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  • Crítica | Mais Forte Que o Mundo: A História de José Aldo

    Crítica | Mais Forte Que o Mundo: A História de José Aldo

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    Afonso Poyart surgiu como uma promessa de grande diretor do cinema blockbuster brasileiro. Seu primeiro longa metragem, Dois Coelhos, foi injustamente tratado como mera cópia do cinema estrangeiro. Três anos depois, o brasileiro foi chamado para conduzir Presságios de Um Crime, um filme americano que foi mal recebido por crítica e público. Após essa irregularidade, o projeto seguinte seria uma cinebiografia de um esportista manauara célebre, o campeão peso pena do UFC José Aldo, que ainda está em atividade e que acabaria por recuperar a boa forma logo após o lançamento do filme, vencendo novamente no circuito profissional.

    Mais Forte Que o Mundo: A História de José Aldo começa tão estilístico quanto o filme anterior do diretor, mostrando José Loreto no octógono, para logo depois retornar ao passado que construiu seu caráter, tendo de lidar com situação de violência doméstica que ocorre entre seus pais. A fase de crescimento rumo a vida adulta envolve um drama cheio de humilhações, brigas e rejeições, acompanhado de cenas que abusam do slow motion como manifesto de seu cinema.

    A condução de Poyart lembra demais a de Scott Spiegel em Um Drink no Inferno 2: Texas Sangrento, no sentido de usar ângulos diferenciados para exibir suas cenas, ainda que sejam executadas desse modo por pura gratuidade. Não há motivo ou causa para o registro desse modo. É curioso como essa imaturidade na condução dialoga com o crescimento de caráter de Júnior, nome pelo qual o personagem de Loreto é chamado nesse início. O futuro atleta é mostrado como um sujeito impulsivo, irascível e a beira do colapso o tempo inteiro e demora para finalmente atingir o seu lugar ao sol, claro, ao som da péssima música motivacional de Charlie Brown Júnior.

    A trajetória que o roteiro de Poyart (com auxílo de Marcelo Aleixo Machado e Marcelo Rubens Paiva) é piegas e repleto de personagens que mal exigem de seus atores, mesmo que estejam no elenco medalhões como Milhem Cortaz, Cléo Pires, Claudia Ohana, Jackson Antunes e Paloma Bernardi. Diante de todas essas performances mecânicas, surpreende o desempenho de Rafinha Bastos como Marcos Loro, o amigo de José que se dedica a abrir portas para o herói do longa, além de ajudar a pavimentar seu caminho rumo ao sucesso. O trabalho de corpo que Bastos faz é interessante, mas só entregue em uma parcela pequena do filme, logo sendo deixado de lado, desperdiçado para dar lugar a interpretações limitadas dos outros atores.

    Falta emoção, falta textura, os personagens estão prestes a conseguir um feito praticamente impossível, no entanto não há gravidade nas atitudes e sentimentos destas pessoas. Mais Forte Que o Mundo mira o retrato da superação via esporte, mas alcança apenas a tola crena de que a meritocracia é capaz de transformar a vida de um menino pobre na de um homem rico e bem sucedido.

    Não há inspiração, nem na feitoria e nem no inconsciente do espectador que termina de ver as enfadonhas duas horas de exibição, muito menos há a verve de transgressão que ocorreu em Dois Coelhos. Poyart que aparentava ser um cineasta diferenciado e pouco afeito a ideia de repedir paradigmas do cinema brasileiro faz seu produto ser ligeiramente superior aos recentes Tim Maia, Somos Tão Jovens e afins, sendo melhor que esses apenas no texto, que não soa tão oportunista quanto estes outros, mas ainda assim muito aquém da grande quantidade de elogios tecidos a respeito deste que é para muitos favorito a disputa do Brasil pelo Oscar e até da emocionante jornada de Aldo rumo ao cinturão de peso pena.

