O episódio inicia grandioso, dando mostras em flashback do passado do clã ligado à figura canina, remetendo aí início do clássico primeiro filme de Basil Rathbone. A direção de Paul McGuigan varia entre o reverencial e o absolutamente novo e atual. Quando pressionado, Sherlock solta verdades e impropérios nada agradáveis relacionados quase sempre aos parceiros sexuais dos seus chegados, o que levanta para eles, a possibilidade de o Detetive nunca estar bem com a própria sexualidade, um equívoco enorme da parte deles, visto que Holmes faz questão de não ter quase nada de libido ativa, ao menos a olhos vistos.
A reportagem documental, substituindo o relato escrito do manuscrito original, é um artifício interessante e explicativo, sem apelar para o didatismo forçado. Sherlock resolve destrinchar o perfil do cliente, Henry Knight (Russell Tovey) e John o reprime, pedindo para que não se exibisse, e de pronto é respondido por ele: “É isso que nós fazemos”.
Martin Freeman melhora cada vez mais, sem ele a boa atuação de Benedict Cumberbatch jamais seria notada, ele é pó autêntico “Boswell”. Sherlock fisga Fletcher, um guia turístico local que vira o grande cão, através do orgulho bobo do rapaz, desmerecendo seu discurso, e o menino prontamente mostra o gesso com a marca da enorme pegada como prova factual. A dupla efetua um sem número de carteiradas para adentrar a base experimental Baskerville. Os paralelos e reinvenções dos personagens da novela são muito curiosos e interessantes: Stapleton, Mortimer, Barrymore, cada um tem grande significância na mensagem final.
O roteiro de Mark Gatiss cobre inclusive os pontos óbvios do romance, tornando a história mais crível e diferenciada das outras versões. A temeridade que acomete Holmes após ver a criatura é impressionante, especialmente pelo fato dele ter descartado o impossível, e assim, ter encontrado a verdade. Sherlock que sempre se manteve afastado dos sentimentos, como o medo, treme ao falar do monstro. A possibilidade de ele estar sob efeito de alguma droga é descartado, a esta altura evidentemente, com uma demonstração dos seus dotes detetivescos, afiados mesmo nesse momento difícil.
Tudo no episódio remete aos signos de um filme de terror: o suspense, as vítimas ensaguentadas, a criatura misteriosa. O contraste entre a modernidade dos laboratórios, sempre asseados, e a figura bestial medieval compõem um cenário perfeito. A verdadeira monstruosidade se manifesta como uma arma química, apropriação intelectual esta das mais bem pensadas, que tornam todo o conto em algo realmente temível. O trauma infantil impingido a Henry evolui e causa uma repressão nas memórias do jovem contratante, alterando seu discurso para algo fantasioso. A alucinação da névoa faz Sherlock enxergar no vilão o rosto de Jim Moriarty, o que já prepara o campo para o episódio final evidenciando quais são os reais temores do detetive consultor.
Eu tb não curti muito esse.