Crítica | Trainspotting: Sem Limites
Lançado em 1996, Transpotting: Sem Limites funciona como um manifesto sobre parte da da juventude junkie britânica, focalizado em tempos modernos, na contemporaneidade da década de noventa. As escolhas estéticas de Danny Boyle evidenciam uma afeição a psicodelia, seja nas cores gritantes utilizadas nos figurinos dos personagens de idade precoce, como também nos cenários construídos em volta dos meninos e meninos que se picam de heroína e outras substâncias.
A câmera mergulha no torpor de Rent (Ewan McGregor), Spud (Ewen Bremner), Sick Boy (Jonny Lee Miller), Tommy (Kevin McKidd), Begbie (Robert Carlyle), e Diane (Kelly Macdonald), em especial do primeiro, que é o contador da história principal. A rotina destes é a de habitar o mesmo local sempre, usando todo tipo de entorpecente, vivendo seus dias de maneira insalubre, sufocando seus dias e sonhos com a maior quantidade de heroína possível.
O aspecto empalecido dos personagens faz com que pareçam os mortos vivos de George A. Romero, e o visual ajuda a compor a aura de pena e lástima pelo que vivem. Ainda assim, tanto o roteiro de John Hodge – por sua vez baseado no romance de Irvine Welsh – quanto a direção de Boyle se cuidam para não soar exacerbadamente moralista ou algo que o valha, ao contrário, o que se assiste é a deterioração da vida sem cortes, sem rodeios e sem medo de pôr o dedo na ferida.
A dicotomia se mostra por exemplo na comparação do cartaz do filme, onde os personagens são exibidos eufóricos e cheios de vida, em comparação com um dos momentos mais acachapantes e desconfortáveis do longa, que se passa por volta dos quarenta minutos, quando ocorre um óbito inesperado por eles entre eles, que deixou em seus corações mentes uma marca indelével e duradoura.
A miséria existencial, o vazio e sensação de não viver mesmo falam muito mais alto que qualquer discurso autoritário, e de certa forma, a vivência de Rent e dos outros é mais uma mostra do quão equivocada é a política anti-drogas adotada na Europa e no restante do mundo, uma vez que a caça as bruxas instaurada a partir do período que rondava a Guerra Fria só ajudava a marginalizar e isolar os adictos, ao invés inclui-los no ambiente social dito saudável.
Trainspotting dialoga muito com Kids, primeiro filme de Larry Clark, que foi lançado um ano antes, cujo diretor se dedicaria seu cinema a falar de delinquência juvenil e termos semelhantes. A narração de Rent não expõe mais do que deveria, ao contrário, complementa as ações mostradas em tela, e ajudam a formar o background dos personagens, bem como todo o entorno. O filme de Danny Boyle não busca traçar soluções fáceis para as questões propostas, ao contrario, sua função é elucubrar sobre uma fração da sociedade, tentando julgá-la o menos possível, servindo quase como um produto documental.