  • Crítica | Presságios De Um Crime

    Crítica | Presságios De Um Crime

    Presságios de Um Crime - Poster

    Pensado inicialmente para ser uma sequência de Se7en: O Sete Crimes Capitais, Presságios de Um Crime rodou durante muito tempo nos noticiários de cinema nos últimos anos. O projeto foi atrelado a diversos diretores ao longo do tempo, com rumores fortes apontando, em meados de 2005, que Paul Verhoeven finalmente tiraria o filme do papel. Bruce Willis e Morgan Freeman chegaram a ser apontados como protagonistas, mas, como podemos ver, nada disso aconteceu. No final das contas, o roteiro foi filmado pelo brazuca Afonso Poyart – diretor de 2 Coelhos – e o elenco encabeçado por Anthony Hopkins.

    Na trama, o eterno Hannibal Lecter interpreta John Clancy, um médico com poderes psíquicos que vive em isolamento após a morte de sua filha. Ele é recrutado por seu grande amigo e agente do FBI Joe – interpretado por Jeffrey Dean Morgan – para auxiliar em uma série de mortes perpetradas por um serial killer que não parece seguir nenhum tipo de padrão para escolher suas vítimas. Ainda que relutante, Clancy aceitar ajudar seu amigo e se une a ele e a sua cética parceira Katherine, vivida por Abbie Cornish, para tentar prender o assassino.

    Percebe-se de início todo o senso estético de Afonso Poyart. O diretor filma com uma minuciosa atenção a todos os detalhes que compõem o ambiente onde acontece cada cena. É interessante perceber como cada cenário de crime possui uma “temperatura de cores” de acordo com o momento de cada vítima. No que diz respeito à relação dos personagens, existe uma atenção especial em demonstrar a tentativa do protagonista em se manter sempre distante, mesmo do seu amigo. Porém, ao começar a se aproximar da agente Katherine, o diretor brasileiro não consegue esconder a falta de química e sincronia entre Hopkins e Abbie Cornish. Na condução de algumas sequências de ação, o diretor também faz um bom trabalho, principalmente na primeira hora de filme. Entretanto, na sequência final Poyart acaba errando a mão, além de ser extremamente prejudicado por efeitos especiais ruins.

    O roteiro do filme começa interessante, mas ao longo do tempo vai perdendo força e passa a sucumbir a soluções fáceis ou que já foram utilizadas em películas de histórias semelhantes. A maneira como o assassino, interpretado por Colin Farrell é introduzido, é bem interessante e remete a uma cena do filmaço Fogo Contra Fogo, dirigido por Michael Mann e estrelado por Al Pacino e Robert DeNiro. Há ainda um grave problema de mudança de tom no terço final da obra. A forma como o “complexo de Deus” do assassino é apresentado por ele é bem interessante, porém poderia ser melhor trabalhada. Ele conta tudo de uma maneira parecida com o que fazem os vilões dos filmes de 007, deixando pouco espaço para a imaginação do espectador ou para uma possível surpresa. Enquanto durante todo o tempo o filme exibe um trabalho de investigação com pitadas sobrenaturais de maneira sóbria, ao se aproximar do filme tudo isso é substituído por um tom histérico que destoa completamente de tudo que gere algum tipo de apreensão, mas somente uma vontade de que o final chegue logo antes que o filme se torne constrangedor.

    Anthony Hopkins claramente atua em piloto automático, tendo pouquíssimos momentos de brilhantismo. Abbie Cornish e Jeffrey Dean Morgan, intérpretes da dupla de agentes do FBI que procura o personagem de Hopkins, defendem com dignidade seus papéis e funcionam bem quando estão juntos. Porém, somente Morgan funciona em dupla com Anthony. Quando chega a vez da lindíssima Abbie contracenar com o veterano, as coisas não funcionam tão bem assim. Colin Farrell chega a beirar a caricatura, mas é verdadeiramente o melhor do elenco em cena. Ainda que tenha pouco tempo em tela, ele consegue roubar o filme para si. Seu olhar enlouquecido e sua inquietação constante o transformam em um personagem assustador.

