Crítica | Você Nunca Esteve Realmente Aqui
Precisamos falar sobre influências, e o quanto filmes como Drive moldam uma década no Cinema – sem força, a princípio, para ir além de um espaço decenário desses. A estilização da violência urbana que Nicolas Winding Refn emprega em seus filmes-artifício foi bonita e divertida demais em 2011 para ser despercebida e desperdiçada pela indústria sedenta por qualquer (qualquer) sinal de ponto de vista minimamente diferente. Qualquer naturalismo por um momento pareceu superado por uma linguagem de videoclipe hipnótica, feita para vender trailers e para os GIFs da internet. Sete anos depois, sobrou só seus admiradores, adoradores de um cineasta que estiliza a base de neon e sangue um nada existencial de proporções abissais, uma vez que Refn é atirador de um tiro só, feito a roteirista Diablo Cody e seu Juno, no “distante” 2007.
Dez anos depois, Lynne Ramsay, a diretora que narrou a psicologia da psicopatia juvenil em Precisamos Falar Sobre Kevin, filme hoje cultuado e desprezado anos atrás nas premiações volta para falar sobre a violência que habita o oculto das cidades e seus habitantes. Não por trás dos olhos de um garoto bem criado que resolve entrar numa escola com uma metralhadora, e sem apostar numa estilização recompensadora e fácil, mas pelos passos de Joe, um homem simples que mora com a mãe – um ótimo filho e que quando não a está ajudando a tomar banho e se deitar, ganha a vida sendo contratado para salvar garotas presas em cativeiros imundos, escravas sexuais que tem seu calvário terminado pelas mãos de Joe; um fantasma, uma sombra que, nessa altura do campeonato, precisa manter sua existência em segredo para proteger o seu único elo emocional, sempre de camisolas.
Você Nunca Esteve Realmente Aqui pegou de assalto o festival de Cannes com duas coisas: primeiro pela força da história e os rumos que o roteiro de Ramsay toma a partir de sua segunda metade, achando na violência que baseia e começa a exalar dos caminhos de Joe um ninho perfeito para observar, e propor reflexão acerca da influência de um homem na vida de pessoas totalmente alheias a ele que, devido suas condições de abuso, jamais o agradecem por sua salvação tão inglória. E segundo por Joaquin Phoenix, o que mais seria? Aqui, e sempre imerso nos seus papéis, o ator encarna um anti-herói de aluguel da forma visceral de sempre, sem medo de cogitar chegar nos limites de uma atuação, o famoso overacting, em cenas pesadíssimas por vezes embaladas por uma bela trilha-sonora que desafiam tanto os nervos do ator, quanto os do seu espectador.
Nunca acreditamos na salvação de Joe pois o passado o condena sem piedade, traumatizando-o e corroendo sua sanidade mental num nível absurdo de auto flagelação, sendo que as vezes nem é possível cobrá-lo, ou exterminá-lo – lembremos aqui da cena do quarto, quando o choro do justiceiro é enorme e ecoa em suas paredes. Temos aqui, portanto, um estudo de personagem intenso e dos mais resumidos acerca de seu potencial, ainda que de boa forma, sendo objetivo até não poder mais. Tudo o que importa, mirando alguma posteridade aqui, é que Hollywood finalmente está percebendo o vasto potencial de Phoenix em papéis mais dark, tal esse caçador de recompensas bem ao estilo Travis Bickle, de Taxi Driver. Um dos melhores momentos do ator; é dele o filme.
Facebook – Página e Grupo | Twitter | Instagram.