Crítica | Caçada Mortal
Aos 60 anos de idade, Liam Neeson vive um novo momento da carreira. Após diversas grandes interpretações em papéis dramáticos – incluindo o que lhe rendeu o Oscar de Melhor Ator, em A Lista de Schindler –, transformou-se em um ator de ação em razão da sempre competente performance, do carisma e do porte de 1,93 metros.
Desde 2005, o irlandês escolheu projetos de filmes de ação, como Busca Implacável, Desconhecido e Sem Escalas, nos quais usa o mesmo estilo de personagem com eficiência suficiente para agradar aos fãs do gênero. Nesta nova produção, a ação fica em segundo plano, dando lugar a uma narrativa policial baseada em um dos personagens criados por Lawrence Block.
Detetive particular não licenciado, o ex-policial Mathew Scrudder é a criação mais famosa do autor, sendo estrela de 17 livros até agora e, nos cinemas, também foi interpretada por Jeff Bridges em 1986. Caçada Mortal, de Scott Frank, adapta a décima obra com a personagem, um alcoólatra em recuperação que, após uma crise de consciência, abandona a corporação. A trama roteirizada e dirigida por Scott Frank (escritor de grandes obras como Irresistível Paixão e O Nome do Jogo, e tragédias como Wolverine: Imortal) é bem adaptada no estilo narrativo de Block. A prosa seca, sem muitos floreios, mantém a eficácia de sua personagem e, no filme, este recurso é apresentado ao longo de uma trama que não exagera em reviravoltas e ganchos, como diversas investigações cinematográficas atuais.
A primeira cena, que se passa em 1991, apresenta o passado de Scrudder, aproveitando cada segundo exibido em tela. Simples e rápido, o momento serve para que o público compreenda o passado turbulento do ex-policial. A composição do detetive não reinventa nenhum padrão, mas segue o estereótipo tradicional do homem com um passado negro vivendo um presente difícil entre a negação e certa ironia contida. Uma figura niilista que, mesmo sendo um bom moço, parece não se importar com ninguém. O detetive é contatado por um traficante de drogas para investigar os responsáveis que sequestraram e mataram sua esposa. Uma morte que se revela parte de uma série maior de assassinatos.
O assassinato e a investigação são os fios condutores da trama. Os elementos típicos de um policial herói, centrados em Scrudder e em sua mudança pós-álcool, fazem parte da concepção do gênero. O suspense carrega boas inferências de crueldade e mantém-se bem durante a trama. Trata-se de um enredo tradicional, portanto nada mais natural que o crime em si seja apresentado de maneira que choque o público inicialmente, para aliviá-lo na resolução final em que, na medida do possível, pune criminosos.
O bom suspense não se consagra por completo devido à presença de um personagem juvenil que descaracteriza a intenção da história. Por pouco, o jovem não cai na armadilha de ser um gancho para a inevitável cena em que ele tenta algo heroico e se torna um fardo que deve ser salvo pelo personagem central. O recurso que tenta humanizar a figura fria do detetive quase é responsável por destruir a história e o suspense desenvolvidos em cena. Há muitos policiais da ficção que trabalham com parceiros esporádicos e uma equipe informal, porém, dentro da trama, parece inverossímil que o ex-policial queira envolver um adolescente em uma trama delicada.
A repetição de personagens semelhantes em produções próximas – o personagem de Sem Escalas também era um ex-policial alcoólatra, por exemplo – retira parte da identificação literária de Mathew Scrudder. Em compensação, Neeson demonstra, além da competência, se divertir nesta nova fase da carreira, e poderia representar a personagem em outras futuras adaptações. Afinal, aos 76 anos, Lawrence Block não para de escrever. Como um bêbado sorvendo sua bebida.
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