    Não dá pra saber se todo o tempo que demorou a ser produzido e as inúmeras vezes que o roteiro foi reescrito afetaram a qualidade do projeto, mas Presságios de Um Crime não foi a estreia dos sonhos do brasileiro Afonso Poyart. O resultado final é um filme irregular, que possui alguns poucos bons momentos.

  • Crítica | 2 Coelhos

    Crítica | 2 Coelhos

    O estreante Afonso Poyart cria uma narrativa inédita no cinema brasileiro, vomitando uma série de referências à cultura pop, aos quadrinhos (a apresentação de seus personagens é um bom exemplo), games (uso de computação gráfica simulando jogos como GTA) e o próprio visual nos remete a alguns diretores do cinema norte-americano, como Zacky Snyder, além de uma narrativa visivelmente influenciada por grandes mestres como Quentin Tarantino. Contudo, essas referências servem apenas como elementos no universo apresentado pelo cineasta. As influências existem, mas em nenhum momento a identidade da nossa cultura é perdida.

    2 Coelhos conta a história de Edgar, que passa seus dias ou vendo filmes pornográficos em seu computador ou jogando videogame em sua TV. Seus planos como jovem adulto não deram certo e agora ele elabora um plano complexo em que visa resolver dois problemas simultaneamente ao concretizá-lo. No decorrer do filme, descobrimos a ligação do protagonista com Walter (Caco Ciocler) e Julia (Alessandra Negrini).

    Com uma estrutura narrativa não-linear e intervenções gráficas para explicar alguns trechos da história, 2 Coelhos é mais do que competente. Apesar do excesso visual, o que acabamos vendo é algo autêntico. O roteiro do próprio Poyart fala de temas recorrentes no cinema brasileiro, como corrupção e violência, com um ar de filme noir. Edgar é um personagem dúbio, com narração em off, Alessandra Negrini é a femme fatale, e que lugar melhor para ambientar uma história do gênero do que na cinzenta cidade de São Paulo.

    Assim como em Tropa de Elite, a trama expõe um Brasil corrupto, com leis que beneficiam os favorecidos e prejudicam aqueles que realmente precisam dela. Contudo, o filme não tem a pretensão de colocar o dedo na ferida e escancarar as mazelas sociais do povo brasileiro e nem de ir à fundo na corrupção. Até porque não é esse o objetivo do longa. O filme é uma forma de desabafo, mas mais do que isso, 2 Coelhos quer mais é brincar com o tema de forma ácida do que fazer um filme-denúncia.

    A direção e fotografia são mais do que competentes, mas pecam pelo excesso, porém é algo que é facilmente relevado levando em conta que este é o primeiro filme do diretor, além do que, a forma como o roteiro se encaixa com o desenvolvimento da trama faz com que esqueçamos isso. Destaco a cena de tiroteio que ocorre na praça Roosevelt, em São Paulo, digna de filmes policiais norte-americanos com grande orçamento.

    O elenco tem seus problemas e acertos. Fernando Alves Pinto se sai muito bem como protagonista, é um personagem que sabe o que quer. Alessandra Negrini (sempre linda) parece não se firmar na sua personagem e em alguns momentos parece ligada no piloto automático. O mesmo não pode se dizer de Caco Ciocler que praticamente não tem diálogos durante o filme e ainda assim rouba a cena, tudo isso apenas com expressões corporais. Roberto Marchese interpreta o deputado Jader e coloca todo o cinismo necessário para tornar crível algumas ações do mesmo. Por último, mas não menos importante, Marat Descartes é Maicom, um vilão que não mede esforços para alcançar seus objetivos, uma pena que sua personagem exagere na “canalhice”.

    2 Coelhos é um filme que cresce cena-a-cena e até o final da trama se consolida como algo que vai muito além do visual. O cinema brasileiro agradece.