Depois de seus dois thrillers, Suicidas – bom, mesmo com as falhas naturais de um autor iniciante – e de Dias perfeitos – cujo final boa parte dos leitores achou detestável – Raphael Montes apresenta ao leitor uma coletânea de contos de terror numa estrutura fix-up. A denominação é gringa mas quer dizer simplesmente que os contos são independentes entre si, mas interligados por um ou mais elementos, podendo ser lidos na ordem que o leitor preferir. Realmente, podem ser lidos em qualquer ordem, mas em O Vilarejo o mais indicado é deixar o último por último mesmo.
São sete histórias curtas, cada uma delas enfocando um dos moradores do vilarejo e tratando de um dos sete pecados capitais. Montes faz uso de um recurso narrativo já conhecido, mas sempre interessante, afirmando que traduziu manuscritos em que constava referência a um teólogo alemão – Peter Binsfeld – que realmente existiu e escreveu sobre a classificação dos pecados, relacionando-os a demônios.
“De acordo com seu trabalho, cada um dos demônios, os Sete Reis do Inferno, era responsável por invocar um pecado capital nos seres humanos: Asmodeus (luxúria), Belzebu (gula), Mammon (ganância), Belphegor (preguiça), Satan (ira), Leviathan (inveja) e Lúcifer (soberba).”
(pag.8)
Obviamente é uma honra ter seu nome citado junto ao de Stephen King na mesma frase (na capa), porém, sem querer desmerecer o autor, exceto pelo fato de partilharem do mesmo gênero, o terror, a comparação com King é um tanto quanto exagerada. Seja pela produção de Montes, parca em relação a de King, seja pelo estilo. Enquanto King é bastante descritivo, quase prolixo, Fontes é bem mais econômico nas palavras, tem um texto mais seco e, portanto, mais dinâmico, sem delongas.
Os demônios nomeiam os capítulos, que tratam do pecado a eles relacionado. É interessante perceber como as histórias se entrelaçam, como o caminho dos personagens se entrecorta. Sob esse ponto de vista, as narrativas estão bem estruturadas. Contudo, em relação à construção de cada conto há algumas lacunas que poderiam ter sido melhor “preenchidas”, isto é, trabalhadas. Em três deles, o desfecho pode ser apreendido bem antes de revelado pelo autor – algo que, num texto tão curto, chega a ser brochante. Mas no geral, os textos se completam bem e algumas passagens são bastante chocantes, para não dizer indigestas.
Vale destacar o projeto gráfico. As gravuras de Marcelo Damm que ilustram cada conto são impressionantes e complementam o clima sombrio das histórias. É um livro que possivelmente agrada mesmo aos leitores não habituados ao gênero.
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Texto de autoria de Cristine Tellier.