo Neto e Bruno Safadi salva o filme da mediocridade, aludindo a versões clássicas da fantasia da ópera, sem abrir mão do cunho social e real que envolve a dantesca figura do megalomaníaco e aborrecido tratante, que ao se cansar de explorar o eleitorado, o mesmo que deveria ser seu objeto de serventia e honraria, passa tencionar alcançar feitos maiores, sem qualquer ação que lhe cause esforço que exijam mais de si, mostrando de modo até óbvio o engessamento do “protagonista”, perto do final da fita, o que evidentemente não estraga a experiência do espectador.